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architexts ISSN 1809-6298


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Riceles Costa nos apresenta alguns conceitos sobre percepção do ambiente relacionando-os a princípios do fengshui com o objetivo de ampliar o vocabulário técnico e, consequentemente, a compreensão deste conhecimento ancestral


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ARAÚJO COSTA, Riceles. Fengshui:. Em busca do Genius Loci. Arquitextos, São Paulo, ano 08, n. 093.06, Vitruvius, fev. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/170>.

A aplicação do fengshui relaciona-se à percepção do ambiente natural, e à percepção, concepção e uso do ambiente construído. O conhecimento de suas técnicas por profissionais da arquitetura, planejamento urbano, paisagismo e áreas afins pode proporcionar ferramentas para o incremento da qualidade na preservação dos ambientes naturais e na produção do ambiente construído. Seu foco é a avaliação de certo tipo de ‘energia’ que flui no tempo e no espaço denominada Qi. Este conceito está na categoria da Metafísica e seu completo entendimento não pode ser descrito somente por uma palavra ou frase.

Neste trabalho (1) apresentamos alguns conceitos sobre percepção do ambiente relacionando-os a princípios do fengshui com o objetivo de ampliar o vocabulário técnico e, consequentemente, a compreensão deste conhecimento ancestral. As Referências Teóricas apresentam visões ocidentais e orientais, em particular a chinesa, e aponta paralelos através de uma interpretação contemporânea do antigo conceito romano do genius loci, o ‘espírito do lugar’. Um estudo de caso compara duas edificações e suas relações com o entorno a partir destes princípios. Para concluir, comentamos as possibilidades de aplicação do fengshui na Arquitetura e áreas afins.

O Espírito do Lugar - Referências Teóricas

No Dictionary of Classical Antiquities (2) e no Dictionary of Greek and Roman Biography and Mythology (3), genius é o espírito protetor semelhante aos anjos da guarda da Igreja Católica. A crença em tais espíritos, ou genii, parecia ser comum na Grécia e em Roma desde tempos imemoriais. Os Romanos podem ter recebido sua teoria sobre os genii dos Etruscos ainda que a palavra genius, singular de genii, tenha origem no latim geno significando ‘nascido’ ou com relação ao sentido de que o nascimento e a vida deviam-se aos dii genitales, força que produz e sustenta a vida. Possui relação com genitus, cujo significado é similar a ‘genitor’ ou ‘pai’. Todo ser vivo, assim como cada lugar, tinha o seu genius. O genius de um lugar – genius loci (4), genius significando ‘espírito', e loci, também do latim, como singular de locus, ‘lugar’ – era representado como uma serpente (5).

Houaiss & Villar (6) definem espírito como o ‘princípio vital, superior à matéria; sopro. Traço ou característica’. Assim, genius loci pode ser interpretado em termos contemporâneos como uma característica distintiva de um lugar, algo que o diferencia.

Tuan (7) demonstra a ‘identidade’ ou ‘aura’ de um lugar descrevendo a visita dos físicos Niels Bohr e Werner Heisenberg ao castelo de Kronberg na Dinamarca. Bohr comenta: “Não é interessante como este castelo muda tão logo a gente imagina que Hamlet viveu aqui? Como cientistas, acreditamos que um castelo consiste só em pedras, e admiramos a forma como o arquiteto as ordenou. As pedras, o teto verde com a pátina, os entalhes de madeira na igreja constituem o castelo todo. Nada disto deveria mudar pelo fato de que Hamlet morou aqui e, no entanto, muda completamente. De repente os muros e os baluartes falam uma linguagem diferente. O próprio pátio se transforma em um mundo, um canto escuro nos lembra a escuridão da alma humana, e escutamos Hamlet: ‘ser ou não ser’. [...] Uma vez que sabemos disto, Kronberg se torna, para nós, um castelo bem diferente”.

