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architexts ISSN 1809-6298

abstracts

português
O artigo discute a configuração da centralidade metropolitana de Belo Horizonte sob o olhar do simbólico, do institucional e do econômico. O debate se dá através de quatro núcleos urbanos principais

english
The present article discusses the configuration of the metropolitan centrality of Belo Horizonte through the symbolic, institutional and economical optics. This discussion is made through the analysis of its four major urban areas

español
Esta artículo analiza la configuración de la centralidad de la ciudad de Belo Horizonte teniendo en cuenta aspectos simbólicos, institucionales y económicos. La discusión atraviesa cuatro de los núcleos urbanos más importantes


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SOUZA, Leandro de Aguiar e; MARQUES, Yara Landre; ALVES, Diego Filipe Cordeiro. Centralidades. O simbólico, o institucional e o econômico na região metropolitana de Belo Horizonte. Arquitextos, São Paulo, ano 11, n. 123.02, Vitruvius, ago. 2010 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.123/3517>.

Introdução

A centralidade aqui abordada não é a da utopia da inclusão total, almejada por Lefebvre (1) como o encontro atual ou possível de tudo aquilo que pode ocorrer no espaço. A centralidade discutida nesse trabalho, também ressaltada por Lefebvre, é a que tensiona, quer do ponto de vista econômico, institucional e simbólico ou, na junção destes, forma a linguagem do poder. Tal poder é dado pela força do econômico que, inclusive, subordina, marca, transforma o simbólico e, por diversas vezes, faz uso do institucional para tal fim.

A tensão que o poder exerce sobre o espaço é muito forte, principalmente em espaços periféricos do capital, onde este quer se reproduzir quase ou sem nenhum retorno social, por mais antigo que esse discurso pareça.

A produção do espaço se dá a partir de comandos fisicamente localizados. Quanto maior a efetividade desse comando, mais intensos são os fluxos por ele provocados e a ele direcionados.

Tais pontos de comando trazem consigo o poder e a capacidade de reproduzi-lo. Nessa construção são edificados símbolos que geram identidade e reconhecimento, ou seja, os elementos que o constituem e o suportam são também responsáveis por sua visibilidade.

Essa é, portanto, a gênese de uma centralidade, constituída, essencialmente, pela capacidade de comando, informação e reprodução.

Esse ponto emana sua força e forma uma rede constituída por outros pontos complementares, configurando a centralidade em níveis e escalas. Enquanto os níveis determinam sua força, sua qualidade, a escala é dada pela sua abrangência no território (mundo, países, estados ou departamentos, municípios).

Estas, por sua vez, possuem representações espaciais, embora seja possível desenvolver uma tese de que os centros de comando não demandariam, necessariamente, um lugar fixo, mas uma rede de suporte que permitiria a ocorrência dos fluxos necessários à sua manutenção e reprodução.

O poder hegemônico, no entanto, tem feito, historicamente, a opção por criar representações espaciais que ensejem o reconhecimento da sua força, ao construir elementos que constituem e dão suporte a um centro e também dão a sua visibilidade.

Esse processo não é abstrato, ele se traduz no espaço e em espaços. Tais centros poderiam estar em lugares diferentes dos que estão? Sim, desde que os elementos que constituem e dão suporte a essa estrutura de comando sejam também transladadas.

A discussão aqui empreendida não parte de uma utopia, de um lugar que se quer chegar, mas da apreensão da realidade de Belo Horizonte, um lugar onde se está.

A formação da centralidade regional de Belo Horizonte

A construção de Belo Horizonte, transformada em capital de Minas Gerais, constitui-se na principal transferência de centro de comando no território mineiro, ocorrida no final do século XIX. À Ouro Preto, antiga capital, edificada a partir das riquezas do então decadente ciclo do ouro, restava a manutenção da máquina burocrática estatal, do poder institucional. Tal poder, no entanto, tinha uma identidade espacial cujo simbolismo remetia ao império, e sua topografia acidentada e suas dificuldades de acesso e expansão, associada ao desejo de criação de uma nova identidade republicana, gera a transferência da capital para Belo Horizonte.

