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architexts ISSN 1809-6298


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Neste artigo Underlea Bruscato e Rodrigo Garcia Alvarado apresentam alguns projetos de vinícolas chilenas, associando os materiais e formas arquitetônicos com as qualidades sensitivas do vinho


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BRUSCATO, Underléa; ALVARADO, Rodrigo Garcia. . Arquitextos, São Paulo, ano 09, n. 098.03, Vitruvius, jul. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/09.098/126/pt>.

A arquitetura industrial está obrigada a estritos requerimentos funcionais, mas em alguns casos o produto elaborado evoca inevitavelmente uma alegria sensível. A elaboração de vinho é precisamente uma tarefa que deve ser acolhida de maneira adequada, porém, não podemos deixar de associá-la com o prazer e celebridade de seu consumo. Muitas vinícolas adaptam velhas adegas agrícolas para sua produção, mas o impetuoso desenvolvimento da indústria do vinho no Chile tem obrigado a levantar novas construções que tentam combinar as exigências industriais com a evocação sensitiva. Recorrendo a materiais e formas voluptuosas que lembram a experiência da sua degustação, com espaços afáveis e sensíveis.

Barricas Nadalie

Inclusive na execução de uma fábrica de barris para armazenar o vinho, a arquitetura chilena parece se entrelaçar na sensualidade. A maioria dos barris utilizados na elaboração vinícola provém da França, com a finalidade de impregnar o produto durante a sua elaboração com os melhores aromas de madeira. Porém, um produtor decidiu transladar os materiais e instalar a montagem de barris para a crescente indústria nacional nas aforas de Santiago. Encarregando o projeto para as suas instalações ao arquiteto Martin Hurtado Covarruvias, conhecido pelas suas singulares construções de madeira e por formar parte da destacada geração de profissionais dos 90 (colega de Klotz, Radic, Puga, etc). Num apertado bairro industrial, Hurtado planejou grandes espaços de trabalho cobertos por uma sinuosa manta de estrutura de madeira laminada.

A execução dos barris implica a acumulação e tratamento de vários produtos afastados da luz solar, mas, ao mesmo tempo, algumas fases de cuidadoso artesanato, de modo que devia combinar a amplitude de uma tarefa industrial feita na escuridão com o meticuloso trabalho de elaboração, além de oficinas administrativas, ingresso e descarga de caminhões. Isto é conseguido com coberturas variáveis e pátios de luz imersos nas áreas de trabalho, que ventilam e outorgam um pequeno momento de verde e claridade no meio do labor cotidiano. A estrutura de marcos de madeira laminada conecta-se em diversas curvas que lhe dão continuidade à cobertura remarcando as distintas zonas e tratamentos luminosos.

Uma parte fundamental da execução do barril consiste no armado e dobragem a fogo das peças, que se realiza num recinto inferior, mas permitindo sua ventilação e vista central no conjunto, que lembra o fundamento artesanal da sua produção. O revestimento exterior consiste em lâminas de fibrocimento com tratamento similar ao da madeira, porém garantindo uma melhor conservação. O perfil ondulado das adegas e a sua cálida terminação em barras lembram sem dúvida os barris que cuidam do apreciado licor. Recentemente foram colocadas placas metálicas sobre as janelas dos escritórios exteriores devido ao intenso sol da tarde em Santiago, mas os usuários estão satisfeitos, já que interpretaram placas brilhantes como um cinto que abraça os barris no jogo simbólico de toda a edificação.

Vinícola Pérez Cruz

Entre as recentes vinícolas chilenas destacam-se, sem dúvida, as instalações da Viña Pérez Cruz, projetadas pelo arquiteto José Cruz Ovalle. Este renomado arquiteto formou-se em Santiago e Barcelona, porém é tributário da mítica Escola de Valparaíso, cultivando uma formulação minuciosa e sensitiva do projeto, com uma produção arquitetônica de grande sutileza e singularidade.

Para as adegas desta vinha, Cruz Ovalle afirma ter-se inspirado nos arbustos das parreiras e seus ramos quebrados, como também nos sombrios corredores e longos telhados das construções campesinas. Planejando vários corpos longitudinais levemente inclinados entre si, o que gera um volume que posa estendido na paisagem plácida do vale vinícola.