Norberg-Schulz (8) utiliza o conceito de ‘habitar’ de Heidegger (9) em relação ao conceito romano para definir lugar e propor uma visão contemporânea do genius loci: “O Homem habita quando pode se orientar e se identificar com um ambiente, ou quando experimenta o ambiente como significativo. Habitar, portanto, implica algo mais que ‘proteção’. Implica que os espaços onde a vida acontece são ‘lugares’, no verdadeiro sentido da palavra. Um lugar é o espaço que possui um caráter. Desde os tempos antigos o genius loci, ou ‘espírito do lugar’ tem sido reconhecido como a realidade concreta que o Homem deve enfrentar em sua vida diária”.

Norberg-Schulz (10) descreve a relação entre indivíduo e espaço: “Movendo-se através dos espaços, a pessoa pode freqüentemente reviver as emoções relacionadas a eles de encontros anteriores, ou aplicar modelos de lugares anteriormente visitados. Estas emoções estão associadas ao visitante. No entanto, também fica claro que o próprio lugar tem um jeito dele, um estado emocional, independente do estado de espírito do visitante no momento do encontro. Isto se chama o sentido do espírito do lugar, genius loci”. Para Norberg-Schulz, Arquitetura significa visualizar o genius loci e o trabalho do arquiteto é produzir lugares significativos auxiliando o Homem a habitar.

Referindo-se aos lugares de interesse de preservação, The Burra Charter (11) define lugar como local, área, terreno (lote), paisagem, edificação ou outra obra [edificada], conjunto de edificações ou outros conjuntos [edificados] e pode incluir componentes, conteúdo (12), espaços e vistas. A nota explicativa inclui ainda memoriais, árvores, jardins, parques, locais de eventos históricos, áreas urbanas, zonas industriais, sítios arqueológicos e locais religiosos ou espirituais. De acordo com o documento, o ‘Significado Cultural’ – valor estético, histórico, científico, social ou espiritual – determina o interesse de preservação. O ‘valor espiritual’ relaciona-se com a interpretação contemporânea do genius loci.

Moran & Yu (13) explicam que não existe uma palavra que possa descrever adequadamente o qi. Ainda que popularmente o termo seja usado como sinônimo de ‘energia’, o conceito de energia em todas as suas várias formas é apenas um dos aspectos do qi. O caractere chinês – – possui diversos significados associados. Alguns comumente encontrados na bibliografia técnica da Medicina Tradicional Chinesa são: ar, atmosfera, sopro, essência, espírito, vapor (14).

Moran & Yu (15) listam qualidades que podem auxiliar a compreensão do conceito:

  • Qi é a holística e subjacente força vital e substância que envolve todas as coisas.
  • Qi é o sopro imperceptível e não-mensurável que permeia, conecta e une os reinos cósmico e terrestre.
  • Qi é físico. É a força vital que os acupunturistas procuram ativar com suas agulhas e o poder que os artistas marciais canalizam para quebrar tijolos.
  • Qi é metafísico. É a sorte, o destino. É a intuição, o ‘sexto sentido’, a ‘vibração’ que alguém sente a respeito de uma pessoa, lugar ou coisa.
  • Qi é o espírito, a alma.

Lin (16) denomina o qi como ‘Força ambiental’ que se manifesta como:

  • Força arquitetônica refere-se à aparência da edificação em relação ao entorno.
  • Força humana refere-se aos relacionamentos das pessoas que utilizam a edificação.
  • Força do objeto refere-se ao interior da edificação, especificamente a distribuição dos ambientes, móveis, equipamentos, objetos decorativos.

Segundo Lin (17), o equilíbrio entre as três forças determina se o fengshui de um determinado local é bom ou ruim.

Zang Shu, o Livro dos Enterros (18), registra o termo fengshui e expõe sua relação com o qi: “Qi cavalga o vento – feng – e se dissipa, mas é contido quando encontra água – shui”. Fengshui Tradicional ou Clássico (19) é a denominação usada para diferenciar o sistema baseado na observação do Tempo e do Espaço interior e exterior (20) das adaptações desenvolvidas em época recente baseadas principalmente na intuição e no conhecimento místico (21).