Detalhe de mapa do traçado urbano original de Belo Horizonte, datado de 1895 [Fundação João Pinheiro. Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico. Belo Horizonte, Centr]

Construída sob a ordem positivista do século XIX, Belo Horizonte foi planejada a partir da Avenida Afonso Pena, um eixo monumental que liga a Serra do Curral ao Ribeirão Arrudas, pontuada por núcleos de onde surgem vias radiocêntricas, em um traçado no qual predominaram as linhas retas e foram praticamente desconsideradas as condições do relevo.

Belo Horizonte buscou, desde o primeiro momento, a industrialização, mas as crises econômicas da virada do século associadas às disputas locais pelo poder político da nova capital e às dificuldades de equacionamento de questões infraestruturais como transportes e energia retardaram o desenvolvimento econômico-industrial almejado para a nova capital (3).

No âmbito institucional a própria mudança de capital por si só trouxe consigo toda uma estrutura administrativa estadual e municipal cuja expressão foi carregada de simbolismo. A essa estrutura se adicionou a construção de vias e edificações sob uma nova linguagem que ampliou o poder do simbólico. Por outro lado, tal espaço ainda não dispunha de meios de produção que denotassem sua força no âmbito econômico.

Detalhe de mapa do município de Belo Horizonte do ano de 1922. Os pontos em preto fazem referência às ocupações e as linhas em negrito, ao sistema ferroviário [Fundação João Pinheiro, 1997]

Em termos regionais essa situação começa a mudar na década de 40 com a construção da Cidade Industrial Juventino Dias. Tal pólo industrial foi empreendido pelo Estado em área do município vizinho de Betim, que se emancipa através da criação do novo município de Contagem. Essa implantação foi planejada para se dar de forma contígua à capital administrativa e nesse processo o centro de Belo Horizonte se fortalece, principalmente o eixo viário da Avenida Amazonas, que liga a estação ferroviária, o eixo principal da Avenida Afonso Pena, o pólo industrial recém construído e se estende até São Paulo, principal pólo industrial nacional. Nesse momento se forma o embrião do que viria a ser, posteriormente, a centralidade metropolitana.

Detalhe de mapa do município de Belo Horizonte do ano de 1937. Em magenta, indicação de área do hexágono do futuro distrito industrial [Fundação João Pinheiro, 1997]

O centro tradicional, que já possuía, além do traçado urbano característico, o poder administrativo, instalado na Praça da Liberdade e carregado de simbolismo, passa a abrigar os principais bancos, que se instalam exatamente no cruzamento das avenidas Afonso Pena e Amazonas e criam ali um centro financeiro que deu grande visibilidade à Praça Sete de Setembro.

Ressalta-se também que a Cidade Industrial impulsionou a criação, em 1946 (4), da Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG e a centralidade, já regional, passa a gerar fluxos de mão-de-obra, matérias-primas, energia, transportes e, consequentemente, capital.

Na criação da Cidade Industrial o institucional se faz presente através da ação do Estado, responsável pela implantação de toda infraestrutura, associado às indústrias privadas que trouxeram consigo a marca do progresso, dentre as quais se destacaram, em um primeiro momento, a Companhia de Cimento Itaú, no ramo de cimento e a Magnesita, no ramo de refratários (5). Quanto ao simbólico, este se deu tanto na forma urbana hexagonal do distrito, que repetia e ampliava os preceitos anteriormente aplicados em Belo Horizonte, quanto através das edificações industriais que ali se instalaram. Esse conjunto de ações gerou a base econômica necessária para que Belo Horizonte desempenhasse seu papel de centralidade regional.

Imagem orbital do hexágono da Cidade Industrial Juventino Dias, situada no município de Contagem [Google Earth, 2009]

Ainda na década de 40 o Estado cria incentivos para a consolidação da nascente burguesia industrial. Além da transferência, via Estado, de recursos advindos da produção agrícola, a criação de espaços de moradia e lazer para a nova classe alta é uma marca do período. Em Belo Horizonte, a ação do Estado se deu de forma efetiva através da construção do conjunto arquitetônico da Pampulha, composto por 04 edifícios principais (cassino, clube, igreja e casa de baile) no entorno da lagoa. Tais edifícios, projetados pelo então jovem arquiteto Oscar Niemeyer, representavam o ideário modernista emergente e reforçam o caráter simbólico dessa linguagem no município. Tal espaço, se não se configura em uma nova centralidade, se constitui na primeira expansão do centro de Belo Horizonte, pois a Pampulha, além do seu caráter simbólico que projetou o município para além de seus limites, é construída com o objetivo de abrigar o uso residencial da elite industrial em formação.

