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drops ISSN 2175-6716

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Luiz Philippe Peres Torelly disserta sobre o ídolo, alguém que admiramos que compartilhamos crenças e ideias, com quem queremos parecer ao menos um pouco.

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TORELLY, Luiz Philippe. Ídolos. Sobre Vinícius, Baudelaire, Drummond, Che, Marx, Sinatra, Churchill, Bukowski, Truffault, Hobsbawn, Guinle e meu pai. Drops, São Paulo, ano 15, n. 083.02, Vitruvius, ago. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/15.083/5267>.


Ao longo da vida vamos nos reinventando. Construindo, descontruindo, aprendendo com o amor e a dor, com a experiência e a reflexão. Creio piamente que os ídolos que entronizamos em nosso imaginário têm tudo a ver com esse processo que nunca termina. Ídolo é alguém que admiramos e que compartilhamos crenças e ideias, com quem queremos parecer ao menos um pouco. Vou começar pelos masculinos. Em outra feita falarei sobre as mulheres, mais densas, enigmáticas, amorosas e quando querem insondáveis. Inicio com pieguice e muito carinho por meu pai Eloy Torelly. Seu jeito despojado, polêmico, espirituoso, carioca. Quando faço a barba todas as manhãs, vejo sua imagem confundida com a minha no espelho. E tenho certeza que somos da mesma cepa. Meu ídolo preferido.

Desde os tempos do primário Vinícius de Moraes, ou Vininha como prefiro, me aproximou da poesia e da música. Sua vida agitada, romântica, o whisky, as mulheres, o cigarro, o tornavam para mim o ídolo quase perfeito. Uma mistura de Baudelaire e Carlos Drummond de Andrade. Che Guevara apareceu logo depois, nos agitados e oníricos anos 1960. Foi à descoberta do socialismo, qualidade ou defeito que cultuo até hoje. Me sentia nas matas bolivianas libertando o campesinato e o proletariado. Alguns perguntarão? E Karl Marx? Ora Marx não é humano, é quase um Deus. Nesta sequência me deparei com Jean Paul Sartre. Intelectual, polêmico, boêmio, era tudo que eu queria ser. Menos feio como ele. Depois que soube de sua fama de sedutor, subiu alguns pontos a mais, situando-se no estamento superior.

Uma guinada para a direita e para o outro lado do Atlântico: Frank Sinatra, o maior cantor de todos os tempos. O “old blue eyes” de quem ouço incansavelmente, sempre as mesmas músicas, especialmente My Way. Seu chapeuzinho de lado, seu olhar matreiro, seu gosto pela vida noturna e pelos amigos completam a preferência. Há um ídolo todo especial: Wisnton Churchill. Embora não goste de suas ideias conservadoras e imperialistas, tenho profunda admiração por todo o resto. Sua atuação como primeiro ministro inglês durante a 2ª Guerra impediu que os nazistas dominassem toda a Europa e tornassem o mundo pior ainda. Sua frase proferida quando dos bombardeios a Londres em 1940, “Nós só temos a oferecer sangue, trabalho, suor e lágrimas” é imortal. Mas não só de política vivia nosso personagem. Exímio pintor, pasmem pedreiro e historiador – ganhou o Prêmio Nobel de Literatura – era também um apreciador emérito da champanhe e do whisky. Certa oportunidade em seus muitos embates com Lady Astor, primeira mulher a compor a Câmara dos Comuns, travou o seguinte diálogo: Lady Astor: “O senhor não tem vergonha de estar bêbado”, Churchill retrucou: “Amanhã estarei sóbrio, mas você continuará feia”.

“Os ‘beats” também foram um soco no estomago. Kerouac, Burroughs, com suas peripécias loucas em plena “guerra fria”, prepararam o mundo e as artes para o que viria nos anos 1960. Minha preferência especial nessa turma é Charles Bukowski, de longe o meu predileto. Bares, mulheres, poesia e corrida de cavalos eram seu mundo. Consolidou meu gosto pela literatura não muito “ortodoxa”, poesia e por esses ambientes onde os homens alcançam alguma igualdade que são os bares. Poxa, como não falar de François Truffault. Jules e Jim, A noite americana, A mulher do lado, O homem que amava as mulheres. A atmosfera romântica e as mulheres diáfanas da nouvelle vague não saem do meu consciente. Acho que é o único caso que conheço de uma pessoa que primeiro fez o filme e depois escreveu o livro, no caso O homem que amava as mulheres.

Darcy Ribeiro sempre foi para mim o protótipo do intelectual orgânico que não é babaca. Difícil saber como teve tempo para escrever tantos livros, que ajudaram a explicar a gênese da alma brasileira, se envolver em tantas aventuras e polêmicas e amar tantas mulheres. Creio ser daquela espécie de homem lendário, cuja atualidade não permite mais conceber. Eric Hobsbawn que ao longo de 70 anos escreveu sobre quase tudo: marxismo, jazz, história, banditismo, sociologia, uma verdadeira enciclopédia, foi o último dos intelectuais pop. Quando o vi em Paraty, na FLIP, há dez anos, fiquei encantado como um nonagenário tinha tamanha desenvoltura e desembaraço para falar com naturalidade e objetividade sobre temas complexos. Ficou horas autografando livros dos quais tenho a honra de ter dois exemplares.

Por último mas não menos importantes, duas figuras impagáveis da cena brasileira do século 20. Embora frequentadores de círculos diversos, compartilhavam a alegria de viver. O primeiro deles é Jorginho Guinle. Membro da família que talvez tenha sido a mais rica do Brasil, concessionários do Porto de Santos e proprietários do Copacabana Palace, entre outros negócios. Era a encarnação do autêntico magnata. Quando via ele sorrindo, acompanhado daquelas belas artistas, sempre de smoking, Kim Novack, Gina Lolobrigida, Ava Gardner, pensava: esse cara sabe viver. Orgulhava-se de nunca ter trabalhado. Gastou tudo. Morreu pobre ,vivendo de favor no hotel que um dia foi de sua família. O segundo é Jaime Ovalle. Não é a qualquer pessoa que tem poemas escritos por Manoel Bandeira e Vinícius de Moraes em sua homenagem. Inventor na Nova Gnomonia, uma taxionomia pré tropicalista da humanidade, Ovalle brincava e zombava carinhosamente da mais fina intelectualidade brasileira da época. Autor da clássica Azulão em parceria com Manuel Bandeira, tem uma obra intelectual pequena, diante de sua reconhecida criatividade e da aclamação de seus contemporâneos. Só lendo a biografia que Humberto Werneck escreveu sobre ele, denominada O Santo Sujo para conhecer suas incríveis e inusitadas estórias. Como dizia Vinícius de Moraes, Jaime Ovalle “é inclassificável”.

Certamente estou cometendo muitas injustiças. Esquecendo no momento alguns ídolos que me causarão arrependimento. Paciência, a vida é assim mesmo. Tenho a impressão que já não existem ídolos como outrora. Faróis existenciais que eliminavam a angústia da escolha. É só seguir aquela trilha. Nossos tempos não toleram os românticos, poetas e transgressores. São os tempos cinzentos do consumo e de uma moralidade farisáica.

sobre o autor

Luiz Philippe Peres Torelly é arquiteto e urbanista. Atualmente é Diretor de Articulação e Fomento do Iphan.

 

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