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architexts ISSN 1809-6298


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Neste artigo, Sérgio Augusto Menezes Hespanha nos fala sobre a vida e a obra de Affonso Risi, arquiteto de Bragança Paulista-SP, cuja autação se dá em escritório e na carreira do ensino, além da participação em debates, comissões julgadoras e premiações

english
Sérgio Augusto Menezes Hespanha explains about Affonso Risi's carrer, as a professional, teacher, and also his participation in debates, juries and awards

español
En este artículo Sérgio Augusto Menezes Hespanha nos explica la vida y obra de Affonso Risi, su vida profesional y como profesor, además de su rol en debates, premios y jurado de concursos


how to quote

HESPANHA, Sérgio Augusto Menezes. Affonso Risi: esmero e devoção em busca projetual elaborada. Arquitextos, São Paulo, ano 10, n. 110.03, Vitruvius, jul. 2009 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/10.110/42>.

Risi nasceu em Bragança Paulista-SP (1946), formou-se pela FAU Mackenzie (1972) e, desde então mantém escritório em São Paulo; dedica-se também ao ensino (FAU “Elmano A. Veloso”, São José dos Campos, 1972/73; FAU Mackenzie, 1987; e FAU UNIP, desde 1992).

Sua formação envolveu, ao mesmo tempo, estudos de música e, compondo o conjunto dos conhecimentos que desenvolve e refletirá em sua arquitetura, apoiada em sólida base cultural, também desenvolve atividades neste âmbito (história da arte, por exemplo), tendo proferido palestras e ministrado cursos livres (Arquitetura; uma introdução à poética do construir, Casa do Saber, São Paulo, 2008), como também comentou transmissões de música erudita ao vivo, pela Rádio Cultura FM.

Arquiteto premiado, recebeu o Rino Levi (IAB-SP) em 1983 com a ‘Residência dos Padres Claretianos’ (co-autoria com José Mário Nogueira Jr), que foi também Destaque na 2ª Bienal Internacional de Arquitetura-1993; mesmo reconhecimento obtido com o projeto ‘Passagem São Bento’, na 6ª BIA-2005.

Erudito, conhecedor da cultura arquitetônica em particular, sua atividade envolve também freqüentes convites para conferências, debates e palestras, tais como: no Festival da Primavera 2005– Paraty/RJ, conferência sobre o Barroco e a cultura do século XVII; no Museu da Casa Brasileira – S.Paulo/SP, mesa-redonda sobre José Antonio Coderch (1995); conferencista no Ciclo Novas Tendências na Arquitetura Brasileira Contemporânea, IAB-SP (1987); participação em Painéis de Debate da BIA, exposição de sua obra em Ciclos de Debate do IAB; em várias oportunidades, comentou sua obra ou debateu a de colegas ou abordou temas específicos em diversas FAUs, como também compôs júris de premiações.

O reconhecimento tem levado seu trabalho para exposições no Brasil e no exterior; caracterizadas pela apresentação da melhor produção, representando a arquitetura paulista e brasileira. Estes são os casos de exposições na Technische Universiteit Delft (2002); no Instituto Tomie Ohtake (2001); no Museu da Casa Brasileira (1997); no IAB–SP (2000, 1991, 1990 e 1983); e pela Brasil Agency for International Relations, percorrendo Paris, Bordeaux, Bruxelas, Barcelona, Dortmund e Frankfurt e Hong-Kong (início em 1988); no Institut Français d’Architecture e na Bienal de Arquitectura de Buenos Aires (1987 e 1985).

Ao longo de sua carreira, Risi estabeleceu várias parcerias. Entre outras, com Iolanda Akamine Risi (sua esposa, falecida), José Mário Nogueira Jr e Leo Tomchinsky.

Elaboração projetual

A repercussão de dois projetos de Risi, Residência dos Padres Claretianos e Capela de São Miguel, e a freqüência com que atua para ordens religiosas, muitas vezes, leva a identificar sua obra, de modo incompleto, com foco em ‘arquitetura religiosa’. Na verdade, sua atuação é mais ampla. Risi também tem projetado edifícios escolares, variados espaços para promoção cultural, edificações administrativas e muitas residências.

Seu processo projetual é muito elaborado e, nisto, tem especificidades que constituem um trabalho raro. Aqui parecem convergir duas características pessoais de Risi: a erudição e sua devoção à arquitetura.