Para Chuen (22), fengshui “é um sistema analítico desenvolvido não por uma pessoa, mas por uma tradição milenar acumulada e baseada na experiência e observação meticulosas”. Skinner (23) afirma que este conhecimento se desenvolveu ao longo de centenas de anos a partir da experiência de sucessivas gerações de mestres que cuidadosamente mediram, registraram e compararam os resultados de cada mudança de fengshui com o objetivo original. Segundo Skinner este é o método científico.

Wong (24) define fengshui como arte e ciência tradicional chinesa de viver em harmonia com o ambiente, profundamente enraizado na cultura chinesa como um modo de observar e interagir com a energia do universo. E acrescenta o que se pode considerar como o objetivo arquitetônico do fengshui, “entendimento das forças da Natureza para projetar residências e locais de trabalho que interajam com o ambiente em vez de agredi-lo” (25).

Lo (26) afirma que fengshui é o estudo do ambiente. Segundo ele, tradicionalmente acredita-se que fortes energias existem no ambiente – paisagem, água, edificações, estradas e etc. Algumas são benéficas proporcionando prosperidade e saúde aos usuários enquanto outras são nocivas causando dificuldades e má sorte. O correto entendimento da natureza dessas energias e de onde elas podem ser encontradas permite selecionar um bom local para a casa, cama, mesa de trabalho e até mesmo para objetos decorativos. Os chineses acreditam que se todas as coisas estão posicionadas de acordo com os princípios do fengshui, é possível obter um ambiente saudável, próspero e harmonioso melhorando a qualidade de vida.

Yu (27) afirma que fengshui “é o estudo sobre como proteger um local do ataque de ventos fortes e como nutri-lo com águas gentis (28). Para evitar que o qi seja disperso pelo vento, precisamos da presença de montanhas. Para trazer prosperidade a um local precisamos da presença de água. Então, o estudo do fengshui é o estudo da montanha e da água. Este é o princípio fundamental”. De acordo com Yu (29), montanhas protegem um local do ataque dos ventos. Na avaliação da paisagem é bom ter uma grande montanha nos fundos para evitar o ataque do vento (30). Qualquer objeto grande é considerado montanha virtual. A parte frontal de uma área, lote ou edificação deve ser aberta para que o qi entre e permaneça no local. Um espaço aberto é considerado água virtual. Numa edificação, paredes são consideradas montanhas enquanto portas, janelas e corredores são considerados água. Para Yu, “Uma casa possui bom fengshui se portas, janelas e corredores são bem projetados e estão apropriadamente posicionados” (31).

Em Houaiss & Villar (32) Metafísica é uma “subdivisão fundamental da filosofia, caracterizada pela investigação das realidades que transcendem a experiência sensível”. Ferreira, Luz e Luft apud Vieira (33) mostram que na terminologia atual Metafísica refere-se ao que é transcendente, sutil, abstrato e nebuloso.

Entre os temas e objetos da Metafísica listados por Chauí apud Vieira (34) de interesse para o presente trabalho destacamos:

  • Origem e estrutura do mundo ou da realidade;
  • O espírito e a matéria (diferenças e relações);
  • O espaço e o tempo.

Para Yu (35), Metafísica é o estudo racional do universo além do escopo da Física. “Espíritos são o que a ciência não abrange. Se espíritos não existem, então praticamente não existe nada [a ser estudado] na Metafísica”. Segundo Yu, espíritos é o foco do estudo de fengshui.

Estudo de Caso: Genius Loci Regional e Urbano

Uma caverna próxima a um rio (36) oferecendo proteção às costas e acesso ao alimento à frente (37) é uma demonstração do Princípio da Montanha e Água (38). Chuen afirma que a experiência humana da busca por locais adequados para habitação permanece na memória coletiva e influenciou a localização de cidades. Em sua análise, Hong Kong, situada entre o mar do Sul e as Montanhas Centrais da China, e New York, entre os montes Apalaches e o Oceano Atlântico, tornaram-se importantes centros contemporâneos de comunicação e comércio devido à correta localização de montanha e água (39).

