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research

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architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
O estudo propõe um projeto de reabilitação para conversão de um antigo hotel em edifício residencial. Através de abordagem voltada à qualidade ambiental, foram consideradas quatro vertentes do conforto ambiental: luminoso, térmico, acústico e ergonômico.

english
The study proposes a refurbishment design project for the conversion of an old hotel into a residential building. With an approach towards environmental quality, four aspects of comfort were addresssed: daylighting, thermal comfort, acoustics, ergonomic.

español
El estudio propone un proyecto de diseño para la conversión de un antiguo hotel en edificio de viviendas. Con un enfoque en la calidad ambiental, se estudiaron cuatro vertientes del confort ambiental: iluminación, confort térmico, acústico y ergonómico.


how to quote

TSUDA, Fernanda Panontin; DUARTE, Denise Helena Silva. Reabilitação de edifícios residenciais. Estudos de adequação ambiental. Arquitextos, São Paulo, ano 19, n. 218.01, Vitruvius, jul. 2018 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/19.218/7024>.

A região central da cidade de São Paulo tem sofrido, desde a década de 1970, um intenso esvaziamento e desvalorização causados pela migração de empresas para outros pontos da cidade. Edifícios de grande valor histórico e arquitetônico, construídos a partir das primeiras décadas do século 20, encontram-se subutilizados, ocupados ilegalmente ou vazios. Em pesquisa de campo, Alejandra Maria Devecchi (1) listou 354 edifícios pesquisados nos distritos centrais da cidade, como detentores de potencial para intervenções, por suas características de ocupação e construção. Destes, à época, cerca de 20%, estavam vazios. Vale ressaltar que estudos realizados há mais de dez anos, como os de Valéria Cusinato Bomfim (2) já indicavam uma porcentagem aceitável para a vacância imobiliária entre 5 a 7%.

Dentre as alternativas para o problema está a reabilitação de edifícios, ação que através de atividades de restauro, manutenção, alteração, retrofit, reparo ou reforma, visa devolver atributos econômicos e funcionais, equivalentes aos de um edifício novo. Embora Nick Baker (3) defenda a necessidade de haver uma avaliação profunda sobre a viabilidade das reabilitações, já que, em alguns casos, as características dos sistemas construtivos e estruturais do edifício podem inviabilizá-las economicamente, afirma que os impactos ambientais das reabilitações, quase sempre são menores do que o de demolições e novas construções.

Com esta motivação, foi realizado um estudo para reabilitação do edifício onde funcionou o Hotel Columbia Palace, localizado na Av. São João, em São Paulo, projetado e construído pelo escritório de Ramos de Azevedo, na década de 1920. Composto por térreo mais seis pavimentos, o edifício ocupa quase toda a extensão do lote de 666 m², havendo recuo apenas na fachada do fundo, voltada para o meio da quadra, além de possuir um vazio central, que tem a função de fosso de ventilação e iluminação natural. Tanto no projeto original quanto no uso atual, o fosso não tem abertura para o piso térreo, que hoje é ocupado por um comércio.

Vale mencionar que, em três de outubro de 2010, apoiados pela Frente de Luta por Moradia – FLM, cerca de oitenta famílias, somando aproximadamente setecentas pessoas, conforme dados publicados à época pelo jornal O Globo (4), ocuparam as dependências do hotel que se encontrava desativado, sendo que a ocupação do edifício permanece até hoje.

Imagem de satélite da quadra com destaque ao edifício do projeto
Imagem divulgação [Google Earth]

A proposta principal para reabilitação previu a conversão do uso para edifício residencial, pela demanda apontada para ocupação da região central da cidade.

Hotel Columbia Palace, Avenida São João, São Paulo
Foto Denise Helena Silva Duarte

Além de estudos para adequação dos espaços internos, para atendimento à legislação atualmente em vigência, tais como adaptações para acessibilidade, segurança contra incêndios, substituições de sistemas prediais, foi proposta a intervenção na quadra em que o hotel está inserido, buscando alternativas para reabilitação de lotes vizinhos como forma de estender a valorização pretendida para a escala urbana. Tal intervenção, proposta através da intensificação da arborização e tratamento de pisos, por exemplo, também previa promover aumento dos níveis de conforto ambiental, seja no desempenho térmico, acústico ou de iluminação natural, nos edifícios do entorno dos lotes. Compuseram a proposta: a retirada do comércio no térreo do hotel para a criação de uma área de acesso entre a rua e o interior da quadra, integração da edificação aos lotes vizinhos, a implantação de áreas gramadas ou com pavimentos semipermeáveis que, além de acumularem menos calor, impactam positivamente na redução da temperatura do ar e temperatura radiante média na microrregião, se combinadas com o plantio de árvores de copas maiores e mais densas nesses espaços.

