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architexts ISSN 1809-6298


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COTRIM, Marcio. Diálogos imaginários: Marcel Breuer e Vilanova Artigas. Arquitextos, São Paulo, ano 06, n. 064.08, Vitruvius, set. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.064/428>.

Sem dúvida a relação existente entre a obra de Vilanova Artigas, Frank Lloyd Wright e Le Corbusier é verdadeira e de fundamental importância, mas considerando-a unicamente, nos afastamos do trabalho do arquiteto entendido como uma unidade, e da possibilidade de compreendê-lo a partir de problemas internos à sua própria arquitetura.

Por outro lado, um distanciamento entre as três produções possibilitaria encontrar em outros arquitetos contemporâneos a Artigas, preocupações e soluções semelhantes, ainda que aplicadas em contextos diversos.

No caso de Artigas e à margem de sua viagem aos Estados Unidos em 1947, esses diálogos podem ser estabelecidos a partir da comparação de obras, plantas e soluções em comum, reforçando dados que nos sugerem, não só o mesmo feeling arquitetônico, mas a presença da cultura norte americano no Estado de São Paulo nos anos 1940 e 1950. Com isso, ao contrário de se postular algum tipo de genealogia entre Artigas e outros personagens, a intenção foi de enriquecer a reflexão sobre o espaço de habitar nestas duas décadas.

Vilanova Artigas e Marcel Breuer, a construção da casa moderna americana

A arquitetura moderna nas Américas sem dúvida passa pelo arquiteto húngaro Marcel Breuer (1902-1981), que em 1937 se muda para os Estados Unidos a convite de Gropius para dar aulas em Harvard, com quem também se associa. Marcel Breuer vive aproximadamente 40 anos nos Estados Unidos, período em que constrói 58 casas fundamentais na definição dos parâmetros do movimento moderno neste país, desvinculando-o principalmente da sombra cultural européia.

Suas casas refletiam o nascimento de um modo de vida americano – gerado pelo espírito positivo e combativo da sociedade americana no período pós-depressão e posteriormente no segundo pós-guerra – e conseqüentemente de uma arquitetura nacional, relacionada intrinsecamente ao âmbito doméstico. Sendo exatamente a partir desta reflexão – a do espaço de habitar – que os dois arquitetos, Vilanova Artigas e Marcel Breuer, se aproximam, ainda que a mesma problemática seja resolvida por caminhos distintos, quando não opostos.

Artigas, ao contrário de Breuer – devido em grande parte ao intervencionismo norte-americano na política brasileira nos anos do pós-guerra – reflete sobre o espaço doméstico valorizando a idéia do coletivo frente aos cânones do capitalismo ocidental, cada vez mais pensado no âmbito do individuo.

Apesar desta separação, torna-se importante a simultaneidade da produção dos dois arquitetos e a preocupação em comum quanto à definição de uma arquitetura moderna forjada nos problemas do habitar. Para isso é importante considerar nos dois casos a síntese do pensamento do velho e novo continente, neste ultimo caso arraigados à figura de Frank Lloyd Wright.

Para Artigas, Wright materializa-se como referência moral do estilo de vida daquele país, delineado através da democracia norte-americana frente ao totalitarismo europeu. Segundo Artigas, “Wright foi um humanista, que soube exprimir os ideais democráticos de seu mestre Sullivan”(2). Os ideais democráticos comentados por Artigas parecem estar contidos na formulação de uma nova linguajem para as casas norte-americanas que propõe a obra de Wright. Ainda segundo Artigas:

Protótipos americanos, que substituíssem as velhas soluções européias em conflito com o comportamento ianque(3).

Aqui a idéia de protótipo, sugere que Wright tenha passado a vida buscando desenvolver uma tipologia para a casa norte-americana, neste sentido, tanto Artigas quanto Breuer parecem seguí-lo. No entanto, ainda que a idéia de uma busca tipológica esteja presente em ambos os arquitetos, essa não se apóia única e exclusivamente na figura de Wright, mas sim na justaposição entre a metáfora da máquina européia e a eficácia da máquina geradora de conforto norte-americana, ou ainda, a consciência de uma identidade, que nos ajuda a compreender parte da obra de Artigas, como um reflexo de um jogo de espelhos, em busca de um caminho a seguir.