A grande asa horizontal unifica os distintos corpos estabelecendo uma referência lineal que remarca a extensão dos prados e contrasta com o perfil quebrado das montanhas próximas da Cordilheira dos Andes. As aberturas entre os corpos geram amplas vistas dos vinhedos e o céu. Entretanto, o mais singular destas construções são os pilares ondulantes de madeira laminada que se elevam e quase instáveis, convidando a um caminhar cadencioso baixo as sombras laterais. Os volumes dividem-se em dois semi-cilindros volteados, que muitos rememoram também a meios barris deitados, deixando um corredor superior de inspeção visual.

A produção vinícola possui muitas tarefas confiadas à decantação gravitacional, isto implica um trabalhar permanente com diferentes níveis de altura e, por esta razão Cruz Ovalle planeja uma circulação central elevada que supervisa as atividades e conecta as distintas funções. Ateliês e laboratórios também se situam nestas alturas e obtêm uma vista generosa para o vale. Tanto assim, que uns dos recintos com abóbodas ao final do conjunto, que era simplesmente uma sala de inspeção de grandes tanques de aço inoxidável, converteram-se num salão de festas que é alugada para matrimônios ou cerimônias especiais. Também o corredor superior com paredes e estruturas curvadas sobre as tarefas, tem servido de galeria de arte e conserva várias obras deixadas em doação.

No exterior, as madeiras de revestimentos e dos pilares sinuosos estão algo desgastadas pelo sol, mas em consonância com as pedras das bases e as terras dos vinhedos com anos de vida que lhe acompanham. Pelo interior, a utilização de madeiras claras e iluminações zenitais que alumbram cuidadosamente as tarefas e armazenamentos da vinícola outorgam uma delicada penumbra à produção. No entanto, nas adegas inferiores, úmidas criptas de cimento armado foi necessário retirar os revestimentos de madeira impregnados que aos enólogos meticulosos pareceu-lhes que contaminavam o sabor do vinho. Em todo caso, os cálidos e elaborados interiores das instalações, apesar dos incessantes processos industriais, lembram o corpo e aroma do saboroso Carmenere que produz a vinha, e os sinuosos e sombrios exteriores evocam a sequeira do Syrah, aquela cepa perdida que havia se mantido oculta nos vinhedos chilenos.

Vinícola Gracia

Um companheiro de trajetória de Cruz Ovalle, o arquiteto German Del Sol, lhe correspondeu projetar as instalações de outra vinícola emergente, a Viña Gracia ao sul de Santiago. O arquiteto Del Sol se caracterizou pelas suas edificações turísticas que oferecem notáveis experiências de encontro com a paisagem natural, e lhe valeram o Prêmio Nacional de Arquitetura no Chile no ano 2007. As instalações da Viña Gracia parecem mais simples e rotundas, um bloco monolítico com perfis semicilindricos, que afirma rememorar também os tonéis de vinho. Recobertos por um ranhurado vertical um pouco desgastado, mas que no seu interior revela um cuidadoso tamiz da luz natural que se presta para as tarefas e armazenamento de vinhos.

Também as oficinas interiores se abrem com volumes coloridos e inchados que desafiam a perspectiva e alegram a rotina quotidiana, lembrando talvez as imagens alucinantes e explosivas da embriaguez. O acesso formal aos barris armazenados evoca também um ambiente surrealista, com grossos muros curvos recortados com fissuras que mostram pedaços das adegas escuras, ensopadas de uma umidade que despertam o sabor etílico. Esta vinha possui, além disso, extensas instalações de engarrafamento de vinho, com máquinas e fitas transportadoras que impõem um ritmo frenético, mas não deixam de celebrar a produção de uma das melhores especialidades chilenas.

Vinícola Kingston

A inversão estrangeira também tem refrescado a produção vinícola local, neste caso a través de uma família britânica com empresas na Califórnia, que decidiu contratar jovens arquitetos para iniciar suas explorações no prolífico vale de Casablanca. Considerando uma expansão crescente e uma extensa experiência no ramo, elegeram as ladeira do vinhedo para planejar uma seqüência de edificações que aproveitasse o desnível do terreno nas tarefas produtivas. Os arquitetos Juan Carlos Sabbagh e Eduardo Cardemil, que iniciam sua carreira independente depois de trabalhar num dos prestigiosos escritórios de arquitetura industrial nacionais, conseguiram realizar um projeto com pragmatismo e delicadeza.