Lotes envolvidos na expansão do projeto
Imagem divulgação [Google Earth]

Com relação à qualidade ambiental, as quatro vertentes: iluminação, térmica, acústica e ergonomia foram abordadas no estudo. Além de medições in loco de dimensões, temperatura e umidade relativa do ar, ruído e iluminância, para as situações de conforto consideradas críticas, adicionalmente, foram realizadas simulações computacionais para verificação da viabilidade do projeto e apontamento de soluções.

Objetivo

O estudo tem como objetivo demostrar a viabilidade da melhoria nos índices de conforto ambiental dos ambientes internos em projetos de reabilitação de edifícios com plantas típicas da região central de São Paulo do início do século 20, analisados através de medições no edifício existente e, em casos específicos como o de desempenho luminoso, simulados através de modelos computacionais como o Ecotect/Radiance®.

Método

Inicialmente, buscou-se alternativas construtivas viáveis, como a construção ou remoção de alvenarias, substituição de sistemas de vedação, hidráulico, elétrico e de transporte vertical, para a elaboração de uma proposta de reabilitação voltada a edifícios com cerca de cem anos de uso, com diversas vantagens inerentes às edificações da época e algumas limitações pontuais. Um diagnóstico detalhado foi feito após a realização de visitas, apoiadas por medições de variáveis ambientais no edifício existente e, posteriormente, por simulações computacionais simultâneas ao processo de projeto, para verificação de desempenho das soluções mais adequadas.

O processo para o desenvolvimento do projeto foi interativo: a partir das medições e simulações, foram sendo gradualmente testadas e definidas as diretrizes para o redesenho do espaço. Cada variável do conforto ambiental foi qualificada e/ou quantificada no estudo, mas o desempenho ambiental foi avaliado de forma integrada, levando-se em consideração os possíveis resultados das soluções adotadas sobre todos os aspectos de desempenho do projeto.

Desempenho ergonômico

Para que a maior parte dos ambientes pudesse suprir a necessidade básica de moradia, o projeto previu a reorganização dos espaços internos através de agrupamentos dos antigos quartos do hotel, sem alterar a estrutura do edifício e com intervenções mínimas na configuração da alvenaria original, um desafio especial derivado da característica típica das construções hoteleiras da década de 1930: a inexistência de instalações sanitárias em todas as habitações. 

Partindo-se das premissas do Manual de Desenho Universal (5), elaborado por iniciativa do Governo do Estado de São Paulo e que defende que os mesmos espaços projetados deveriam ser adequados para pessoas com e sem deficiência e, com base nos estudos de parametrização de medidas mínimas, de Julius Panero e Martin Zelnik (6), foram definidos os padrões para agrupamentos dos ambientes. Do redesenho do projeto original, foram obtidas 43 unidades habitacionais com áreas variando de 29,7m² a 55,4m², com as seguintes tipologias de apartamentos: estúdios, um e dois dormitórios e duplex com um dormitório.

Planta original (esquerda) e plantas-tipo propostas (centro e direita)
Fernanda Panontin Tsuda

Desempenho luminoso

O maior desafio do projeto foi propor soluções para resolver os problemas de iluminação natural, já que metade das unidades habitacionais teriam as aberturas voltadas para o fosso central, cujas dimensões são limitadas a cinco metros de largura por 14,2 metros de comprimento, em um edifício de sete pavimentos, com trinta metros de altura. Desta forma, o estudo de desempenho luminoso baseados na iluminação natural foram os mais aprofundados.