A ilha de Hong Kong localiza-se no sul da China. Tomada pelo Reino Unido no início da década de 1840, teve a cidade de Victoria implantada na área denominada atualmente como Central, que corresponde ao núcleo histórico, político e econômico da ilha. Devolvida à China em 1997 e contando com uma população de cerca de 1,3 milhões de habitantes, é um dos centros econômicos mais importantes do planeta. Para os profissionais locais de fengshui, isso se deve ao conjunto de montanhas, planície e mar formando um ‘ninho do dragão’ (40), lugar onde forças benéficas emanadas pela Terra podem se concentrar (41). Central é considerada auspiciosa porque se localiza sobre uma ‘veia do dragão’ (42) que corre em direção ao mar a partir do Pico Victoria. A cadeia de montanhas oferece proteção aos prédios da área.

Lower Manhattan é a parte meridional de Manhattan, a principal ilha e centro de negócios e governamental da cidade de New York. É normalmente definida pela área delimitada ao norte por Chambers Street, a oeste por North River (Rio Hudson), a leste por East River, e ao sul por Battery Park e New York Harbor. Seu perímetro inclui Wall Street, City Hall, o Municipal Building, o Financial District e o conjunto do World Trade Center. Era o terceiro maior distrito financeiro dos Estados Unidos, mas o ataque terrorista às Torres Gêmeas, que resultou na perda de aproximadamente 1,5 milhões de metros quadrados de área comercial, é apontado como a principal causa de seu atual quarto lugar. No nível regional, a cidade de New York atende ao Princípio da Montanha e Água, porém Lower Manhattan não recebe suporte da paisagem. Está próxima à água, mas não possui montanha na parte traseira.

Torre do Banco da China, Central, Ilha de Hong Kong, China

Entre os prédios posicionados sobre a veia do dragão de Central está a torre do Banco da China, projeto do arquiteto I. M. Pei. Com 315 metros de altura, indo até 369 metros com os dois mastros no topo, é um dos maiores arranha-céus de Hong Kong. A estrutura foi inspirada pelo broto de bambu que simboliza vivacidade, flexibilidade e prosperidade. Seu perfil visto de alguns ângulos assemelha-se a uma lâmina apontada para os edifícios vizinhos (43).

Sobre o projeto e sua relação com o fengshui e o entorno, I. M. Pei relata: “o termo [fengshui] significa ‘vento e água’ e tem suas raízes na reverência às forças da natureza, que algumas vezes se degenerou numa forma de superstição. Quando se projeta edifícios em Hong Kong, não se pode escapar deste problema. Existem especialistas, mestres de fengshui, que aconselham as pessoas sobre todo tipo de coisas, especialmente sobre a escolha de terreno, a localização do edifício no terreno, e sobre a aparência e a forma do edifício. Eu estava ciente disso, mas nunca levei muito a sério. Assim que divulgamos nosso projeto, eu fui imediatamente atacado – tão intensamente quanto pelo Louvre, mas por razões diferentes. Por exemplo, o prédio tem muitos vértices pontiagudos que poderiam trazer má sorte aos prédios vizinhos” (44).

Para Wong (45), especialista em fengshui de Hong Kong, a estrutura pontiaguda da torre é agressiva, e a prática – duramente condenada por ela – de intencionalmente projetar edifícios com essas características se apóia na lógica de um mercado altamente competitivo no qual é importante ‘destruir ou ser destruído’, ‘dominar o território’.

Ao mesmo tempo em que exerce força arquitetônica nociva sobre o entorno, o posicionamento de fontes, lagos artificiais e jardins (46), bem como de objetos simbólicos (47) confirmam a colaboração de profissionais de fengshui no projeto e implantação da torre a fim garantir sucesso e prosperidade ao empreendimento. Chuen comenta “como uma lâmina polida, o novo edifício ergue-se acima da linha do horizonte. [...] É uma espetacular expressão de força – perfeitamente posicionada, com as montanhas atrás e o porto na frente – dando a impressão de um foguete pronto a ser lançado” (48).