O conjunto é planejado como uma “cidadela” em meia-lua sobre a ladeira, ao modo de um acampamento campesino ou dos estabelecimentos patronais da zona rural, mesmo que atualmente encontra-se executada somente a primeira edificação, como a primeira engrenagem de um sistema produtivo. O volume simples marca a condição geométrica industrializada, que nasce do horizonte dos vinhedos. Umas operações formais de deslocamento das linhas em diagonal, baseadas no escorrimento das águas de chuvas, outorgam-lhe ao volume uma leitura complexa e diversa, aproveitando o recorrido de aproximação que rodeia desde longe a adega. Deste modo, o perfil de um galpão de trabalho se enriquece com a simplicidade da forma e a diversidade de ângulos.

O tratamento superficial de barras de madeira parece recordar os rasgos dos vinhedos e dar-lhe uma condição escultórica ao volume, entretanto muitas peças se retorceram pela forte incidência solar local. No entanto, ao interior resplandece com peças estruturais e revestimentos de madeiras claras que compensam a necessária opacidade da produção vinícola. O espaço está dominado pela incessante seleção e vertido de uva, que expõe jubiloso a fruta originária de um bom mosto, habilmente iluminado desde as alturas como um altar fonte de vida.

As adegas de armazenamento enterram-se debaixo de abundantes muros de cimento, mas os escritórios aproveitam a transparência luminosa, numa disposição central que lhes garante vista sobre todas as tarefas. Também os portões de acesso utilizam malhas metálicas que geram uma particular translucidez desde o interior e um brilho noturno, que junto às escassas, mas cuidadosas janelas, convertem o retraído volume numa imponente envolvente da intensa atividade produtiva. É de se esperar que as seguintes edificações vão seguindo a planificação geral e a delicadeza de um projeto apropriado às tarefas, mas também à complacência da produção vinícola.

Vinícola Altair

Os vinhos premium ou de alta seleção, exigem terrenos e cepas mais sofisticadas e também uma elaboração e ambientação mais cuidadosa. Os criadores da seleta linha de vinhos Altair e Sideral devem ter-se instalado no fundo do vale do Cachapoal, nos mais altos topos das cordilheiras que possuem o melhor terroir da zona e estabeleceram uma férrea aliança com a arte contemporânea para remarcar sua produção. As instalações alojam grande quantidade de obras do destacado pintor vanguardista Bororo, e fragmentos de suas pinturas são utilizadas nas elegantes etiquetas. Além disso, o escultor Francisco Gazitua realizou várias obras que reproduzem as constelações estelares que dão nome a esta linha de vinhos, assim como levantar uma monumental edificação integrada a paisagem do vale.

Antes de enfrentar o hermético e solene volume que alberga esta produção a final do extenso recorrido pelos vinhedos, os visitantes são recebidos num elegante terraço que oferece uma espetacular vista ao vale e degustação de doces e água para preparar o paladar que saboreará a refinada produção vinícola. O edifício principal está constituído por um severo corpo longitudinal reto de pedra e cimento, que parece proteger zelosamente o tesouro elaborado nos férteis terrenos agrícolas. No entanto, o interior nos abre uma excelente luminosidade, amplas circulações e salões de degustação, com materiais e obras de arte que outorgam um ambiente de aquecimento e sensibilidade.

Se descerem as adegas, com uma esplendorosa solenidade de escadarias centrais, altos recintos e estantes que conservam os seletos mostos, numa silenciosa penumbra. As instalações produtivas enterram-se na ladeira para aproveitar a decantação e umidade subterrânea, utilizando os tonéis mais selecionados e sofisticadas maquinarias. Esta edificação, que lhe outorga um marco quase religioso à elaboração vinícola, logra combinar uma arquitetura monumental com a mais refinada sensibilidade.

Vinícola Matetic

No vale de Casablanca, perto da costa de Santiago, outra vinha de seleção edificou uma imponente construção para a produção e difusão de seus mostos, projetada pelo arquiteto chileno-suíço Laurence Odfjell. Encravado sobre uma montanha longitudinal do vale para dominar as plantações de vides, mas ao mesmo tempo, enterra-se para evitar a interrupção da paisagem agrícola. Deste modo estabelece um amplo terraço superior que olha o vale, com um grande aleiro protetor de estrutura de madeira, aberturas e salientes vidrados que anunciam as instalações e adegas inferiores que se aprofundam no solo.