Ao invés de projetar de modo mais limitado ao que o desenho fornece, que, em geral, em muitos arquitetos, evolui de uma idéia bastante vaga e ganha corpo num processo exclusivamente interno ao desenho, como delineador que quase assume autonomia, ‘conduzindo o arquiteto’, pelo que progressivamente se visualiza, num ‘tatear’ em busca da forma, com Risi ocorre diferente.

Sem deixar de fazer pleno uso do desenho, ao prever e aplicar-se uma rigorosa articulação de todas as variáveis (que são muitas, com sua erudição), desde logo pensadas em conjunto, sob vários aspectos, mais que desenhos que ‘tateiam a forma’, no processo de Risi são feitos estudos que, claro, são gráficos, mas não são somente representações de uma forma que ‘se gesta’. Mais que isto, são registros através dos quais, mais do que a forma, se representa e se estabelece uma organização e estruturação de tudo o que se elege como próprio a cada situação. Tal ocorre de modo que, tudo, e qualquer transformação, inerente ao processo projetual, segue uma elaboração rigorosa em sua completude; e o domínio do processo projetual se faz assim muito claro e potente.

Nesse processo, Risi usa a modulação para muito além de seu emprego mais comum: como mero instrumento de ‘controle dimensional’. Diferentemente, para Risi, a modulação é instrumento de formulação da forma e agenciamento do escopo projetual erudito que adota; então, em versão mais complexa e em mais rico emprego, possibilita uma abordagem que torna o exercício projetual mais inteligível e muito articulado.

À modulação, se soma um conhecimento da história da arquitetura e, coerente com ele, um saber de como se constituíram as arquiteturas de cada tempo, envolvendo variados aspectos: social, técnico, cultural, disciplinar etc, que Risi sempre ativa quando projeta.

Vem daí outro elemento importante no processo de Risi: o uso de proporções harmoniosas e o exercício de uma consciente atualização tipológica. Conhecimento, muitas vezes, raro e até desprezado.

Um conjunto de fatores parece constituir o que chamamos de organização e estruturação prévia ao desenho per se; dos elementos que presidem a busca da forma, em distinção a um modo pautado por experimentação ‘menos consciente’ acerca dos aspectos a considerar e de suas articulações possíveis, em que a formulação projetual é mais uma manifestação manual, num processo mais sensual que mental.

Prova do próprio da mestria de Risi, nos parece cabal, é a adoção de um método que envolve, desde logo e com rigor, maior conhecimento, para compor o seu complexo e completo processo projetual.

Aqui podemos referir a um modo erudito de produzir arquitetura, que, no entanto, conhece, respeita e emprega, também, instrumentos e idéias advindas do vernacular.

No trabalho de Risi, se a concepção da forma emprega meios eruditos, num urdimento complexo e que usa experiências codificadas, a forma, no entanto, não resulta ‘complicada’ ou de ‘difícil realização’. Ao contrário, este – Risi nos demonstra – é o próprio meio de, justamente na etapa de pré-visão que caracteriza fundo o projeto, com cuidado, rigor e muito trabalho, tornar tudo mais fácil e justificável na hora da ‘verdade da forma e da obra’.

Geometria e história como amigas

O emprego das diferentes formas de representação na épura (planta, corte, elevação), como meio de, parcialmente, não só representar, mas mesmo buscar a forma, enquanto se projeta, no caso de Risi, não é, tanto, quanto é comum, uma fase de estudos tão parciais, cuja articulação de todos os elementos envolvidos somente se define quando já avançado o processo.

E aqui entra a modulação, como a opera, com uma ‘tridimensionalidade’ já articulada ao sistema construtivo e aos critérios de distribuição dos setores funcionais como elementos desde logo correlacionados na busca da forma; também incorporando as escolhas que procede diante do conhecimento da história.

Desse modo, sistema construtivo, estrutura e configuração se articulam complexa e profundamente, desde sempre e, atravessando tradições históricas, à primeira vista díspares, Risi assim atualiza a noção e emprego da composição.

A geometria tem uma clara e forte presença no método de Risi; parece ser através dela que se articulam a modulação, o emprego das proporções harmoniosas e mesmo o que vem do conhecimento histórico, tomado como, no tempo e no espaço, e de acordo com procedimento de cada arquiteto (que assim se faz mestre), Risi encontra a ‘tradição arquitetônica’ como rico, mas não impositivo referencial.