Considerando o conjunto de prédios de Central, a Torre do Banco da China compõe um ambiente construído homogêneo que recebe força arquitetônica benéfica da paisagem composta por montanha e água, fortalecendo o genius loci relacionado a poder financeiro e liderança econômica mundial. Observada isoladamente, destaca-se pela forma e aparência, e exerce força arquitetônica inadequada, pois agride as edificações do entorno.

Torres Gêmeas do WTC, Lower Manhattan, cidade de New York, USA

O World Trade Center, informalmente denominado WTC ou Torres Gêmeas, era um complexo localizado no coração do distrito financeiro da cidade de New York formado por sete prédios (49), a maioria projetada pelo arquiteto americano Minoru Yamasaki, cuja construção foi iniciada em 1966. Mais conhecido pelas torres gêmeas de 110 andares, era parte da identidade da cidade e reconhecido em todo o mundo como um ícone dos Estados Unidos da América. Quando concluídas, a Torre 1 com 417 metros em 1972 e a Torre 2 com 415 metros em 1973, tornaram-se os dois arranha-céus mais altos da Terra. Todos os prédios foram destruídos em decorrência dos ataques de 11 de setembro de 2001.

Concebido como um complexo dedicado às empresas e organizações envolvidas no comércio mundial, inicialmente não recebeu os clientes esperados. Nos primeiros anos, agências e organizações governamentais foram os principais inquilinos dos prédios. A partir da década de 1980, o espaço passou a ser ocupado por empresas privadas. Durante os anos de 1990, cerca de 500 empresas – comerciais, financeiras, comunicação – ocupavam os escritórios do WTC.

O complexo substituiu a tradicional e altamente adensada vizinhança e foi considerado por críticos como um ambiente inóspito que perturbou o já complicado tráfico de Manhattan. Mumford criticou o empreendimento como um “exemplo de gigantismo sem propósito e de exibicionismo tecnológico que está agora eviscerando o tecido vivo de toda grande cidade” (50). Yamasaki o considerava como um ponto de serenidade entre o caos da cidade.

Ao contrário de Central, Lower Manhatan está desprotegida. O conjunto formado pelos prédios 3 a 7 do complexo World Trade Center adequavam-se ao entorno. A força arquitetônica contribuía para o bom fengshui e, em conseqüência, fortalecia o genius loci relacionado a comércio e liderança financeira. As Torres Gêmeas, entretanto, destacavam-se na paisagem. Erguiam-se às proximidades do Rio Hudson como frondosas árvores isoladas necessitando de suporte. Os andares superiores completamente expostos e sem apoio à semelhança de uma casa erguida no topo de uma colina sujeita aos caprichos da natureza (51). Sob a ótica do fengshui uma edificação nesta situação está sujeita ao ataque de ‘ventos nocivos’ podendo proporcionar todo tipo de infortúnio e má sorte ao empreendimento e aos usuários. Avaliando estas condições, um especialista em fengshui compreende a demora de o complexo ser utilizado conforme os objetivos inicialmente previstos, como também o fato do WTC, e em particular a Torre 1, ter sido alvo de acidentes e atentados (52).

Fengshui: outro enfoque sobre a paisagem

Posicionamento é um aspecto fundamental do fengshui para a avaliação de paisagem e edificações. As Referências Teóricas e o Estudo de Caso tentaram demonstrar que o posicionamento da edificação em relação aos elementos da paisagem, bem como sua forma e aparência em relação às edificações do entorno afetam a qualidade do qi com reflexos, em maior ou menor grau, sobre sua característica distintiva – o genius loci.

Do nível regional, passando pelo urbano até o local (edifício), tentou-se verificar de modo bem simplificado a viabilidade do Princípio da Montanha e da Água como um método de avaliação da paisagem. A metodologia do Fengshui tradicional abrange um amplo conjunto de princípios, técnicas e fórmulas que podem contribuir para a identificação do espírito do lugar e descrever sua influência na vida dos usuários.