Em geral, as exigências normativas vigentes abordam tanto os quesitos mínimos para potencializar o aproveitamento da iluminação natural, quanto às exigências técnicas mínimas a serem consideradas em projeto de iluminação artificial. A NBR 15.575:2013 (7) traz requisitos e critérios que objetivam propiciar condições de iluminação natural em todas as dependências do edifício habitacional durante o dia, além de definir 60 lux, como nível mínimo de iluminamento aceitável (de luz natural) para ambientes residenciais como salas de estar, jantar, dormitório, copa, cozinha e áreas de serviço. Pela mesma exigência normativa, áreas comuns, de circulação, banheiros e espaços enclausurados não precisam conter aberturas para iluminação natural.

Antes das simulações computacionais, foi feito um estudo de insolação incidente nas faces externas do edifício e nas áreas internas dos apartamentos:

Máscaras de obstrução das fachadas do edifício: fachada frontal SW (esq.) e fachada dos fundos NE (dir.)
Fernanda Panontin Tsuda

As máscaras indicam, inicialmente, que as fachadas frontal e dos fundos não apresentam problemas para incidência de luz solar, sendo que: na fachada frontal há incidência direta de sol no final da tarde no inverno, parte da tarde dos equinócios e em todo o período vespertino, no verão, com pouco sombreamento dos edifícios do entorno. Na fachada posterior, o maior período de incidência direta de sol ocorre no inverno, predominantemente no período da manhã. Nos solstícios: de inverno, há sol na fachada das 6h45 às 12h15 e, de verão, das 9h45 às 12h. Nota-se que no verão, a incidência solar é menor devido ao sombreamento causado por edifícios vizinhos.

Partindo-se da análise das máscaras e do pressuposto que, no quesito iluminação natural, as unidades com aberturas voltadas para as fachadas do edifício receberão mais radiação solar direta, as faces externas teriam desempenho melhor nesse quesito, do que as voltadas para o fosso, com menor fator de visão de céu e, consequentemente, menos disponibilidade de luz direta e difusa.

Máscara do fosso no 1º pavimento
Fernanda Panontin Tsuda

Por esse motivo, também foi elaborada máscara de obstrução para o estudo das aberturas voltadas para o fosso central do edifício, elegendo-se nesse local, o caso mais crítico: o apartamento estúdio localizado no primeiro pavimento.

Imagem do fosso a partir do 1º pavimento
Foto Fernanda Panontin Tsuda

A escolha foi realizada a partir da necessidade de se disponibilizar a maior quantidade de unidades habitacionais possíveis, pensando na viabilidade comercial da proposta. Contudo, como foi observado na carta solar, as obstruções cobriam praticamente toda a visão da abóbada celeste, inclusive no ponto central do fosso, e somente havia insolação nas aberturas desse pavimento, em período muito restrito e no verão: das 10h30 às 13h30, de 22 de dezembro a 9 de fevereiro.

Corte longitudinal
Fernanda Panontin Tsuda

A alternativa foi a retirada das habitações voltadas ao fosso no primeiro pavimento, destinando o espaço a outras funções que atendessem o interesse coletivo e que tivessem menos exigência de luz natural, tais como bicicletário, lavanderia coletiva e salão de festas e realizar as simulações em apartamento do tipo “estúdio”, também voltado para o fosso, mas agora, localizado no segundo pavimento.

O apartamento estudado possui cerca de 33m² de área útil, quatro aberturas voltadas para o fosso e tem segmentação espacial apenas do ambiente do banheiro, embora tenha sido prevista uma pequena divisória entre o espaço central e a área destinada para a cozinha. A profundidade do espaço, com relação à parede com as janelas, é de quatro metros.

Apartamento escolhido para simulações no 2º pavimento
Fernanda Panontin Tsuda

Ainda que estivesse um andar acima, o problema observado na máscara do primeiro pavimento (obstrução quase total da abóbada celeste e incidência restrita de insolação nas fachadas do fosso), pouco mudou. Novamente, o motivo seriam as dimensões reduzidas do fosso (5m x 14,2m) frente à altura do edifício (trinta metros). Com tais proporções, embora essencial para garantia de abertura em todas as unidades habitacionais, o fosso praticamente não permite incidência de luz natural direta e mesmo difusa nas aberturas.