Assim, a diferença dos caminhos encontrados pelos dois arquitetos para desenhar a casa – o caminho do coletivo e do individual – passa pelos dois lados do Atlântico e esconde em sua essência a idéia de conforto, na qual tanto Breuer como Artigas buscam referências no passado. Breuer, na tradição inglesa e até mesmo na arquitetura vernácula, enquanto Artigas vai buscar na casa bandeirista paulista e na casa paranaense. Passando nos dois casos pela figura de Wright e pelo Movimento Moderno Europeu do entre guerras.

Pode, talvez, resultar paradoxal estabelecer um paralelismo entre certos aspectos da arquitetura vernácula, ou da arte nacional e o movimento moderno. No entanto é interessante notar que essas tendências diametralmente opostas têm dois traços em comum: o caráter impessoal de suas formas e a tendência a desenvolver-se de acordo com diretrizes típicas e racionais que não resultam afetadas por modismos passageiros(4).

Estratégias de projetos

Ao compararmos plantas e cortes de Artigas com o esquema classificatório de Breuer, não só nos deparamos com formas similares, mas também com a preocupação comum em desvelar o caminho percorrido no processo projetual. No entanto, à margem da proximidade formal e da didática implícita, é importante considerar que Breuer buscou construir uma prática baseada na separação de áreas noturna e diurna, pais e filhos, enquanto Artigas buscou uma unidade, um espaço contínuo sem interrupções, onde todas as relações da vida doméstica estivessem reunidas e interligadas em um espaço praticamente único.

Tendo como hipótese que este tipo de espacialidade – alcançado pelo uso das rampas e pela cobertura única das casas de Artigas a partir dos anos 1960 – seja uma forma evolutiva dos experimentos e variações a partir das residências binucleares deste período. Definindo assim, a idéia de busca tipológica intrínseca a esta evolução como ponto de convergência entre Breuer e Artigas, determinada na busca por relações mais honestas entre os espaços domésticos.

Algumas soluções em comum são sugeridas nas casas dos próprios arquitetos: a casa de Breuer em Lincoln, Massachusetts, de 1939 e a casinha de Artigas em São Paulo, de 1942. Em ambos os casos, o quarto e a sala se relacionam de forma aberta através de meio-níveis, estratégia que será repetida por ambos em diversas ocasiões. Também a lareira começa surgir como o elemento focal do espaço de convivência, gradativamente adquirindo maior importância nas casas posteriores, tanto de um quanto do outro.

Mas será na casa Robson, de 1948 também em Massachusetts, que aparecem mais claramente algumas analogias possíveis: foi projetada em dois núcleos – divididos em área diurna e noturna – configurando entre eles um pátio. Ainda que diferente dos pátios de Artigas – que na maioria das vezes eram gerados pela disposição das rampas e funcionavam como continuação das áreas de convivência – o pátio da casa Robson pode ser entendido principalmente como espaço transitório entre exterior e interior. Nesta casa também aparecem o telhado borboleta e a lareira.

As mesmas características também serão encontradas na casa Grieco, onde o mesmo tipo de planta é resolvido por uma cobertura plana e a lareira desconectada completamente das paredes laterais define os espaços de estar e jantar, como na casa de Artigas de 1949 e na casa Paulo Gomes dos Reis do mesmo ano.

Outro fator importante a ser destacado, consiste na importância atribuída aos elementos de circulação: nas plantas binucleares de Breuer, o acesso às casas; no caso de Artigas, as rampas e escadas.

Alem das plantas divididas em dois blocos, é importante considerar outro tipo, o qual Breuer classifica como long plan, que estabelece outras formas de comparação, sobretudo com a 2ª casa que Artigas construiu para ele, mas também com as casas Heitor de Almeida, Mendes André e a primeira casa Mario Taques Bittencourt.

A seqüência de distribuição do programa das três casas pode ser encontrada principalmente em seis casas de Marcel Breuer: na casa que constrói para ele em Connecticut, em 1947 – também na sua segunda casa –; nas quatro cottages construídas em Cape Cod, Massachusets, entre 1948-1949 (com exceção da terceira e da quarta construídas em 1953 e 1963); e na casa desenvolvida para a exposição do jardim do MoMA, Nova Iorque,1948. Percorrendo nesses projetos um caminho da direita para a esquerda estão primeiros os dormitórios, em seguida um núcleo central de banheiro e cozinha e depois as salas aonde se situa a lareira, por fim ligados ao estar aparecem algum tipo de varanda. Na última, construída para a exposição do MoMa, deve-se acrescentar outro ponto: o mesmo tipo de telhado – o borboleta – mais comprido em um dos lados, estratégia utilizada para conseguir altura necessária para um cômodo superior, no caso de Breuer a garagem no térreo e um dormitório de hospedes no pavimento superior, enquanto no caso de Artigas, uma varanda e um estúdio.