Diante da circunstância projetual (programa, sítio etc) e do legado arquitetônico de séculos, a geometria parece ser o meio pelo qual Risi conduz a articulação entre tantos e tão diversos fatores que considera, não temendo nem escamoteando a ‘complexidade arquitetônica’, mas, operando com ela.

No aporte histórico e disciplinar, Risi considera e explicitamente refere aos mestres de sua escolha.

Cita, entre vários outros, com freqüência (e aqui reproduzimos suas palavras) Renzo Piano: “a questão tectônica resolvida sempre de maneira surpreendente, espaços que parecem ‘amigáveis’”, Niemeyer: “na busca da fluidez”, Artigas: “grande desenhador de estruturas e espaços”, Kahn: “no enorme respeito às instituições humanas, a busca das origens, o amor à história, incorporada e transfigurada pelo gesto criador do arquiteto, o respeito ao material, que cria a ‘decoração’ na arquitetura”, Aalto: “suas formas fortemente subordinadas à função; esse é o grande ‘funcionalista’ na arquitetura moderna”, Stirling: “que me despertou para a questão contextual e para a irrelevância do célebre jargão de Sullivan ‘a forma segue a função’”, Coderch: “gostei daquela arquitetura definida por planos e não por linhas, fortemente arraigado ao chão, pouca exibição estrutural”, Eduardo de Almeida: “amigo, apaixonado por música e literatura, como eu, mestre de nós todos”, Tadao Ando: “o ascetismo, numa elaboração sempre nova das heranças de Le Corbusier e Kahn, a luz!!!”, Siza: “espaços apaixonantes que sempre me parecem construíveis com os recursos que temos, o que me deixa encantado e um pouco frustrado: ‘por que não pensei nisso antes?’”, Paulo Mendes da Rocha: “numa arquitetura que recusa a exuberância formal para fazer formas e espaços exuberantes” e Joaquim Guedes: em analogia com Coderch e Aalto.

Projetos e obras

O dito acima pode ser aqui rapidamente exemplificado em algumas das principais obras e projetos de Risi.

A Residência dos Padres Claretianos (Batatais-SP, 1981/2; co-autoria com José Mário Nogueira Jr) parece ter sido ponto culminante num processo de definição das mais fundamentais e duráveis escolhas na arquitetura de Risi. Envolveu proposição e experimentação de vários de seus pressupostos projetuais.

A referência histórica é traço marcante, na apropriada adoção da ‘herança monástica’, em termos tipológicos; mas também na escolha tecnológica, no resgate e adoção generalizada e sofisticada da alvenaria de tijolos; que é também instrumento e recurso compositivo, explorando as possibilidades dessa técnica, tanto na configuração do que constitui a composição à maior escala (abóbada), quanto nas ocorrências do detalhe (texturas de superfícies, com o rigor na amarração dos tijolos), também nos acolhedores e requintados interiores, envolvendo detida concepção de pormenores.

Nesta obra, a importância do sistema construtivo (envolvendo atenção à colaboração dos artífices), é marcante sob vários aspectos e determina a coerência na composição; rigorosa na combinação de aspectos envolvidos: lógica construtiva, setorização de espaços/funções e a conformação correspondente, num emprego elaborado da modulação e da geometria; expressando, ao mesmo tempo, ordem e liberdade. Em torno a um jardim central, alas diversas acomodam, em composição própria, mas articuladas, os diversos espaços.

O Anexo Administrativo do Mosteiro de São Bento-SP (Largo de São Bento-SP, 1992) é bom exemplo de uma articulação urbana conjugada com elaboração sofisticada do ‘objeto’ arquitetônico que, numa atitude respeitosa, dialoga fundo com o contexto, a partir de uma interpretação do pré-existente; que não só determina o modo de ser do que é novo, mas também descobre, e com maior potência revela, na composição urbana, o próprio do existente. Com propriedade, dá assim a devida resposta às condições (entendidas) para sua inserção, num atento jogo compositivo; o que constitui abordagem arquitetônica e urbanística ao mesmo tempo. Perspectiva que nunca devemos perder de vista.

Todo o referido ao rico processo projetual de Risi, especialmente no que se refere ao papel das proporções harmoniosas e da geometria, encontra na Capela de São Miguel (Itu-SP, 1994), um completo e muito elucidativo exemplo.