A partir do estudo de insolação, foram realizadas simulações no modelo Ecotect/Radiance®, em que foram observadas que alterações nas dimensões das aberturas das janelas e a escolha de caixilhos mais adequados impactariam de forma positiva no aumento dos níveis de iluminância dos ambientes internos estudados.

Máscara do fosso no 2º pavimento
Fernanda Panontin Tsuda

Para comparação entre os níveis existentes e projetados, foi feita, em primeiro lugar, a simulação dos níveis de iluminância, em um dos quartos do antigo hotel, de área correspondente à da proposta de reabilitação, mantendo-se as características dos caixilhos existentes, de acordo com a planta do projeto original. Também foram adotadas as mesmas alturas com relação ao térreo, as mesmas obstruções externas existentes e iguais condições de céu, para a mesma data.

Todas as simulações foram feitas para céu parcialmente encoberto, para o solstício de inverno (22 de junho) às 12h, data considerada como situação crítica para a cidade de São Paulo, por deter os menores níveis de insolação no ano. Garantir níveis mínimos adequados de insolação na situação crítica indica que, nas demais datas do ano, os níveis também serão atendidos. 

Vista (a partir do ambiente interno) das aberturas originais de edifício (acima) e Níveis de iluminância habitação existente, 2º pavimento (abaixo)
Fernanda Panontin Tsuda [Ecotect/Radiance®]

As simulações da situação existente geraram os seguintes resultados: há níveis de iluminância próximos às aberturas superiores a 600 lux, enquanto a parte mais profunda da habitação tem nível médio de 60 lux. Embora atenda a recomendação normativa vigente (8), o limite mínimo indica eventual necessidade de compensação através de iluminação artificial, que representa aumento na demanda de energia.

Para o projeto de intervenção, foram realizadas três simulações distintas:

Simulação 1 – mesmo tamanho de abertura com alteração dos caixilhos

A primeira proposição, a partir dos níveis obtidos, foi a de alteração das aberturas, levando-se em consideração que o ambiente único do apartamento “estúdio”, deveria ser mais flexível com relação às atividades e uso, já que o espaço depende mais da disposição de mobiliário do que da divisão tradicional de ambientes em uma residência.

Deve-se mencionar que, se comparado ao espaço da simulação anterior, o novo apartamento estúdo é cerca de 5,0m² maior, já que o sanitário do quarto vizinho do projeto original (à esquerda) foi incorporado à nova planta, o que justifica e existência de uma quarta janela nas simulações.

O desenho da caixilharia é fator importante na criação e controle de impacto nos resultados de iluminação, ventilação e ruído; consequentemente, provoca influência direta nos desempenhos térmico, acústico e de iluminação, segundo estudos de Sandra Mayumi Morikawa (9). Devem, portanto, oferecer as possibilidades de escurecimento/sombreamento do ambiente (componentes que permitam a obstrução da luz natural), boa vedação contra chuvas e ruído, além de ventilação permanente, para atender as diferentes necessidades dos usuários.

Para a primeira simulação, foram mantidas as dimensões das aberturas originais, com a utilização de caixilharia diferenciada, que permitisse controle de iluminamento, chegando a garantir 100% da abertura. Assim como os elementos existente no edifício, a maioria dos caixilhos comerciais oferecem apenas 50% de área livre para a ventilação e iluminação natural (janelas de correr), o que, no caso deste projeto, foi considerado insuficiente.

Vista (a partir do ambiente interno) das aberturas existentes no edifício (acima). Níveis de iluminância com caixilhos e aberturas padrão (abaixo)
Fernanda Panontin Tsuda [Ecotect/Radiance®]

Como a alteração para um caixilho com abertura de 100% do vão para iluminação, é possível notar um aumento significativo nos níveis de iluminância do espaço central da habitação, em que passa a predominar a faixa com 120 lux. Áreas com mais de 500 lux ainda estão restritas ao perímetro próximo às aberturas.

Simulação 2 – ampliação das dimensões das abertura e alteração dos caixilhos

Na segunda simulação, para que o mínimo de privacidade fosse mantido, já que as janelas das novas residências, voltadas para o fosso, ficariam defronte umas às outras; optou-se por ampliações moderadas das aberturas existentes, com aumento somente no sentido vertical do caixilho. O ganho na área de abertura ficou em torno de 25% da caixilharia original.