Não deixa ao acaso nem um só detalhe em quanto ao processo de fabricação do vinho e o cuidado do meio-ambiente. Harmoniza a agricultura orgânica praticada no vinhedo e a paisagem natural do vale. Esta adega, com uma capacidade de 300 mil litros, conta com um design de fluxo gravitacional, o que permite lograr um ótimo manuseio da uva proveniente dos vinhedos.

Os espaços e materiais desta edificação se mostram generosos, como a paisagem e os sabores que oferecem. Desde o terraço se divisam os recintos de produção, expostos como um delicado museu de barris e tarefas incessantes. Se descer logo a silenciosos salões de exibição, com pátios interiores que matizam a iluminação interior e entregam prazerosos segmentos de paisagem. Porém a maior surpresa constitui em divisar um enorme salão inferior, em que se desce por uma rampa curva entre enormes muros de pedra que se abre de repente num grande e solene espaço. É impossível evitar as analogias religiosas neste grande recinto ovulado em penumbra, semeado de barris expectantes. A altura e solenidade desta adega, remarcada por focos de iluminação, evocam, sem dúvida, uma catedral aparentemente levantada para honrar ao deus Baco e suas musas etílicas. Degustar posteriormente os delicados vinhos elaborados nesta instalação constitui, não só um prazer, mas também um privilégio, em que se combina a admiração pela paisagem, a experiência arquitetônica, o aroma e sabor do vinho chileno que se desliza e desperta os sonhos e sentidos.

Conclusão

Este repertório de obras reflete, sem dúvida, uma paixão, não só pela produção vinícola, e sim, pela arquitetura, a paisagem, os materiais e o espaço, como uma profunda combinação sensível. A desigual geografia do Chile permitiu cultivos agrícolas excepcionais que brindam vinhos de qualidade internacional, mas também, seus arquitetos parecem fascinados pela paisagem, respondendo com edificações que dialogam com os elementos naturais. Afastados dos dilemas sociais ou culturais que preocupam os grandes centros metropolitanos, esta arquitetura vinícola se vislumbra e repousa na experiência espacial, cobrindo não apenas a atividade produtiva, e sim, todas as conotações que pudessem evocar. Transformando o trabalho arquitetônico de um serviço funcional a um verdadeiro e silencioso espetáculo. A pesar de que talvez devamos reconhecer que depois destes recorridos e degustações ficamos absolutamente embriagados da paisagem.

referências bibliográficas

CRUZ OVALLE, José. “Bodegas de Vinificacion, Viña Perez Cruz”. ARQ, n. 51. Santiago de Chile, jul. 2002, p. 54-63. ISSN 0717-6996.


GARCIA ALVARADO, Rodrigo. “Esbozos de Teoria de la Arquitectura en Chile”. Arquitecturas del Sur, n. 31. Concepción, Chile, 2006.


HURTADO, Martín. “Fábrica de barricas”. ARQ, n. 60. Santiago de Chile, jul. 2005, p. 48-51. ISSN 0717-6996.


SAHADY V., Antonio; NÚÑEZ E., Gustavo; Torres J., Mario; Woerner R., Andrea. Vino desde la Arquitectura, Santiago de Chile, Facultad de Arquitectura y Urbanismo de la Universidad de Chile / Corporación de Fomento de la Producción VI Región de O'Higgins. ISBN 956-19-0411- X, 2003.


VIAL, Carlos J. Bodegas Kingston. Sabbagh y Cardemil.  Santiago de Chile, Plataforma Arquitectura <www.plataformaarquitectura.cl>.


VIAL, Carlos J. Fabrica de Barricas Nadalie / Martin Hurtado. Santiago de Chile, Plataforma Arquitectura <www.plataformaarquitectura.cl>.

sobre os autores

Underlea Bruscato, arquiteta, doutora pela Universitat Politécnica de Catalunya, professora na Unisinos e Unilasalle, Brasil. Pesquisadora visitante na ETSAB-UPC, FAU Universidad de Chile em Santiago e no programa de doutorado Ciudad, Territorio y Sustentabilidad em Guadalajara

Rodrigo Garcia Alvarado, arquiteto, doutor pela Universitat Politécnica de Catalunya, pesquisador visitante nas Universidades Kaiserslautern, Houston, Strahclyde e Bauhaus-Weimar, coordenador de pesquisa e pós-graduação na FACD da Universidad del Bío-Bío

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