Apesar da criação de toda essa infraestrutura industrial o período entre guerras retarda o grande surto industrial almejado, que se dá de fato na década de 60, com taxas de ocupação relevantes e algum nível de diversificação (6).

A partir da década de 70 a Praça Sete de Setembro, então o centro financeiro de Belo Horizonte, perde sua força econômica com a transferência dos principais bancos para outros pontos da cidade. Nesse período o centro tradicional passa por uma crise funcional, decorrente dos conflitos de trânsito associados ao traçado radiocêntrico e ao sistema de transporte coletivo bairros-centro, que acentuava ainda mais a saturação desse espaço. Verifica-se então um processo que pode ser aqui chamado de expansão do centro tradicional de Belo Horizonte, que se inicia ainda dentro dos limites da cidade planejada, na Avenida João Pinheiro, onde se instalam alguns dos principais bancos, se estende pela Avenida Cristovão Colombo, onde se configura um importante centro comercial e de serviços, a Savassi. Nessa década o centro tradicional assiste ao esvaziamento de funções sofisticadas e os eixos das Avenidas Amazonas e Afonso Pena se tornam grandes espaços de passagem e baldeações. O fato dessas passagens e baldeações serem feitas, predominantemente, por populações de renda baixa e média-baixa gera um esquecimento por parte da elite e dos administradores públicos locais, acarretando um processo de degradação que se acentua nas décadas posteriores.

O espaço do poder, situado na Praça da Liberdade, ainda localiza-se nos limites da cidade planejada, mas sua conexão enquanto espaço de manifestação do poder (simbólico, econômico e institucional), passa a se dar em direção ao chamado vetor Sul. Esse processo continua a se expandir nas décadas de 80 e 90, com o aumento da ocupação ao longo da Avenida Nossa Senhora do Carmo em direção ao município vizinho de Nova Lima. Nesse eixo centros comerciais, dentre os quais se destaca o BH Shopping e as “Seis Pistas”, são construídos, consolidados e ampliados nas décadas de 70, 80 e 90. Outro fenômeno verificado nesse período é a proliferação, no referido Vetor Sul, dos chamados condomínios fechados, impactando negativamente importantes remanescentes florestais e mananciais de abastecimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte - RMBH, oficialmente criada no final da década de 70.

A configuração da centralidade metropolitana na RMBH

O processo discutido no tópico anterior sofre mudanças substanciais a partir do ano de 2003, quando o governo do Estado apresenta à população os primeiros estudos para a construção da Cidade Administrativa de Minas Gerais – CAMG. A CAMG é um empreendimento que transfere as principais secretarias, órgãos e autarquias estaduais para um único espaço, com um contingente aproximado de 16.000 funcionários por dia e um público flutuante médio de 10.000 pessoas (7). Nos primeiros estudos para a viabilização da CAMG, datados de 2003, foi definido que o empreendimento seria implantado no terreno do Aeroporto Carlos Prates, na região noroeste de Belo Horizonte. Em 2005 o governo do Estado anuncia que a Cidade Administrativa seria construída no local onde funcionara o hipódromo Serra Verde, na divisa de Belo Horizonte com o município de Vespasiano, no Vetor Norte da RMBH. Tal processo envolve uma série de ações conjuntas, dentre as quais se destacam a construção da Linha Verde, importante eixo viário de ligação regional, e a transferência de vôos para o Aeroporto Internacional Tancredo Neves, até então subutilizado. O Vetor Norte, um espaço até então periférico, passa a desempenhar papel central na configuração metropolitana.

Implantação da Cidade Administrativa de Minas Gerais [Governo do Estado de Minas Gerais, 2006]

O deslocamento do centro de comando busca reconfigurar a centralidade urbana, a partir, inclusive, de interesses na região, dentre os quais os imobiliários.