Vista (a partir do ambiente interno) das aberturas ampliadas (acima). Níveis de iluminância com janelas ampliadas (abaixo)
Fernanda Panontin Tsuda [Ecotect/Radiance®]

Com a ampliação das dimensões das aberturas, houve um aumento visível nos índices de iluminância simulados. A ampliação de cerca de 25% da área de abertura resultou no aumento de aproximadamente 35% no índice de iluminância da região central da habitação, que passou de 120 lux para 180 lux, em média. Em pelo menos ¼ da área do apartamento (mais próxima às aberturas), foram obtidos níveis acima de 240 lux, para as condições de céu e período simulados.

Simulação 3 – ampliação das dimensões das abertura e aplicação de componentes especiais

Para a última simulação, foram adotados componentes que auxiliassem a distribuição da luz natural nas áreas mais profundas dos ambientes: as prateleiras ou bandejas de luz. Para adoção das prateleiras de luz, é necessário que a abertura para a janela seja ampliada ao máximo em direção ao teto (janela alta), para que haja espaço suficiente para que a luz direta e difusa incida sobre a superfície do componente, para a reflexão. Considerou-se a existência de viga nas paredes externas do fosso, de altura igual a cinquenta centímetros, segundo planta e cortes do projeto original. Essa foi a medida limite superior para posicionamento das novas aberturas estudadas. Também foram alteradas as alturas de peitoril existentes no projeto original, de cerca de noventa centímetros para um metro a partir do piso, visando redução da carga térmica proporcionada por uma superfície envidraçada maior.

Vista (a partir do ambiente interno) das aberturas com prateleiras de luz (acima), Níveis de iluminância com prateleiras de luz (abaixo)
Fernanda Panontin Tsuda [Ecotect/Radiance®]

Foi possível observar na terceira simulação que, embora sejam sistemas de eficiência comprovada, as prateleiras de luz não apresentaram melhoria considerável no desempenho luminoso com relação à simulação anterior neste caso específico. Tal fato é resultado da pouca disponibilidade de céu para maior captação de luz direta e difusa, na área delimitada pelo fosso.

Deve-se mencionar que por serem componentes de caixilharia especial, as prateleiras de luz são itens que aumentam os custos do sistema de vedação do edifício. Nessa premissa, conclui-se que a simulação 2 seria a alternativa mais adequada para melhoria no desempenho luminoso das unidades habitacionais.

Desempenho térmico

A vantagem do sistema de construção tradicional dos edifícios das primeiras décadas do século 20, constituído por estrutura em concreto, blocos de concreto na vedação externa e revestimentos que somam, pelo menos, 25 centímetros de espessura, além de tijolos cerâmicos nas paredes internas, é o favorecimento à inércia térmica. Para Simon Burton (10), a inércia térmica é a capacidade de um ambiente, através do uso de componentes com grande massa térmica, de reduzir o ganho de calor durante o dia e a perda excessiva do mesmo calor, durante a noite.

Para verificação de possíveis diferenças entre a temperatura interna e externa e constatação do desempenho através da inércia térmica, foram realizadas duas medições, em 11/05/2014, às 16h: uma externa (com o sensor protegido da radiação solar direta e difusa), próxima ao acesso do edifício e outra interna, no primeiro pavimento.

Resultados das medições de temperatura e umidade relativa do ar, no Hotel Columbia Palace
Imagem divulgação

As medições pontuais apontaram, uma diferença de 4°C, entre as temperaturas interna e externa do edifício, para a hora e data mencionadas, provocadas, provavelmente, pelos efeitos de atraso e amortecimento térmicos. Ressalta-se que a medição interna foi realizada no local onde funcionava o antigo restaurante do hotel, ambiente próximo à fachada voltada à Avenida São João.

Segundo a NBR 15220:2005 (11) a cidade de São Paulo localiza-se na zona bioclimática 3, onde as estratégias de condicionamento térmico passivo recomendadas incluem a utilização de materiais e componentes que tenham inércia térmica e promovam o aquecimento solar passivo da edificação no inverno, e a adoção de ventilação cruzada no verão. Esta técnica, no caso do Hotel Columbia Palace, só poderia ser viabilizada através do uso de caixilhos que promovessem algum grau de efeito chaminé, devido ao posicionamento das janelas das fachadas com relação aos apartamentos.