Em elaborada construção geométrica determinada pelo emprego da Proporção Áurea, pautando-os por conceitos sagrados, tudo é concebido; da implantação à colocação da cruz translúcida no altar, orientada ao nascer do Sol no dia de São Miguel, orago da Capela.

Em dimensões reduzidas e com formas singelas, na pureza geométrica, uma elaboração sofisticada remete à criação, num diálogo entre sagrado e profano.

Edificações ou conjuntos voltados para a educação é outro tema importante.

É o caso do campus da Universidade do Grande ABC (Santo André-SP, 1997), onde, ainda que atuando no âmbito estrito do espaço privado, na construção da paisagem, diante de complexo e vultoso programa, em localização complicada, numa região que sofre importante processo de substituição da atividade fabril por serviços, Risi trata de reconstituir o tecido urbano.

Compõe o conjunto de edifícios de função variada em unidade, em torno de grande espaço livre que assume configuração pública.

A linearidade dos grandes blocos é ‘diversificada’ na elaboração formal que os secciona. Como recurso para isto, adota uma composição de variadas soluções para o invólucro construído; coerente com especificidades de cada função abrigada, como também pela distinção dos espaços servidores; ainda, usa de um elaborado jogo de cheios e vazios. Tudo isto, compõem, ao mesmo tempo, correspondência e variedade, que institui e comunica a unidade de um conjunto, bem como a diversidade própria de uma urbanidade complexa; adequada à dimensão e situação deste escopo projetual.

O caso da UniPaulistana (São Paulo-SP, 2001) constitui solução diferente; na dimensão e situação semelhante à de um edifício comumente presente na paisagem (como um ‘edifício de escritórios’); vertical e único no lote, numa São Paulo repleta, aqui Risi nos apresenta especialmente duas qualidades: confere clara dignidade pública aos espaços de maior contato com a rua e uso coletivo e, na conformação do conjunto, opera o que é lhe característico: uma primorosa composição do invólucro edilício, pautada pela modulação e disposição harmoniosa dos componentes. Tornando, o que seria ‘mais um edifício’ na paisagem, um caso singular (mas, sem espalhafato).

De modo similar, é o que ocorre no Edifício à Rua Mateus Grou (São Paulo-SP, 2002, co-autoria com Reinaldo Cabral), numa cuidada elaboração das particularidades da circunstância; mote para encontrar o próprio; por exemplo, na fachada lateral, solucionar a composição de uma variedade de janelas de ambientes distintos, requisito da conformação dúplex das unidades de apartamento, reúne todas num ‘janelão’.

Isto, mais a delicada solução de prover um dos pisos de garagem no térreo sem torná-la interferente na comunicação com a rua, torna tal edifício de apartamentos fora dos padrões; muitas vezes, lastimáveis, que conhecemos.

Se na cidade a composição urbana a partir da intervenção arquitetônica é expressão do cuidado e elaboração que Risi emprega, o Teatro ao Ar Livre (Pirutinga, Guaratinguetá-SP, 2000, co-autoria com André Portella) é um caso correspondente, no sofisticado diálogo que estabelece com o sítio, determinante da forma que concebe. Não obstante, Risi não deixa aqui de promover certa ‘urbanidade’, com a criação de uma pequena praça reunindo o equipamento que dá suporte justamente em situações em que as pessoas se reunirão; como é próprio de um ambiente construído.

A Pousada Mana Tapu (Monte Verde-MG, 2006) parece ser um caso de exploração mais complexa das composições geométricas, mantendo-se, de modo elaborado, o emprego das proporções harmoniosas. Diversas figuras geométricas articuladas criam espaços próprios vinculados às funções que compõe a pousada; conjugadas de modo a manterem-se respeitando a proporção áurea; sempre um recurso ordenador de que Risi lança mão. Combinando soluções para diversos aspectos, por exemplo, figuras circulares são geradas pela solução estruturalmente interessante do arco no arrimo, em um terreno em declive. Um pentágono gera o volume em destaque que se combina com a acomodação do conjunto ao relevo, projetando-se no declive, gera alinhamentos para outros elementos do conjunto, que forma uma plataforma em franca relação com a paisagem.