Verifica-se nesse momento a repetição de ações adotadas anteriormente, que vão desde a transferência de um centro de poder estatal (já ocorrido na transferência da capital de Ouro Preto para Belo Horizonte), ao uso das mesmas linguagens modernistas (sendo contratado inclusive o mesmo arquiteto, Oscar Niemeyer) adotadas na década de 40 na Pampulha.

A CAMG certamente irá demandar espaços para o uso residencial de renda média e alta. Se for considerada a tendência de que essa ocupação se dará principalmente através da construção dos chamados condomínios fechados, que na realidade constituem-se em loteamentos murados, com portarias vigiadas e forte esquema de segurança, o contraste entre ricos e pobres se acentuará, uma vez que a região já é ocupada por populações de renda baixa e média-baixa. De forma complementar a esses loteamentos, haverá também a tendência de serem implantados centros comerciais e de serviço, hotéis, centros de convenções, dentre outros equipamentos, que contribuirão para esse processo.

Representação da Cidade Administrativa de Minas Gerais [Governo do Estado de Minas Gerais, 2006]

Não será propriamente o caso de uma mistura de classes em uma mesma região, mas a criação de eixos e ilhas de renda média e alta em áreas já ocupadas por populações de renda baixa.

Todo esse processo denota a fragilidade do processo de planejamento no Estado, ocorrido através da mudança, em um curto espaço de tempo, das diretrizes das políticas urbanas estaduais. A partir de 2003 foi feito o anúncio e a transferência de órgãos públicos para o centro, como a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - SEMAD, dentre outros órgãos estaduais. Tais ações tinham o objetivo de trazer de volta ao hipercentro de BH o caráter de centro de poder institucional. Esse processo, não concluído, é praticamente abandonado com a criação da CAMG.

Ressalta-se aqui que o projeto da Cidade Administrativa de Minas Gerais foi submetido à audiência pública. Mas a questão central, de concentrar a administração do Estado em um só lugar jamais foi discutida, o que mostra a fragilidade dos fóruns de participação popular.

Esse processo é a retirada da figura do Estado dos lugares de conflito, aumentando a separação, nesse caso física, entre Estado e sociedade, ao afastar a administração de uma possível pressão direta que a população poderia fazer.

Ao centro tradicional de Belo Horizonte resta o simbólico que, por sua vez, está dissociado do econômico, que caminha para o vetor sul da RMBH, e do institucional, que vai para o Vetor Norte com a criação da CAMG. Nesse sentido o Estado, novamente o Estado, tem buscado implementar projetos no centro tradicional de Belo Horizonte através do incentivo à realização de eventos, centros culturais, museus, bares, restaurantes e cafés, associados à recuperação e à adaptação de edifícios de valor histórico, em um processo que criaria uma espécie de centro cultural a céu aberto.

Ações que buscam a valorização do simbólico no centro tradicional, sob o espectro da forma, na escala do objeto arquitetônico, trazem consigo o financiamento destas por grandes atores econômicos.

O principal exemplo disso é a proposta de transformação do conjunto arquitetônico da Praça da Liberdade, até então espaço do poder estadual, em “Corredor Cultural”. O econômico e o institucional se fazem presentes na nova proposta para a Praça da Liberdade a partir do momento em que grandes corporações ligadas à mineração, à telefonia, à extração de petróleo, ao mercado financeiro, ali cravarão suas logomarcas e darão nomes aos novos espaços, até então destinados às secretarias estaduais.

O processo de expansão do centro tradicional de Belo Horizonte em direção ao Vetor Sul da RMBH, apesar da consolidação de centros comerciais de abrangência local e até mesmo regional, jamais teve um núcleo capaz de fazer frente ao centro tradicional que lhe dera origem.

A principal mudança em relação a isso se dá com o Projeto Águas Claras, ainda em fase de aprovação junto às instâncias urbanísticas e ambientais, apresentado como “um marco na reutilização de áreas mineradas” (8). Esse projeto prevê a implantação de um bairro de uso misto no município de Nova Lima, em uma área da extinta Mina de Águas Claras, localizada na face sul da Serra do Curral.