Ao contrário dos estudos de iluminação, os ambientes críticos para análise térmica deveriam ser aqueles em que houvesse incidência maior de radiação solar direta, no caso, os apartamentos com as aberturas voltadas para as fachadas frontal e dos fundos. No caso do fosso central, os andares mais baixos têm vantagens em desempenho térmico, no verão, com relação àquelas voltadas para as fachadas externas, pela incidência mais restrita de radiação solar direta.

Seria necessária, então, a adaptação da caixilharia das fachadas, com a escolha de componentes de vedação que permitissem a entrada e saída de ar, em efeito chaminé, para melhoria dos índices de conforto térmico internos.

Corte esquemático de caixilho para “efeito chaminé”
Fernanda Panontin Tsuda

Desempenho acústico

Seguindo as recomendações da NBR 15575:2013 (12), o edifício habitacional deve apresentar adequado isolamento acústico das vedações externas (ruído aéreo) e das divisórias internas (ruído aéreo e de impacto). É preciso, no entanto, atenção na aplicação de materiais absorvedores acústicos como revestimento em edifícios com alto índice de inércia térmica, como é o caso do Hotel Columbia, para não haver comprometimento do bom desempenho térmico da edificação, justamente por este ter a massa exposta, funcionando como um sumidouro de calor.

Outro problema comum nos centros das grandes cidades, como definido por Ennio Cruz da Costa e Eckard Mommertz (13), são os ruídos internos e externos indesejáveis, ditos ruídos de fundo ou “rumores”, produzidos por máquinas, instrumentos musicais ou pelo próprio homem, que perturbem a audição dos demais sons e que venham a prejudicar o desempenho de atividades ou atrapalhar o período de descanso noturno nas residências.

Níveis de sons e rumores internos para residências
Imagem divulgação

A fim de se verificar pontualmente os níveis de ruídos externos e internos, foi realizada uma medição exploratória com um sonômetro em 11/05/2014, às 16h, na entrada do edifício (nível da rua) e nas dependências do primeiro pavimento:

Resultados das medições dos níveis de ruído no Hotel Columbia Palace
Imagem divulgação

Também foram observados alguns fatores que caracterizam o tráfego na Avenida São João e influenciam diretamente os níveis medidos, tais como: a existência de quatro faixas de veículos (todas no mesmo sentido); a média de dois mil veículos por hora, com cerca de 10% de veículos pesados (principalmente ônibus de transporte público); velocidade média dos automóveis: 50Km/h e distância da fonte à edificação estimada em sete metros.

A partir dos dados das medições e circulação pelas dependências internas do antigo hotel, foram observadas as seguintes situações:

  1. O nível de ruído interno medido, no ambiente cujas aberturas eram voltadas para a Avenida São João, apresentavam praticamente o mesmo nível de ruído externo, em especial pelo péssimo estado de conservação dos caixilhos e ausência de vidros em muitas das janelas;
  2. Todos os níveis medidos, apesar da medição em áreas comuns e de circulação, encontraram-se acima dos limites estabelecidos pela NBR 10152:2017 (14).
  3. O nível de ruído medido nos corredores internos e na área do fosso foi praticamente o mesmo, no entanto, o ruído no fosso, proveniente da conversação entre os moradores das habitações com aberturas voltadas para aquele espaço era inteligível, sendo este o problema mais crítico na análise de desempenho acústico.

Uma das soluções pensadas para a situação foi a introdução de outros ruídos externos como os que provêm do tráfego de veículos na Avenida São João, no interior do edifício, especialmente no fosso central, para promover o mascaramento dos níveis de ruído inteligíveis provenientes dos apartamentos. Para tanto, propôs-se a retirada da laje existente entre o térreo e o primeiro pavimento, no fosso central, que também traria outros benefícios. Além disso, com a remoção da laje, fatores como o aumento dos níveis de insolação e iluminação natural no térreo e a ventilação ascendente no fosso, poderiam contribuir para a perda de calor por convecção.