Em outro projeto, numa interessante costura urbana que articula funções de interesse público, compondo um tipo de intervenção que deveria ser mais freqüente na cidade, a intervenção denominada Passagem São Bento (São Paulo-SP, 2004/5; não realizado), propõe um conjunto constituído de espaço institucional da COHAB, três andares de garagem, uma galeria comercial e acesso ao Largo São Bento desde a Av Prestes Maia.

Em complicada situação, também rica em referências urbanas importantes para São Paulo, envolvendo o conjunto do Mosteiro e Colégio de São Bento, o próprio Largo São Bento, sobre a linha norte-sul do Metrô, um grande desnível sustentado por arrimo em pedra e, nas laterais, empenas cegas de edifícios vizinhos, constitui uma tal diversidade de questões que, contudo, Risi resolve com habilidade, numa solução que supera todas as dificuldades com propriedade e clareza.

Residências constituem tema freqüente para Risi. Em situações muito variadas, seu ferramental projetual é aqui empregado de modo diferenciado, mas não menos elaborado: invocação histórica, esmerada construção geométrica, variado emprego de proporções harmoniosas, engenhosa atenção às condições do contexto, rigorosa correspondência do sistema construtivo com o esquema modular e compositivo; são instrumentos recorrentes.

A Residência Patrimônio do Carmo (São Roque-SP, 1997, parceria com o engenheiro Hélio Olga, Ita Construtora), é toda pautada na construção geométrica, numa forma compacta; emprega estrutura de madeira em estreita correspondência com todas demais soluções construtivas. A escolha dos materiais é uma delas.

Existem casos em que o emprego de proporções geométricas não se faz tão visível, mas ele é sempre presente.

A Casa da Represa (Bragança Paulista-SP, 2003) tira partido da paisagem e constrói, com sua forma ‘decomposta’, o espaço livre que articula a vida doméstica em sua motivação mais integradora, ao mesmo tempo em que elementos de segunda ordem na composição remetem a outras circunstâncias, como a diversidade de situações em que da casa o habitante se relaciona com a paisagem circundante.

Na Residência à Rua Alabarda (São Paulo-SP, 2005/8) Risi conjuga, nas condições comuns de implantação num lote típico, a singeleza com a elaboração repleta de sutis referências à arquitetura dos maiores mestres.

Na Residência Morada do Sol (Vinhedo-SP, 2005/6), o programa mais complexo e inusitado (inclui biblioteca que ocupa 2/3 da área total), exigiu solução em que Risi recorre a uma organização de volumes variados em torno de um jardim central, em partido ao modo de uma casa romana.

Uma articulação complexa, em espaços e volumes diversos, também em torno de um elemento articulador (a rampa) é o caso da Residência Rosário de Fátima (Bragança Paulista-SP, 2005/6).

Como na maioria dos casos, mas especialmente nos das Residências Vila América I e Vila América II (Bragança Paulista-SP, 2007), a elaboração da forma dos diversos setores apresenta rica correspondência entre composição volumétrica à escala do conjunto com demais elementos de diversas ordens compositivas: a posição, forma e dimensão das aberturas, numa elaborada contribuição à configuração volumétrica; este também é o caso dos telhados, em ângulos e orientação escolhidos com primor; beirais e platibandas, num jogo cheio de sutilezas, ao mesmo tempo em que invocam a singeleza da melhor arquitetura vernacular, constituem apurado recurso.

Rigor que elucida

A obra de Risi, com suas características, é amostra de que, conduzindo sua atividade pelo rigor no emprego da técnica projetual, tornada especialmente visível, porque ela pauta diretamente o seu método, elabora-se e se contribui para a construção de uma verdadeira ‘teoria projetual’.

Uma vez que, ao contrário do que muitas vezes pensamos (distanciando a teoria da prática), a teoria arquitetônica não é mais do que qualquer noção (sem desdouro) acerca do que deveria ser um edifício. Noção esta que subsidie, então, o processo projetual.

Verdadeiras mistificações se têm promovido sobre isto, não nos permitindo avançar num necessário amadurecimento disciplinar; que nos possibilitaria, não só produzir arquitetura, como também debater acerca dela, sem ferir suscetibilidades que surgem com esta mistificação.

A obra de Risi é demonstrativa de que certa humildade nestes termos – o que é bem o oposto de uma postura ‘acomodada’ - deve compor uma atitude mais generosa em como considerar a arquitetura, especialmente quando nos vemos frente ao problema de concebê-la e, com isto, estabelecermos melhores condições para uma interlocução que até mesmo legitima a arquitetura que é proposta.