As primeiras propostas para o Projeto Águas Claras são datadas das décadas de 80 e 90 e apresentavam uma ocupação do tipo residencial fechado, característica dos loteamentos de renda alta e média-alta situados em seu entorno. O desenvolvimento dos estudos, no entanto, apontou para o potencial da área em se constituir em uma nova centralidade regional, aliando serviços de alta tecnologia, ocupação de áreas ambientalmente degradadas e integração com as estruturas viárias e urbanas existentes.

O projeto Águas Claras, quando implementado, contará com uma população fixa e flutuante de 20 mil pessoas (a população total prevista para a CAMG é de 26.000 pessoas), havendo uma previsão de estimativas de crescimento de 20% do PIB de Nova Lima, 150% no ISS e 50% no IPTU (9).

Representação Panorâmica do Projeto Águas Claras [Minerações Brasileiras Reunidas, 2007]

Segundo o empreendedor, privado, dos 2.066 hectares, apenas 194 (9% da área) serão utilizados para a ocupação. Dos 1.872 hectares a serem preservados, 912 fazem parte da Reserva Natural de Proteção Natural – RPPN do Jambreiro, área esta que já possuía tal destinação à época da apresentação do projeto.

Nesse processo verifica-se uma tensão provocada por um importante ator da iniciativa privada, que cria uma centralidade econômica, para os ricos na zona sul, e pelo Governo do Estado, que cria a centralidade institucional no vetor norte. Em um caso tem-se o lugar onde será definida a atividade (o Projeto Águas Claras) e no outro caso tem-se a atividade e vai ser escolhido o lugar (a Cidade Administrativa de Minas Gerais).

O espaço projetado para o Sul é construído exclusivamente pelo poder econômico e o espaço em construção ao norte é concebido por representantes do governo estadual.

Em um momento inicial, só o poder público financiava as intervenções espaciais. Hoje o poder privado tem uma força tamanha que é capaz de promover intervenções de vulto significativo no espaço, de forma inclusive a modificar a configuração da centralidade metropolitana, como se verifica agora através do Projeto Águas Claras.

Uma diferença fundamental entre o Projeto Águas Claras e os demais espaços aqui analisados (a Cidade Industrial Juventino Dias, a Cidade Administrativa do Estado de Minas Gerais e o próprio centro tradicional de Belo Horizonte) está vinculada ao fato da articulação viária regional ainda não estar definida. Existem diversos projetos viários previstos, ligando esta área ao centro tradicional de Belo Horizonte, sendo o principal deles o chamado Anel da Serra, que corta a Serra do Curral e cria nova articulação entre o município de Nova Lima e Belo Horizonte. Vários desenhos já foram apresentados e discutidos para o Anel da Serra, todos polêmicos, uma vez que atravessariam áreas ambientalmente delicadas (o Parque das Mangabeiras), e socialmente delicadas (o Aglomerado da Serra, um conjunto de vilas ocupadas por populações de renda baixa).

Representação Panorâmica do Projeto Águas Claras [Minerações Brasileiras Reunidas, 2007]

Se o sistema ambiental fosse realmente uma instância que acolhesse o posicionamento dos vários segmentos da sociedade o Projeto Águas Claras possivelmente não seria implantado, uma vez que este se dá sobre área de relevante interesse ambiental.

O Projeto Águas Claras se dá nas “costas” (a face sul) de um dos principais elementos simbólicos de Belo Horizonte, a Serra do Curral. O afeto que a população tem pela serra vem muito do sentimento de agressão ocorrida contra Belo Horizonte no momento em que a mineração impactou significativamente a serra. Muito se discute sobre a dívida que a mineração teria com Belo Horizonte, que tenta ser compensada através de ações pontuais como o patrocínio de eventos e a reforma da Praça da Liberdade, ocorrida na década de 80 e cuja manutenção se dá até os dias atuais. Ressalta-se, no entanto, que a grande ação segue sendo econômica, através da implantação do Projeto Águas Claras, que gerará muitos dividendos à mineração, empreendedora do projeto.