Áreas úteis das unidades habitacionais propostas
Imagem divulgação

Como medida complementar, foi proposto o aumento da área de absorção sonora das superfícies. Em uma situação ideal, o mais indicado seria o revestimento das superfícies internas dos ambientes com materiais absorventes acústicos, capazes de promover a redução dos níveis de ruídos. Porém, como a aplicação de materiais de alta absorção sonora também podem promover o isolamento térmico das superfícies em que estiverem aplicados, perde-se a capacidade de utilização da inércia térmica favorável do edifício, comprometendo os bons índices de desempenho térmico da edificação.

Por este motivo, indica-se a aplicação de acabamento rugoso, tanto nas superfícies externas do fosso central, quanto nas paredes, pilotis e teto do pavimento térreo, com a intenção de aumentar a área de absorção sonora, sem comprometer a massa térmica, como o chapisco grosso, por exemplo. O resultado esperado é a diminuição da reverberação acústica originada dos ruídos de fundo internos das habitações e do ruído externo introduzido no ambiente, evitando-se que a solução adotada não represente um novo problema gerado pelo projeto.

Projeto final

A proposta de projeto final contemplou a alteração no número de habitações com redução de 83 quartos existentes no antigo hotel, para 43 novos apartamentos, contemplando diferentes tamanhos e configurações: apartamentos estúdios, um e dois dormitórios e duplex com um dormitório. A adaptação priorizou criar unidades habitacionais compactas, porém, ergonomicamente adequadas, com espaços para circulação e instalação de mobiliário e equipamentos domésticos em tamanho padrão.

Intervenção na quadra
Fernanda Panontin Tsuda

Pavimento térreo, acesso
Fernanda Panontin Tsuda

Foram exploradas diversas tipologias de apartamentos, já que havia um limite estrutural de intervenção derivada do próprio desenho original do edifício. As áreas de circulação e acessos foram redesenhadas para se adequarem à legislação de acessibilidade e prevenção a incêndios.

Primeiro Pavimento, áreas comuns
Fernanda Panontin Tsuda

Segundo Pavimento
Fernanda Panontin Tsuda

Para expansão da intervenção além do lote, foi proposta uma intervenção na quadra com a integração entre terrenos vazios vizinhos, arborização, criação de um corredor comercial, fachada ativa e um espaço de apoio a ciclistas.

Pavimento tipo ímpar
Fernanda Panontin Tsuda

Pavimento tipo par
Fernanda Panontin Tsuda

Conclusões

O tema da reabilitação de edifícios ganha, a cada dia, mais abrangência, seja através de programas da iniciativa pública, de empresas privadas que se tornam especializadas nesse ramo da construção, ou pela quantidade de trabalhos técnicos ou acadêmicos desenvolvidos nos últimos anos que abordam o assunto.

A reabilitação de edifícios, todavia, vai além da alternativa para reversão do esvaziamento dos centros das cidades ou do ato de reformar construções obsoletas. Quando a opção pela reabilitação é viável - arrisca-se dizer que, pelas características construtivas das edificações do centro de São Paulo, seja a maioria dos casos, os projetos tornam-se potenciais ferramentas para melhorar os níveis de desempenho geral das edificações, além de contribuir para a redução do consumo de energia na fase de operação, bem como em toda a cadeia produtiva, quando a reabilitação se contrapõe à demolição e construção de novos edifícios.

Ainda com relação às características construtivas dos edifícios paulistanos do início do século 20, as paredes e lajes mais espessas dão aos edifícios vantagens para a inércia térmica e a isolação acústica entre salas e entre pisos, propondo resultados de desempenho superiores à grande parte das edificações de construção recente. Os resultados das simulações dos níveis de iluminância apontaram para a possibilidade de melhoria no aproveitamento da luz natural nos ambientes internos, demonstrando que mesmo situações consideradas críticas, como nas de aberturas de residências em fossos de iluminação e ventilação, podem ser ajustadas, adequando-se os edifícios através da reabilitação para um novo uso, considerando-se o desempenho ambiental.

Como resultado final, o projeto buscou propor acomodações com melhores condições de habitabilidade a seus ocupantes, não apenas dentro do edifício, mas também fora dele, ao expandir a intervenção para outros lotes da quadra.

notas

NA - Agradecimentos especiais aos professores Helena Aparecida Ayoub Silva e Norberto Corrêa da Silva Moura, da FAU USP, pelo apoio na elaboração do projeto e nas simulações computacionais.