A busca do ser humano pelo seu lugar na Natureza – abrigo (caverna, montanha) e meios de subsistência (água) – relaciona-se à sua interação com o ambiente, reconhecendo sua característica distintiva – identidade, genius loci –, se adequando a ele e modificando-o em seu beneficio.

As culturas chinesa e ocidental dedicam atenção à harmonia entre seres humanos e ambiente, seja o natural nos tempos antigos ou o construído nos dias atuais. Arquitetos e projetistas preocupam-se com a interação equilibrada entre o ambiente natural e o construído, porém, ainda há muito a conhecer sobre os resultados dessa interação sobre os usuários. Na China, o estudo da relação entre ambiente, edificações e usuários – fengshui – é composto por um conjunto de conhecimentos antigos constantemente atualizados pelas novas gerações de profissionais. Integrar este conhecimento à metodologia de projeto pode contribuir para desvendar o genius loci e interagir com ele visando a melhoria da qualidade de vida.

Produzir ambientes que incrementem a qualidade de vida dos usuários é o objetivo comum de especialistas em fengshui, arquitetos, paisagistas, planejadores urbanos. Como diferencial, o fengshui adiciona o componente metafísico usando uma linguagem com referências simbólicas. Pesquisar, verificar sua validade e integrar este conhecimento à metodologia de projeto pode ser o desafio para os profissionais contemporâneos.

notas

1
As palavras do Mestre Joseph Yu, meu professor de fengshui, serviram de inspiração para este trabalho: “A tarefa dos estudantes de fengshui no futuro é integrar o fengshui à ciência convencional”.

2
SEYFFERT, Oskar. A Dictionary of Classical Antiquities. Mythology, Religion, Literature & Art. 8ª edição. London, Swan Sonnenschein and Co. Lim., 1904, p.249. Fac-símile disponível em <www.ancientlibrary.com>, acesso em 7 de novembro de 2005.

3
SMITH, William. A Dictionary of Greek and Roman Biography and Mythology. Boston, Little Brown and co., 1867, p. 241-242. Fac-símile disponível em <www.ancientlibrary.com>, acesso em 7 de novembro de 2005.

4
BREWER, E. Cobham. Dictionary of Phrase and Fable. Philadelphia, Henry Altemus, 1898; Bartleby.com, 2000. Disponível em www.bartleby.com/81/, acesso em 10 de Janeiro de 2007.

5
Ver foto do interior de uma residência romana mostrando o lararium com pinturas dos deuses protetores e da serpente que representa o genius loci. Disponível em <sights.seindal.dk/photo/9703,s319f.html>

6
HOUAIS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001, p. 1233.

7
TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: A perspectiva da experiência. Tradução de Space and Place: The Perspective of Experience. São Paulo, Difel, 1983, p. 4.

8
NORBERG-SCHULZ, Christian. Genius loci. Towards a phenomenology of architecture. Londres, Academy Editions, 1980.

9
HEIDEGGER, Martin. Building Dwelling Thinking (1951). In: Poetry, Language, Thought. Tradução de Albert Hofstadter. New York, Harper Colophon Books, 1971. Disponível em <acnet.pratt.edu/~arch543p/readings/Heidegger.html>, acesso em 2 de agosto de 2005.

10
NORBERG-SCHULZ, Christian. Op.cit.

11
AUSTRALIA ICOMOS. The Burra Charter – The Australia Icomos Charter for the Conservation of Places of Cultural Significance. Burra, 1999. Disponível em <www.icomos.org/australia/burra.html>, acesso em 2 de novembro de 2005. The Burra Charter apresenta orientações para a conservação e manutenção de lugares com significado cultural. A versão em português disponível no site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN se baseia no documento de 1979. O presente trabalho utiliza a versão definitiva de 1999.