Ressalta-se também que a Serra do Curral, outrora barreira física, é hoje principalmente um marco simbólico, protegida por normas ambientais nem sempre cumpridas à risca, uma vez que atualmente já se dispõem de técnicas de ocupação muito eficientes que permitiriam a ocupação ao longo de toda a serra. A principal facilidade do Projeto Águas Claras é que ele se dá sobre um espaço degradado pela mineração, onde é mais fácil se implantar um empreendimento com tais características.

Considerações finais

A articulação dos quatro núcleos abordados no presente trabalho, cada um com sua respectiva área de influência, seja ela consolidada, em construção, retração ou expansão, formaria a chamada centralidade metropolitana.

Tal configuração, policêntrica, demonstra a vulnerabilidade do espaço às decisões de um poder concentrado.

Na configuração do espaço físico essa centralidade metropolitana periférica opera, cujos símbolos do poder econômico e do poder político estão juntos. As estratégias de espacialização do comando buscam dar visibilidade a tal comando. No caso de Belo Horizonte não se tem uma organização social mínima capaz de se contrapor a esses desígnios do poder aliado ao capital. Todos os aparatos de participação popular empreendidos recentemente são simulacros de democracia, incapazes de barrar ações de vulto empreendidas pelo poder hegemônico.

Os paradigmas de desenvolvimento e sua conseqüente urbanização ainda são muito próximos àqueles advindos do positivo e do modernismo, marcados pela idéia do desenvolvimento a qualquer preço.

Essa metrópole de Belo Horizonte, com os quatro núcleos aqui analisados, é uma metrópole periférica. Desse modo o processo de tomada de decisão nem sempre se situa aqui, pois esse centro simbólico, de um poder local, está diretamente vinculado a processos de tomadas de decisões em escala global. Essa não é uma centralidade inscrita de maneira poderosa em relação ao poder econômico financeiro mundial. Conseqüentemente o espaço gerado por essa centralidade muitas vezes passa ao arrepio da própria conveniência local.

notas

1
LEFEBVRE, Henri. Espaço e Política. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2008 (1972).

2
MONTE-MÓR, Roberto Luís de Melo. “Belo Horizonte: a cidade planejada e a metrópole em construção”. In: Belo Horizonte: espaços e tempos em construção. Belo Horizonte, Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional – CEDEPLAR, 1994.

3
Companhia Energética de Minas Gerais. Informativo CEMIG, 2004.

4
MINAS GERAIS. Governo do Estado de Minas Gerais. Estudos Ambientais do Projeto de Requalificação Urbana e Ambiental do Ribeirão Arrudas. Departamento de Obras Públicas do Estado de Minas Gerais, 2008.

5
MINAS GERAIS. Governo do Estado de Minas Gerais. Estudos Ambientais do Projeto de Requalificação Urbana e Ambiental do Córrego Ferrugem. Departamento de Obras Públicas do Estado de Minas Gerais, 2009.

6
MINAS GERAIS. Governo do Estado de Minas Gerais. Estudos de Impacto Ambiental do Centro Administrativo de Minas Gerais. Departamento de Obras Públicas do Estado de Minas Gerais, 2009.

7
MINERAÇÕES BRASILEIRAS REUNIDAS. “Região Metropolitana de Belo Horizonte ganha novo centro urbano que alia modernidade e preservação ambiental”. Belo Horizonte, Informativo Técnico, 2007.

8
MINERAÇÕES BRASILEIRAS REUNIDAS. “Informativo para Audiência Pública do Projeto Águas Claras: parcelamento e uso misto do solo no pós-mineração”. Belo Horizonte, Informativo Técnico, 2007.

sobre os autores

Leandro de Aguiar e Souza é Arquiteto Urbanista formado pela PUC-MINAS em 2002. Mestre em Arquitetura e Urbanismo pelo Núcleo de Pós Graduação da EAUFMG em 2007. Atualmente é sócio-diretor da P20 Arquitetura Urbanismo e Meio Ambiente LTDA

Yara Landre Marques é Arquiteta formada pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais em 1976. Especialista em Urbanismo pela EAUFMG em 1979. Atualmente é sócia diretora da P20 Arquitetura Urbanismo e Meio Ambiente LTDA

Diego Filipe Cordeiro Alves é Geógrafo graduado pela PUC-MINAS em 2008

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