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architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
O autor comenta o quanto a "casinha" de Vilanova Artigas, construída em 1942, é tributária da produção arquitetônica norte-americana daquele momento

english
The author explains how the "casinha" (little house) by Vilanova Artigas, built in 1942, is due to the north american architectural production of that time

español
El autor explica cómo el proyecto de la "casita" de Vilanova Artigas, construida en 1942, le debe mucho a la producción arquitectónica norteamericana de ese momento


how to quote

COTRIM, Marcio. A casinha de Artigas: reflexos e transitoriedade. Arquitextos, São Paulo, ano 06, n. 061.01, Vitruvius, jun. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.061/449>.

A casinha, como ficou conhecida, foi construída em 1942, cinco anos após Vilanova Artigas ter se formado arquiteto-engenheiro pela Escola Politécnica de São Paulo, tendo trabalhado com Oswaldo Bratke e Warchavchik além de paralelamente manter sua construtora – Marone e Artigas – onde, até 1942 construiu aproximadamente 40 casas. No entanto, a casinha foi a primeira construída para si, fato que lhe outorga uma liberdade não alcançada nos projetos desenvolvidos até então.

Ainda que sua importância seja relativamente pequena, quando comparada a outros projetos posteriores, faz-se importante considerarmos algumas questões levantadas por Artigas neste pequeno projeto, sobretudo questões que dizem respeito às inúmeras rupturas em relação à planta da casa tradicional paulista, que ainda carregava valores vinculados a uma estrutura colonial-escravocrata.

As inúmeras formas de ecletismo ou de neocolonial que sistematicamente marcaram as residências dos bairros de classes média e alta na cidade de São Paulo nos trinta primeiros anos do século determinaram certos avanços, como, por exemplo, a libertação dos limites do lote, encorajados principalmente pelos modelos implantados nos bairros-jardins que se espalharam nestes anos. Entretanto guardavam inúmeros aspectos herdados do período colonial. Fato que Nestor Goulart nos exemplifica de forma objetiva:

“Pode-se perceber facilmente que essas casas conservavam as mesmas tendências de valorização social e arquitetônica de certos espaços e desvalorização de outros, que se encontravam nas moradias das classes mais abastadas. Jardins na frente e fachadas rebuscadas, em escala reduzida, ás vezes mesmo de miniaturas, acentuavam a importância das frentes e ocultavam as modéstias dos fundos. Essa disposição, imutável, fazia com que, nos exemplares mais estreitos, a circulação de serviço se realizasse através das salas, até mesmo para as retiradas de lixo. Os inconvenientes de tal situação eram suportados corajosamente com o intuito de preservar uma “lógica” absurda mas que conseguia garantir uma aparência de decoro e ocultar um conjunto de “ vergonhas” tanto mais penosas quanto mais humildes os moradores. De fato as possibilidades de uma eventual visita as cozinhas das casas abastadas nem de longe se comparavam ao sofrimento que tal indiscrição daria a uma dona de casa de classe média, freqüentemente obrigada a realizar serviços que as tradições haviam reservado aos escravos... Os fundos e por vezes, a lateral mais estreita, como áreas de serviço, eram locais de completa desvalorização social, verdadeiro desprestigio, quase tabu herdado dos tempos em que ali estariam os escravos e acomodando agora os filhos daqueles.” (1)

Frente a essa situação é importante ressaltar alguns esforços como os do engenheiro-arquiteto Oswaldo Bratke, com sua casa/ateliê da Rua Avanhandava, de 1947, e a casa do arquiteto Rino Levi, de 1944.

Projetos que – como a casinha de Artigas – propunham questionar, à margem do oficial, os valores e padrões estabelecidos pela sociedade paulistana até então. Nos três casos, desvinculados de qualquer rotulo modernista, forjaram seus questionamentos na própria vida domestica, e apoiavam-se na casa norte-americana, (re) inventada por Frank Lloyd Wright.