12
Entendido como significado ou sentido da obra. In: CHING, Francis D. K. Dicionário Visual de Arquitetura. Tradução de Visual Dictionary of Architecture. 1ª ed. São Paulo, Martins Fontes, 1999, p. 73.

13
MORAN, Elizabeth & YU, Master Joseph. The Complete Idiot’s Guide to the I Ching. Indianapolis, Alpha Books, 2002, p. 220.

14
FERREIRA, Marcus Vinicius. QI E ENERGIA: TRADUÇÃO, TRADIÇÃO, TRAIÇÃO. Trabalho apresentado no III Congresso da Sociedade Médica Brasileira de Acupuntura. Santa Catarina, 1996. Disponível em <www.acupuntura.org/artigos/acmvar02.htm>, acesso em 20 de dezembro de 2006.

15
MORAN, Elizabeth & YU, Master Joseph. Op.cit., p. 220.

16
LIN, C. P. The Science of Feng Shui – The Oriental Scientific Way to Perfect Your Environment. Singapura, Times Books International, 2000, p. 24-25.

17
Idem, p. 24.

18
FIELD, Stephen L. (tradutor). The Zangshu, or Book of Burial. 2003. Escrito por Guo Pu (276-324 d.C.). Disponível em <www.fengshuigate.com/zangshu.html>, acesso em 17 de junho de 2004.

19
Todas as vezes que grafarmos fengshui estamos nos referindo ao Fengshui tradicional.

20
MORAN, Elizabeth; YU, Master Joseph & BIKTASHEV, Master Val. The Complete Idiot’s Guide to Feng Shui. 3ª ed. Indianapolis, Alpha Books, 2005, p. 8.

21
ROSSBACH, Sarah. Feng Shui: Como viver melhor em sua casa. Tradução de Feng Shui – The Chinese Art of Placement. Rio de Janeiro, Ediouro, 1998, p. 35.

22
CHUEN, Lam Kam. O Livro do Feng Shui – Como criar um ambiente mais saudável em casa e no trabalho. Tradução de The Feng Shui Handbook. 1ª ed. São Paulo, Editora Manole Ltda., 1998, p. 8.

23
SKINNER, Stephen. Kiss Guide to Feng Shui. New York, DK Publishing, Inc., 2001, p. 27.

24
WONG, Eva. A Master Course in Feng-Shui. 1ª ed. Boston, Shambhala Publications, Inc., 2001, p. 13.

25
WONG, Eva. WHAT IS FENG-SHUI? Boston, Shambhala Publications, Inc., 2001. Disponível em <www.shambhala.com/fengshui/fundamentals/whatIs.cfm//>, acesso em 5 de fevereiro de 2002.

26
LO, Raymond. Feng Shui & Destiny for Families – The Indispensable Guide for Every Home. Singapura, Times Editions Pte Ltd, 1999, p.126.

27
YU, Joseph. Wind and Water. Toronto, 2002. Disponível em <groups.yahoo.com/group/astrofengshui/files/>, acesso em 20 de junho de 2003.

28
Na cultura chinesa, ventos e águas suaves estão sempre associados com boa colheita e boa saúde, enquanto ventos fortes e água estagnada relacionam-se à fome e doença. In: WONG. Op. cit. Nota 25.

29
YU, Joseph. Wind and Water (2). Toronto, 2002. Disponível em <groups.yahoo.com/group/astrofengshui/files/>, acesso em 20 de junho de 2003.

30
Ver também CHUEN, Lam Kam. Op.cit. p. 11, 72, 73, 140-141.

31
YU, Joseph. Op.cit. Nota 29.

32
HOUAIS, Antônio & VILLAR, Mauro de Salles. Op.cit. p. 1907.

33
VIEIRA, Elenir Honorato. Práticas alternativas em gestão de pessoas: Astrologia, Feng Shui, Grafologia, Numerologia, Radiestesia, Shiatsu. Metafísica ou novas abordagens em Administração? Tese (Doutorado) Universidade de São Paulo. São Paulo, 2005, p.11. Disponível em <www.teses.usp.br/teses/disponiveis/12/12139/tde-09122005-124557/>, acesso em 10 de maio de 2007.

