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architectourism ISSN 1982-9930

Park Hotel, Nova Friburgo, 1944, arquiteto Lúcio Costa. Foto Victor Hugo Mori

abstracts

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Cidade marcada pela tragédia ambiental – a enchente no primeiro dia de 2010 arrasou seu centro histórico –, São Luiz do Paraitinga tem se preparado para o desafio do turismo cultural, baseado nas diversas festas “caipiras” do seu calendário anual.


how to quote

CALDAS, Eduardo de Lima; SOUZA, Patrícia Laczynski de; JAYO, Martin. Detalhes em São Luiz do Paraitinga. Arquiteturismo, São Paulo, ano 13, n. 144.03, Vitruvius, mar. 2019 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/13.144/7283>.


São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba paulista, foi fundada em 1769 e tem atualmente aproximadamente 10 mil habitantes. A cidade se notabiliza tanto por suas tradições e atividades culturais quanto pela tragédia que a acometeu no dia 1º de janeiro de 2010, quando o rio Paraitinga transbordou inundando o centro histórico e comprometendo casarões históricos e a igreja matriz.

Trata-se de um município com 617 km², serrano, com muitos rios dentre os quais o Paraitinga, Paraibuna, Paraíba, Rio Claro, Ribeirão Prata, Ribeirão Turvo e Ribeirão Chapéu. Quanto às tradições e atividades culturais, a cidade destaca-se pela Festa de Reis (no Bairro da Santa Cruz), pelo Carnaval de Marchinhas e seus muitos compositores locais, pelas Festas de São Benedito e do Saci, pelas tradições caipiras como a Folia do Divino, as festas juninas e as congadas. Esse calendário é responsável pela atração de cerca de 400 mil visitantes por ano, volume extremamente expressivo para uma cidade de 10 mil habitantes. Destacam-se também, mais afastadas do centro histórico, uma vegetação ainda bem preservada, diversas trilhas e algumas cachoeiras, que atraem um turismo ecológico e de aventura com dinâmica independente do calendário festivo.

Por conta desses atrativos, São Luiz do Paraitinga é, desde 2002, um dos 29 municípios do estado de São Paulo com status de Estância Turística. Trata-se de um título concedido por alguns estados brasileiros a municípios que, além de deterem recursos naturais e/ou culturais de interesse turístico, atendem a determinados requisitos mínimos no tocante à infraestrutura e oferta de serviços. Municípios com esse título, cuja concessão é regida por legislação estadual, normalmente se habilitam para receber verbas específicas de incentivo ao turismo.

Casario restaurado em frente à praça central
Foto Edson Aoki [Wikimedia Commons]

Além das tradições e dos atrativos naturais, há também, comum a muitas cidades do interior, o conjunto central com Igreja (hoje reconstruída) e a praça com coreto, ladeadas por casarões do século 19 e início do 20, e um Mercado Público muito mal cuidado.

A enchente de 2010 não foi a primeira, mas foi de longe a mais severa da história da cidade, o que pode ser atribuído a um desequilíbrio socioambiental: a bacia do rio Paraitinga, que se localiza na porção ocidental da Serra do Mar, tem sofrido ao longo do tempo um grande desmatamento. Isto deixa o solo menos protegido e reduz a sua capacidade de retenção das chuvas, favorecendo o escoamento superficial e o consequente aumento da vazão do rio (1). Com isto, a cidade – sobretudo sua parte baixa, onde se situa a maior parte das construções históricas – tornou-se muito mais vulnerável.

Em dezembro de 2010, pouco menos de um ano após a grande enchente e pouco antes da reconstrução, o centro histórico de São Luiz do Paraitinga foi declarado Patrimônio Cultural Nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan. Muito antes, em 1982, o conjunto já havia sito tombado em nível estadual, pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo – Condephaat.

O centro histórico de São Luiz do Paraitinga tem alguns imóveis com feições coloniais, tombados pelo Condephaat e agora também pelo Iphan, dentre os quais a Capela Nossa Senhora das Mercês (de 1814) e a Igreja Matriz São Luís de Tolosa (de 1840), ambas reconstruídas em sua quase totalidade após a enchente, e a casa em que nasceu Oswaldo Cruz (de 1834). O Mercado Municipal e outros edifícios completam o conjunto tombado.

Interior do Mercado Municipal
Foto Marcos Santos [USP Imagens]

Boa parte parte desse conjunto, originalmente construído com técnicas tradicionaiscomo a taipa de pilão, reduz-se hoje, a imitações das construções originais. Além disso, a reconstrução do centro histórico, financiada por verbas federais, obedeceu à lógica chamada pela socióloga norteamericana Sharon Zukin de “disneyficação” (2). Reconstituíram-se do ponto de vista cenográfico os conjuntos materiais que compunham a paisagem, mas não se restituíram as dinâmicas urbanas e sociais que ali tinham lugar.

