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my city ISSN 1982-9922

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NOBRE, Ana Luiza. Cidade da Música: um lugar à sombra. Minha Cidade, São Paulo, ano 09, n. 104.03, Vitruvius, mar. 2009 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/09.104/1860>.


Vista externa Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques


Vista interna sala de espetáculos, Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista interna sala de espetáculos, Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista interna sala de espetáculos, Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista externa Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista externa Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista externa Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

Vista externa Cidade da Música. Escritório Christian de Portzamparc
Foto Julio Ouricques

 

Elisabeth Bishop causou incômodo, nos anos 60, ao declarar não ser o Rio uma “cidade maravilhosa”, mas um “cenário maravilhoso para uma cidade”. Desconfio que ela tinha razão. O Rio ainda é hoje, sob muitos aspectos, uma cidade sem dinâmica urbana; com exceção das favelas, que bem ou mal atualizam a paisagem, pouco se distingue além do conjunto edificado das décadas de 40-50. Confesso até que senti uma ponta de vergonha quando uma arquiteta austríaca, depois de circular pela cidade por dois dias, perguntou-me, intrigada: “mas afinal, onde está a arquitetura contemporânea”? Isso foi em meados dos anos 90, e só agora posso responder a ela: na Barra da Tijuca. Pois aí estão os shoppings e hipermercados, os condomínios fechados e as torres avarandadas que resumem bem a expansão urbana do Rio nas últimas décadas. Mas é aí também que surgem os dois edifícios hospitalares da rede Sarah, projetados e construídos nos últimos anos por Lelé, e a polêmica Cidade da Música, de Christian de Portzamparc.

Há muito o que dizer sobre este projeto, cujo ponto mais forte é sem dúvida seu partido arquitetônico. Conforme Portzamparc, esse consiste em “criar uma grande varanda” elevada do solo, enlaçando assim o edifício com a cultura arquitetônica brasileira. Além disso, foi intenção declarada do arquiteto dividir o programa em recintos independentes entre si porém contidos, ao mesmo tempo, numa figura geométrica regular, que se repete nas duas lajes sobrepostas (a 10 e 30 m de altura). Na verdade, a força desse partido - que mantém um diálogo evidente com os palácios de Niemeyer em Brasília - suplanta outros aspectos mais questionáveis do projeto, como o problema da acessibilidade num terreno de condição insular.

Portzamparc, arquiteto francês (o que quer dizer, inscrito numa tradição artística que glorifica a inspiração), projeta para sítios específicos, considerando todas as suas condições ambientais e espaciais. Nesse caso, um sítio extraordinário pedia um edifício igualmente extraordinário. E o arquiteto projetou-o com um impressionante domínio da escala do território. Seu edifício tem a grandeza das obras de engenharia que moldaram o território brasileiro, de Brasília às hidroelétricas. Em termos de escala, material e técnica construtiva, dialoga também com as melhores (e mais espetaculares) realizações da escola de concreto carioca: com suas pontes, viadutos, túneis e obras de sustentação de encostas, mas antes de tudo com a arquitetura de Niemeyer, claro, a quem o projeto é quase uma homenagem. Mas ao mesmo tempo – e nisso Portzamparc segue sua poética própria, que nada fica a dever à arquitetura brasileira -, foi dada toda a atenção à esfera mais íntima associada à fruição da música clássica. A alternância constante entre as duas escalas – a escala pública-territorial e a esfera dos prazeres mais íntimos e pessoais - é muito rápida e quase brusca, de maneira que nos vemos sempre em estado de atenção. É impossível não sentir-se afetado pelo movimento que essa passagem provoca, e difícil resistir à reorganização perceptiva que ela nos abre. A cada passo, a pessoa pára, vira-se, avança ou retrocede, e vê surgir novas formas, massas, perspectivas. Talvez incomode um certo excesso de desenho, a manipulação extremamente inventiva das formas, materiais e detalhes que alimenta o caráter espetacular do projeto, embora correndo o risco de beirar o ornamental. Mas é assim que, de descoberta em descoberta, realiza-se uma experiência muito particular e com certeza irrepetível (claro, porque fenomenológica) desse continuum espacial que não se limita ao perímetro bem demarcado do edifício, mas envolve igualmente o fluxo de trânsito e as vias expressas que circundam o terreno e nele se entrecruzam. No nível da “varanda” (a primeira laje, a 10 m de altura), a sensação é a de sermos varados pelo eixo perpendicular à praia. Aí, a velocidade dos carros, o som, o vento; tudo se soma para nos manter em trânsito. Logo nos damos conta de que boa parte da força do projeto está justamente em nos manter na iminência: de outra escala, outra luz, outro ponto de vista, outra experiência. Tudo o que se vê dali – as montanhas, a linha do horizonte, as torres vizinhas – se vê, afinal, como se fosse pela primeira vez.

[publicado originalmente no blog Posto 12 no dia 23 jan. 2009]

sobre o autor

Ana Luiza Nobre, arquiteta (UFRJ), doutora em história (PUC-Rio), professora de teoria e história da arquitetura no Curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio

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