As mudanças propostas pela casinha frente ao establishment, poderiam ser divididas em 3 pontos: implantação, o tratamento das fachadas e a distribuição interna. Pontos sugeridos pelo próprio Arquiteto:

“A casinha é de 1942. Foi um rompimento formal meio grande. A partir dela, foi à primeira vez que fiz e tive coragem de fazer porque era para mim, me libertei inteiramente das formas que vinham vindo. Libertei-me da planta porque a cozinha passou a se integrar na sala. Marcou uma nova fase em todo tratamento volumétrico daquilo que podia se chamar fachada, porque a fachada desapareceu”. (2)

A casa foi implantada em 45º no terreno de maneira a desfazer qualquer tipo de hierarquia entre fachada principal, frente e fundo, desaparecendo com isso uma relação já caduca, herdada do período colonial, entre lote urbano e edifício.

Essa solução – abandonada posteriormente, devido às condições do lote padrão em São Paulo, estreito e comprido – determina perspectivas no lugar das quatro fachadas, ressaltadas também pela preocupação no desenho e composição das vistas.

Desaparece também nesta casa outro tipo de hierarquia – a separação entre áreas nobres e não nobres – através da disposição das áreas de serviços, agora unidas de maneira racional, tanto em função do uso quanto da economia. Trazendo desta forma a edícula para junto do corpo da casa, integrando também a cozinha à sala – sem o uso de portas ou paredes – estruturando toda a circulação a partir de um volume central, no caso o banheiro e a lareira, funcionando como uma espécie de pivô, solução que, à margem de questões formais, nos aproxima do esquema das prairie houses de Wright.

Essas mudanças na morfologia da casa determinam uma planta praticamente sem divisões internas, ainda que as paredes estivessem vinculadas diretamente à estrutura. Os outros elementos do programa, como dormitório e estúdio, são definidos por dois meio níveis, integrando tanto um ao outro – por meio de um pé-direito duplo – quanto à sala.

Estratégia que terá importante papel estruturador nas plantas projetadas por Artigas nos anos posteriores, setorizando os espaços de acordo com seus usos e sem o auxílio de paredes.

Por outro lado, a aproximação a Wright, comentada anteriormente, ainda se dá através de outras estratégias: o uso de grandes beirais prolongando o espaço interno, as janelas até a laje, a preocupação com a textura dos materiais e a planta quadrada. Estabelecendo-as principalmente a partir de três âmbitos:

  • ética e verdade quanto ao uso dos materiais;
  • busca de identidade como caminho paralelo à escola carioca;
  • democracia americana x totalitarismo europeu.

 

Diálogo que se deve em grande parte a uma série de reflexos, estabelecidos entre as Américas, sobretudo a partir da segunda metade dos anos 30.

Reflexos

A capital paulista após a primeira Guerra Mundial, já estabelecida como um dos pólos industriais mais importantes do país, encontra nos Estados Unidos uma espécie de modelo, não só no âmbito arquitetônico, mas através de um processo de americanização muito mais amplificado, que tem no cinema seu principal elemento propagandista. Destacando-se através dele e da publicidade o papel da casa como núcleo gerador do estilo de vida americano.

Neste último caso, Frank Lloyd Wright materializa-se para Artigas como referência moral do estilo de vida daquele país, forjado através da democracia norte-americana frente ao totalitarismo europeu. Segundo Artigas, Wright foi um “Humanista, que soube exprimir os ideais democráticos de seu mestre Sullivan”. (3)

Os ideais democráticos de que comenta Artigas parecem estar contidos na formulação de uma nova linguagem para as casas norte-americanas que propõe a obra de Wright. Ainda segundo Artigas: “Protótipos americanos, que substituíssem as velhas soluções européias em conflito com o comportamento Ianque”. (4)

A idéia de protótipo sugere que Wright passa a vida buscando desenvolver uma tipologia para a casa norte-americana. Nisso, Artigas parece segui-lo, ainda que abandone em final dos anos quarenta a referência formal direta às prairie houses.

