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interview ISSN 2175-6708

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Nesta entrevista feita por Ana Rosa de Oliveira, o arquiteto e paisagista Roberto Burle Marx conta um pouco da sua trajetória e comenta seu trabalho

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OLIVEIRA, Ana Rosa de. Roberto Burle Marx e o jardim moderno brasileiro. Entrevista, São Paulo, ano 02, n. 006.01, Vitruvius, abr. 2001 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/02.006/3346>.


Jardins frontais do Cassino da Pampulha, Belo Horizonte MG (1942-43)
Foto Ana Rosa de Oliveira 1996

No intuito de apresentar algumas das chaves da poética de Burle Marx foi realizada essa entrevista. Ela realizou-se em 1992, quando eu iniciava as pesquisas para a minha tese de doutorado em Barcelona. Posterior a uma exaustiva busca nos escritos de Burle Marx e da crítica especializada muitas questões continuavam sem resposta. Isso me levou a buscar um contato com Burle Marx, para que, a partir das suas próprias declarações eu pudesse gerir as dúvidas surgidas. Roberto Burle Marx concedeu-me essa entrevista em sua casa, no Sítio Santo Antônio da Bica, Rio de Janeiro, dois anos e meio antes de falecer. O seu tempo era escasso e ao longo da entrevista não parou de pintar. Vestido com um jeans e uma camisa branca, manchada de tintas, ia pintando e orientando o seu ajudante sobre o modo de dispor a tela de serigrafia ou a cor e a quantidade de tinta a ser utilizada. A entrevista transcorreu entre telas de serigrafia, tintas, pincéis, plantas, um pouco do universo que o circundava.

Ana Rosa de Oliveira: Se estabelecêssemos uma evolução para o seu jardim, seria possível dizer que inicialmente houve uma busca mais ecológica, preocupada com a valorização da vegetação nativa e as associações de plantas e, posteriormente uma preocupação estética?

Roberto Burle Marx: Inicialmente meus jardins tiveram um enfoque ecológico. Mas esse enfoque é bastante relativo. Eu fiz, por exemplo, o jardim do MEC com umas manchas bastante abstratas, pois nessa época eu já conhecia Arp. De modo que não se pode dizer que meus jardins, mesmo nos seus inícios, tivessem uma preocupação essencialmente ecológica.

ARO: Estudando suas conferências e entrevistas publicadas encontrei muita informação sobre sua formação botânica, porém o Sr. não fala muito da sua formação artística. Quem ou que momentos são importantes nessa formação? Os escritos importantes. Como a música influencia na sua formação?

RBM: [Olhando para uma tela de serigrafia contra a luz, comenta: "Engraçado, olhando daqui, como fica bonito esse carmim e este azul. Nós muitas vezes vamos encontrar aquilo que buscamos, no momento. Por exemplo, todos esses azuis, são uma lição de raffinement"]. Eu tive uma mãe musicista, cantava muito bem, era ótima pianista e tinha uma sensibilidade diabólica, diabolique ou divina. Ela gostava de plantas. Quando eu comecei a trazer plantas do mato que eu gostava ela nunca disse: "Ai Roberto, isso é mato". Ela dizia: "Roberto que coisa bonita, eu nunca tinha visto, isso é uma espécie de manifestação divina". E no fundo... eu não sou religioso, mas existem forças que eu não consigo explicar. Por exemplo, porque gostamos de uma determinada cor, de um determinado momento que para outros não tem a menor importância. Há alguma coisa misteriosa. Depois eu comecei a me preocupar com as plantas e a descoberta das plantas, sobretudo no Brasil é uma coisa fabulosa...

As influências vêm ao longo da vida. Todos tivemos uma certa convenção. Eu sou da época em que se ouvia Wagner o qual teve influência na minha vida, um Schuman, um Schubert, pois minha mãe os cantava muito bem, desde que eu me entendo eu os ouvia. Existem certos músicos que embora eu considere de certo valor não os sinto fortemente. Uns gostam de jardim, outros de seixo rolado... Hoje está de moda fazer jardins sem vegetação, no entanto quem conhece a vegetação, sua fenologia... (Olhando para a tela pintada: Deixe-me ver. Está ótimo. Agora dê um tom dum azul esverdeado, esse azul mesmo).

ARO: E a sua viagem a Berlim?

RBM: Eu estive na Europa de 1928 a 1929. Vivi um ano e meio em Berlim. Tudo o que eu vi na época em que estive em Berlim, as obras de Wagner, a suite Pelleas et Melisande, as sinfonias de Beethoven, os músicos, um Hindemit, um Schoenberg, um Alban Berg, foram artistas que tiveram uma importância muito grande na minha formação.

ARO: Eu gostaria de saber se além da música, da valiosa descoberta das plantas brasileiras no Jardim Botânico de Dahlem, nesse período que o Sr. viveu em Berlim, houve uma descoberta similar, referente às novas tendências da pintura que se concretizavam na Europa?

RBM: Em Berlim eu freqüentava as exposições, principalmente as dos expressionistas alemães. Mas o que eu quero dizer é o seguinte... em arte, o problema não se circunscreve apenas ao conhecimento da pintura. É tudo o que aconteceu naquela época. Por exemplo, eu ia ao Jardim Botânico, eu ia às óperas, havia 3 óperas funcionando em Berlim. Os diferentes cenários, eu vi os feitos pelos maiores cenaristas da época. Esse convívio com a música, com as plantas, tudo isso faz um tecido cultural. Eu quero dizer com isso que a cultura é uma coisa só.

Eu detesto essa idéia de que o paisagista só deva conhecer plantas. Ele tem que saber o que é um Piero de la Francesca, mas também compreender o que é um Miró, um Michelangelo, um Picasso, um Braque, um Léger, um Karl Hofer, um Renoir, um Delaunay. Digamos que isto sim, o que eu acho muito importante na vida é não se circunscrever a uma coisa só. Mas eu também gosto de poesia, de música, como de uma sinfonia de Bella Bartok. Eu quero dizer que a vida é a gente saber observar, absorver e, possivelmente uma coisa que talvez tenha me ajudado muito é que eu nunca perdi a curiosidade pelas coisas. Com a idade que eu tenho sempre tem uma coisa nova, é uma cor, uma coisa que me induz a ver.

["Olha eu quero um azul, aquele azul que estou falando, esverdeado, é quase no tom desta tela", mostrando a tela de serigrafia]

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