1
DEVECCHI, Alejandra Maria. Reformar não é construir. A reabilitação de edifícios verticais: novas formas de morar em São Paulo no século XXI. Tese de doutorado. São Paulo, FAU USP, 2010, p. 35.

2
BOMFIM, Valéria Cusinato. O Centro histórico de São Paulo: a vacância imobiliária, as ocupações e os processos de reabilitação urbana. Caderno Metrópole, n. 12, São Paulo, 2004.

3
BAKER, Nick. The handbook of sustainable refurbishment: non-domestic buildings. London, Earthscan co-published with RIBA Publishing, 2009, p. 3.

4
Texto editorial de Ananda Gouvêa, publicado em 29/08/2012. Disponível in <http://cbn.globoradio.globo.com/grandescoberturas/ antenas-cbn/2012/08/29/OCUPACAO-SAO-JOAO-DESPEJO-COM-DATA-MARCADA.htm>.

5
SÃO PAULO (Estado). Governo do Estado de São Paulo. Desenho universal: Habitação de Interesse Social. São Paulo, 2010. Disponível in <www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/manual-desenho-universal.pdf>.

6
PAÑERO, Julius; ZELNIK, Martin. Dimensionamento humano para espaços interiores. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2002.

7
ABNT. NBR 15575: Edificações Habitacionais — Desempenho. Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2013.

8
ABNT. NBR 15575-1 Edificações Habitacionais — Desempenho Parte 1: Requisitos gerais. Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2013.

9
MORIKAWA, Sandra Mayumi. Refurbishment of underused buildings in Central São Paulo. Master Dissertation. London, Architectural Association School of Architecture, 2012, p. 65.

10
BURTON, Simon. The handbook of sustainable refurbishment: housing. London, Earthscan co-published with RIBA Publishing, 2012.

11
ABNT. NBR 15220: Desempenho Térmico das Edificações. Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2005.

12
ABNT. NBR 15575: Edificações Habitacionais — Desempenho. Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2013.

13
COSTA, Ennio Cruz da. Acústica técnica. São Paulo, Edgard Blucher Ltda., 2003; MOMMERTZ, Eckard. Acoustics and sound insulation: principles, planning, examples. Boston, Birkhäuser/Edition Detail, 2009.

14
ABNT. NBR 10152: Acústica — Níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2017.

sobre as autoras

Fernanda Panontin Tsuda é arquiteta e urbanista pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (2015). Mestranda na área de concentração Tecnologia da Arquitetura, da FAUUSP, na linha de pesquisa de Conforto Ambiental, Eficiência Energética e Ergonomia. Experiência profissional na área de projetos residenciais e comerciais, com foco na utilização de materiais e técnicas para melhoria na qualidade ambiental dos edifícios.

Denise Helena Silva Duarte é professora associada do Departamento de Tecnologia da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, onde atua desde abril de 1999. É coordenadora do LABAUT - Laboratório de Conforto Ambiental e Eficiência Energética da FAU USP e líder do Grupo de Pesquisa LABAUT no CNPq. Atualmente coordena o projeto “O papel do planejamento, do desenho urbano e do projeto de edifícios na adaptação à mudança do clima na microescala”, financiado pela Fapesp.

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218.00 urbanismo

A construção do espaço público em Medellín

Quinze anos de experiência em políticas, planos e projetos integrados

Denise Antonucci and Lucas Bueno

218.02 projeto

Magnis maxima?

Consideração ao Conjunto do Edifício MAPI do arquiteto Elgson Ribeiro Gomes

André Luís Cordeiro da Costa

218.03 crítica

Nas encostas dos vales

Variações do tipo na arquitetura multirresidencial em Salvador, Bahia

Márcio Correia Campos

218.04 teoria

O construir como afeto

A casa como corpo e não manifesto

Iazana Guizzo

218.05 planejamento urbano

A tênue fronteira entre o público e o privado

O Complexo do Anhembi na mira: transformar ou liquidar a cidade?

Eunice Abascal and Carlos Abascal Bilbao

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