34
Idem
35
YU, Joseph. Deities and ghosts. Toronto, 2007. Disponível em <fsrcenter.blogspot.com/2007_05_01_archive.html>, acesso em 5 de junho de 2007.

36
A proximidade da água (rios, mares, oceanos) permite a comunicação com outras populações, possibilitando trocas culturais e comerciais. Destarte, o simbolismo da água pode ser ampliado para comunicação, riqueza e prosperidade.

37
CHUEN, Lam Kam. Op.cit. p. 53.

38
YU, Joseph. Op.cit. Nota 27.

39
CHUEN, Lam Kam. Op.cit. p. 53.

40
Na China, o dragão simboliza o Imperador. Em fengshui, ele simboliza a energia vital que existe sobre a terra. Sua existência pode ser percebida nas cadeias de montanhas, nos rios e cursos d’água. Montanhas são chamadas de ‘dragões da montanha’ enquanto que os cursos d’águas são chamados de ‘dragões de água’. Montanhas e cursos d’água bonitos são dragões vibrantes capazes emitir qi benéfico. Montanhas e cursos d’águas feios são dragões doentes ou mesmo mortos capazes de emitir qi nocivo. In: YU, Joseph. FENGSHUI 101. Toronto, 1999. Disponível em <www.astro-fengshui.com/courses/fengshui101.index.html>, acesso em 4 de dezembro de 2001.

41
WILLIAMS, Martin. IN THE DRAGON'S LAIR: FUNG SHUI AND HK. Far East Traveler, julho de 1992. Disponível em <www.drmartinwilliams.com/fungshui/fungshui.html>, acesso em 3 de agosto de 2007.

42
Canais por onde o qi flui no interior da terra. In: SKINNER, Stephen. Op.cit. p. 212.

43
Ver foto da Torre do Banco da China. Disponível em <www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=3430>.

44
BOEHM, Gero Von. Conversations with I.M. Pei: Light is the Key. Prestel Publishing, 2000.

45
WONG, Eva. Op.cit. Nota 24, p. 18.

46
Ver foto da fonte, lago artificial e jardim no exterior da torre do Banco da China. Disponível em <en.structurae.de/photos/index.cfm?JS=2401>.

47
Para os chineses, o leão representa proteção. É colocado aos pares, macho e fêmea, um de cada lado da porta principal de prédios comerciais e públicos, templos e residências. In: TOO, Lillian. Guia Completo Ilustrado do Feng Shui. Tradução de The Complete Illustrated Guide to Feng Shui. São Paulo, Avatar, 1998, p. 65, 167. Ver a foto das estátuas de leão na porta principal do Banco da China. Disponível em <static.flickr.com/102/299409748_b2ae0ece44_o.jpg> e <static.flickr.com/110/299409725_c6a3279067_o.jpg>.

48
CHUEN, Lam Kam. Op.cit. p. 79.

49
Ver a planta do complexo WTC. Disponível em <upload.wikimedia.org/wikipedia>.

50
MUMFORD, Lewis. The Pentagon of Power: The Myth of the Machine, Volume Two. New York, Harcourt Brace Jovanovich, Inc., 1970.

51
Ver a vista panorâmica de Lower Manhattam. Disponível em <www.atpm.com/7.01>.

52
A Torre Norte foi o foco dos seguintes eventos: incêndio no 11º andar em fevereiro de 1975, atentado com um caminhão carregado de explosivos em fevereiro de 1993 e os ataques terroristas em setembro de 2001.

sobre o autor

Riceles Araújo Costa é arquiteto com especialização em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas (NAEA/UFPa). Iniciou seus estudos de Fengshui Tradicional em 1999, tendo participado de diversos cursos do Feng Shui Research Center, Toronto, Canadá. Desde 2004 dedica-se à pesquisa de referências teóricas entre arquitetura e este conhecimento ancestral.

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