O resultado final das casas assemelha-se apenas em parte, devido principalmente à diferença dos materiais utilizados, no entanto suas plantas buscam definir novos modelos frente aos já estabelecidos.

Segundo Artigas,

fiz uma tentativa de organizar a distribuição do programa da pequena família, de maneira nova, que atenda mais perto a série enorme de fatos da vida cotidiana. Uma organização nova dos serviços domésticos(5).

Segundo Breuer,

o que antes havia sido o dormitório e sala de jogos, podia transforma-se mas adiante na casa dos filhos, onde o antigo dormitório passaria a converter-se em uma pequena sala de estar para receber os amigos(6).

Ainda que não se pretenda defender nenhum tipo de influência entre os dois arquitetos, é importante destacar que além da exposição do MoMA, a revista Architecture d’Aujourd’hui dedicou em 1948, 24 páginas a Breuer, sob o tema da arquitetura doméstica. Outro fato importante a ser levantado foi que talvez a casa de maior importância para a construção destas análises não tenha sido construída, mas sim apresentada a um concurso na revista californiana Art & Architecture, intitulado Designs for post-war living, precursor do programa Case Study Houses. Breuer não ganha o concurso, mas a revista publica o projeto sob o título de Project for a Worker’s House em dezembro de 1943. O projeto da Worker’s House foi o primeiro projeto no qual Breuer experimenta o sistema binuclear e o telhado borboleta tendo como intenção básica definir um tipo de casa para família de classe media nos subúrbios norte americanos. Alem da implantação, do telhado, da lareira e da busca em resolver problemas relacionados à vida doméstica, é necessário destacar nesta casa o papel do pátio, que não só prolonga as áreas de convívio como também possibilita a idéia de um modelo a ser repetido. Solução que se aproxima da casa Geraldo de Estefani projetada por Artigas.

É importante perceber que as semelhanças, assim como as diferenças das casas de Breuer e Artigas se localizam no pátio e se estabelecem exatamente na relação que exercem com terreno onde foram projetadas/construídas. As de Breuer, tranqüilamente pousadas no solo, desfrutando da continuidade espacial criada com a entorno, enquanto as de Artigas buscam recriar essa paisagem em seu próprio interior.

notas

1
O texto foi retirado da dissertação de mestrado apresentada pela Universidade Politécnica da Catalunya, sob a orientação do prof. Dr. Fernando Alvarez Prozorovich: CUNHA, Marcio Cotrim. João Batista Vilanova Artigas: Doze casas paulistas, 1942 a 1969. Barcelona, dissertação de mestrado, ETSAB-UPC, 2002.

2
ARTIGAS, Vilanova. A função social do arquiteto. São Paulo, Fundação Vilanova Artigas / Nobel, 1989.

3
Idem, ibidem.

4
BREUER, Marcel. Sun and shadow. New Cork, 1956, p.38.

5
ARTIGAS, João Batista Vilanova. Vilanova Artigas, coleção Arquitetos Brasileiros. São Paulo, Instituto Lina Bo e P. M. Bardi e Fundação Vilanova Artigas, 1977, p. 62.

6
BLAKE, Peter. “The house in the Museum Gardem, Marcel Breuer Architect”. Boletim do MoMa, vol. XVI, nº 1, Nova York, 1949, p. 1.

referências bibliográficas

ACAYABA, Marlene Milan. Residências Paulistas 1947 – 1975. São Paulo: Projeto. 1984.

ARTIGAS, Vilanova. Os caminhos da arquitetura moderna; (org. Rosa Artigas e José Tavares Correia de Lira). São Paulo, Cosac Naify, 4. ed., 2004.

BUZZAR, Miguel. João Batista Vilanova Artigas: Elementos para a compreensão de um Caminho da Arquitetura Brasileira, 1938-1967, São Paulo, dissertação de Mestrado, FAU-USP, 1996.

Revista Art and Architecture, (Project for a Worker’s House) dez. 1943.

Revista Habitat, n. 1, ano 1, out., 1950.

Revista 2G, n. 17 (Marcel Breuer: casas americanas). Barcelona, Gustavo Gili, 2001.

sobre o autor

Marcio Cotrim Cunha, arquiteto e urbanista, professor do CUBM-RP e da UNAR, doutorando pela UPC Barcelona, orientado pelo Prof. Dr. Fernando Alvarez Prozorovich

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