Em Risi tal ‘teoria’ está franqueada a nós em seus projetos, não só porque estaria de qualquer modo, a depender do olhar, mas porque Risi a tem muito clara, e ela se faz então visível, já que as próprias características de sua concepção são desse tipo.

Revela, assim, a própria constituição e prática de uma disciplina, no melhor sentido. Como nem sempre ocorre, em detrimento da qualidade geral da arquitetura que se pratica, quando se opta por todo tipo de escamoteamento em nome de uma falsa, então, sofisticação.

Com sua laboriosa atitude, Risi nos mostra como não fazer da busca arquitetônica uma equivocada e circunstancial eleição de um aspecto do projeto em detrimento de outros. Por exemplo, a forma não submete a técnica construtiva, tampouco ocorre o oposto. Procura-se, na circunstância de cada projeto, elaborar os seus pressupostos com o maior cuidado e pautar-se neles com toda a clareza.

Sem abdicar do próprio à construção interna ao processo projetual, busca-se o determinante, como algo um tanto externo a este processo, e, assim, encontra-se seu próprio e livre curso; para exercer-se a ‘especificidade arquitetônica’.

Este nos parece ser o modo de superar a querela sob a qual tantos de nós nos debatemos, numa inglória contradição que não estabelece correspondência entre o que se julga necessário e o que se realiza; contrapondo seja ‘discurso’ e ‘prática’, seja ‘formalistas’ e ‘tectônicos’.

Talvez por influência dos estudos na música (composição), mas certamente por conta da erudição, compondo este domínio sofisticado do processo projetual, Risi ultrapassa o plano do emprego de uma ‘linguagem codificada’ enquanto ‘mera prescrição’, seja tecnológica, seja estética e, ao mesmo tempo, não descura na atenção para atingir e constituir referência projetual no plano da construção cultural.

Ao mesmo tempo, como arquiteto formado na modernidade - e que atua com ela -, Risi conhece e opera ‘à moda clássica’. Sua arquitetura é, assim, não um fruto de ‘hábil regurgitar formas pouco digeridas’, então conhecidas e operadas superficialmente, em tempos de congestão imagética, mas o fruto do trabalho de um consistente conhecedor daquilo que maneja, em seu tempo e contando com o beneplácito de conhecer profundamente ‘experiências já vividas’ e transmitidas para quem tenha o interesse em acercar-se delas.

nota

NE
Publicado originalmente - em versão um pouco diversa - em AU-Arquitetura e Urbanismo, Editora PINI, São Paulo, nº 180, março de 2009, p 57 a 63. Todas as imagens foram gentilmente cedidas por Affonso Risi.

referências bibliográficas

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MOURA, Éride. Projeto-Design – Arco Editorial, São Paulo, 2000, nº 254, pag. 78 a 80.


PADOVANO, Bruno Roberto. A arquitetura brasileira em busca de novos caminhos (um seminário em questão). AU –Arquitetura Urbanismo – Ed.Pini, São Paulo, 1999, nº 4, pág 79 a 83.

PROJETO – Projeto editores. Uma agência que respeita as escalas urbana e humana, São Paulo, 1988 nº 109 –, pág 72 a 75.

RIBEIRO, Alessandro Castroviejo. Casas do Brasil 22. AU-Arquitetura e Urbanismo – Ed.Pini, São Paulo, nº 74, pág. 55 e 58/59.

SANTOS, Cecília Rodrigues dos. Risi Tomchinsky Arquitetos Associados: o contextualismo na prática. AU – Arquitetura e Urbanismo – Ed.Pini, São Paulo, 1993, nº 46, pág. 80 a 85.

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endereços eletrônicos

<www.affonsorisi.com.br>

<www.arcoweb.com.br/arquitetura/arquitetura20.asp>

<www.arcoweb.com.br/arquitetura/arquitetura82.asp>

<www.arcoweb.com.br/arquitetura/arquitetura429.asp>

sobre o autor

Sérgio Augusto Menezes Hespanha é arquiteto-urbanista formado pala FAU UPM, mestre (FAU USP), doutorando (PPG-AU UFBA) e professor da FAU UBC. Entrevistou Affonso Risi em 2006.

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