A consequência é visível no centro de São Luiz do Paraitinga: a destruição causada pela enchente deu margem ao deslocamento da população que residia no centro histórico para habitações, em áreas periféricas, e esse caminho não teve volta. Uma vez reconstruídos, os imóveis antes residenciais passaram sistematicamente a ter novos usos, ligados em sua maioria ao setor de serviços e ao turismo (3). Como resultado, o centro reconstruído é uma espécie de simulacro urbano, voltado à exploração comercial em detrimento das dinâmicas sociais que ali existiam há relativamente pouco tempo, antes do desastre.

Em suma, além do grande sofrimento da população e da perda de patrimônio enfrentada pela cidade como consequências imediata do desastre, enfrenta-se também uma perda do ritmo urbano e da própria identidade do lugar, como efeito das próprias políticas de reconstrução.

Apesar disso tudo, o fato é que ainda é possível enxergar algumas oportunidades que, se bem aproveitadas pela comunidade, quem sabe ajudem a recuperar parte da dinâmica social e vida local ali tradicionalmente existentes. A oportunidade pode estar nos detalhes.

O Mercado Público Municipal, próximo do rio Paraitinga, permanece em grande parte prejudicado pela enchente. Trata-se de um prédio neocolonial de 1902, com corredores em arcadas que formam um quadrilátero e um grande pátio central descoberto. São 32 lojas (“boxes”), das quais pelo menos dez estão permanentemente fechadas, o que demonstra por um lado a baixa utilização do espaço e, por outro, o potencial passível de exploração. O Mercado é lugar adequado para encontros entre a população urbana e rural, entre vendedores e compradores, entre artesãos e artistas e o público em geral. Os fundos do mercado dão a uma rua defronte ao rio, em que há banheiros públicos e um estacionamento de bicicletas, tudo bastante subutilizado.

O município conta com uma produção agroecológica organizada por meio de associações da sociedade civil. Tanto a produção agroecológica quanto a produção cultural caipira (seja na forma de seus artesanatos, seja na forma de música) não encontra no Mercado Público Municipal espaço para exposição e escoamento.

Além dessa primeira oportunidade, vários outros detalhes chamaram-nos a atenção na área central, quando estivemos no município mais recentemente. Nada de novidade: apenas aspectos que sobressaem pelo potencial de apropriação local.

Um dos detalhes está nos banheiros. Este equipamento existe tanto nos fundos do Mercado, como já mencionado, como também no calçadão central. Ainda que se trate de uma estrutura voltada principalmente a visitantes e turistas, cumprindo seu papel na atual configuração cenográfica do centro da cidade, o detalhe está na forma de aproveitamento da parede externa do banheiro localizado no calçadão. Ela funciona como um organizado painel de anúncios e informações de interesse da população local, com ofertas de compra e venda de terrenos, e prestação de serviços etc. Nada impede também, que neste tipo de mural sejam fixados documentos públicos aprovados pela Câmara Municipal e despachos e pareceres expedidos pelo Poder Executivo. Trata-se de um interessante canal de comunicação para a população da pequena cidade, potencialmente catalisador do tipo de relações sociais, econômicas e políticas que costuma ter lugar no (verdadeiro) espaço público. É o caso de se observar – e fomentar – o potencial de uma velha tradição de fixar nos postes e paredes do espaço público jornais de apenas uma página.

Parede externa do banheiro público usada como painel de informações
Foto Eduardo de Lima Caldas

Outro detalhe é o próprio calçadão já citado. Aqui, observa-se uma bem-vinda inversão de prioridades. Os veículos automotores perdem a prevalência diante das pessoas que podem circular livremente nesse espaço, equipado com o já referido banheiro público, além de um pequeno coreto e de bancos para o descanso, a conversa e a prosa fáceis.

Enfim, além de olhar para os atrativos turísticos e para o potencial que isso pode significar para o desenvolvimento econômico do município, São Luiz do Paraitinga possibilita que olhemos para detalhes que, se bem cuidados, podem tornar-se parte importante de sua dinâmica de reconstrução. Não só a reconstrução visual, que já foi feita, mas a verdadeiramente urbana. Eles podem ser também copiados ou adaptados para a realidade de qualquer município brasileiro, turístico ou não, independentemente de seu tamanho.

notas

1
SANTOS, Carlos Murilo Santos. Memórias e formas urbanas: a reconstrução do núcleo urbano de São Luiz do Paraitinga e a preservação de seu patrimônio cultural. Boletim Campineiro de Geografia, Campinas, vol. 6 n. 2, 2016, p. 385-406.

2
ZUKIN, Sharon. Paisagens pós-modernas urbanas: mapeando cultura e poder. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Brasília, n. 24, p. 205-219, 1996.

3
SANTOS, Carlos Murilo Santos. Op. cit.

sobre os autores

Eduardo de Lima Caldas e Martin Jayo são professores da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH USP.

Patrícia Laczynski de Souza é professora da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.

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