Entretanto é a partir da segunda metade da década de trinta, com uma série de articulações relacionadas à divulgação da arquitetura moderna nos Estados Unidos, que se introduziram novos personagens fundamentais para a definição da casa moderna americana e como conseqüência a casa moderna paulista.

A exposição do MoMa de 1932 – Internacional Style – é o passo inicial deste processo. Ainda que não reivindicasse uma arquitetura moderna norte-americana, foi um importante passo para estender o ideário moderno europeu ao novo mundo. Extensão que ganha força no final dos anos 30 com a ida de personagens como Gropius, Breuer e Giedion para os Estados Unidos.

Como resultado de uma série de conferências em Harvard, Sigfried Giedion publica em 1940 o livro Space, time and architecture, que se torna o livro de cabeceira dos estudantes norte-americanos da época.

Enquanto o livro introduzia a idéia de precedentes modernos na arquitetura norte-americana, reivindicando através de capítulos como “Evolução na América” a comunhão entre o moderno e uma tradição americana, Gropius construía casas modernas, partindo das mesmas concepções.

Somados a isso, se faz necessário considerar a importante circulação no meio profissional de inúmeras publicações de revistas americanas especializadas: como Architectural Record, Pencil Points, Architectural Forum, Progressive Architecture e Arts & Architecture, também livros como Modern House, que Hugo Segawa destaca como “ literatura produzida no momento que circulou o mundo conduzindo uma ideologia modernizadora, analisando e divulgando obras de vanguarda arquitetônica” (5) onde apareciam arquitetos como Marcel Breuer e William Wilson Wurster, este último participante do Case Study Houses Program, idealizado por John Enteza, editor da revista Arts & Architecture.

Fatos que nos sugerem um jogo de espelhos, uma triangulação entre as Américas e Europa, estabelecida pelo nomadismo de personagens e produções.

Enquanto nos anos 40 o Brasil exportava Brazil Buildings para o mundo, Artigas construía sua singela casinha wrightiana na cidade de São Paulo, Breuer e Gropius se estabeleciam como Arquitetos na América, o programa Case Study Houses de John Enteza, influenciava gerações de arquitetos Europeus e Americanos com sua industrialização redentora, e Louis Kahn viajava por segunda vez a Europa antes de projetar o Yate Galerie.

Uma triangulação sem caminhos pré-estabelecidos, reflexo de um jogo de espelhos, reflexo talvez dos primeiros indícios da crise de um ideário (6).

notas

1
GOULART, Nestor. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo, Perspectiva, p. 68.

2
ARTIGAS, João Batista Vilanova. Vilanova Artigas: arquitetos brasileiros. São Paulo, Instituto Lina Bo e P. M. Bardi / Fundação Vilanova Artigas, 1977, p. 36.

3
ARTIGAS, Vilanova. A função social do arquiteto. São Paulo, Fundação Vilanova Artigas / Nobel, 1989 (São Paulo, LECH, 1981).

4
ARTIGAS, Vilanova. Idem.

5
SEGAWA, Hugo. Oswaldo Bratke. São Paulo, ProEditores, 1997.

6
Outras fontes consultadas: 1. ACAYABA, Marlene Milan. Residências Paulistas 1947–1975. São Paulo: Projeto, s.d.; 2. IRIGOYEN, Adriana. Wright e Artigas: duas viagens. São Paulo, Ateliê Editorial, 2002; 3. SMITH, Elizabeth A.T; SHULMAN, Julius. The Complete Case Study House Program 1945-1966; 4. WRIGHT, Frank Lloyd. An organic architecture: the architecture of democracy. Cambridge, Massachussets: MIT Press, 1970. Facsímil, London: Lund Humhries, 1941, 2ª ed.

sobre o autor

Marcio Cotrim Cunha, arquiteto e urbanista, professor do CUBM-RP e da UNAR, mestre em História da Arquitetura pela UPC/UFMG, doutorando pela UPC Barcelona (orientado pelo Prof. Dr. Fernando Alvarez Prozorovich), colaborador do ULUCK Arquitetos Associados, de Barcelona.

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