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interview ISSN 2175-6708

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Sérgio Ferro comenta a complexidade da atuação de Flávio Império nos diversos campos artísticos ao tratar de sua formação, interlocuções e contribuições para as artes no Brasil.

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GUIMARAES, Andreas; CONTIER, Felipe de Araujo; LOUREIRO, Lívia. Flávio Império e as múltiplas facetas de um projeto brasileiro, por Sérgio Ferro. Entrevista, São Paulo, ano 13, n. 051.01, Vitruvius, jul. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/13.051/4405>.


Aula de Flávio Império na FAU-USP
Foto divulgação [AAVV. Flávio Império em Cena, 1997, p. 102]

Lívia Loureiro: A atividade de docente do Flávio se difere muito na FAU. Foi de certa maneira muito radical na FAU e não sei se na FAAP [Fundação Álvares Penteado] ele assumia as mesmas posturas como professor. Você pode falar um pouco sobre isso?

Sérgio Ferro: Nós três viramos professores, hoje uma coisa inimaginável, no ano seguinte à nossa saída da escola. Nós nos formamos em 1961 e começamos a ser professores em 1962. Os três na mesma turma, na FAU. Mas cada um em uma cadeira diferente. Eu com o Flávio Motta, o Rodrigo com o Nestor e o Flávio com a Renina. Mas depois, ao mesmo tempo, nós éramos professores da FAAP, da escola de Tiradentes, depois fundamos juntos a escola de Santos, então houve sempre uma grande comunhão.

FC: E a escola de Brasília? Eu nunca entendi sua participação na UNB [Universidade Nacional de Brasília].

SF: Não, Brasília foi diferente. Foi fechada pela ditadura uma época e depois foi reaberta. E quando foi reaberta uma boa parte do antigo corpo de professores estava dispersa. Então pediram à alguns professores, assim, metidos a besta, como eu, que fossem lá falar de arquitetura e dar uma espécie de... não de programa propriamente dito, mas uma espécie de visão de arquitetura para orientar novas proposições. Eu fui lá fazer isso.Durou pouco tempo.

FC: E o Flávio não foi?

SF: Não.

LL: E em Santos? O Flávio foi?

SF: Foi. Na FAAP ele dava aula no primeiro e segundo anos e eu dava no terceiro e quarto. Nós tínhamos feito uma divisão do trabalho, dessa vez bem programada. Primeiro e segundo ano ele destruía os preconceitos dos alunos. Ele era bastante agressivo e os meninos saiam de lá em pedaços. E eu no terceiro ano era o bacana, devia pegar os caquinhos que ele me entregava, os cacos das pessoas, e rejuntá-los. Funcionou bem.

Casa Simão Fausto, Ubatuba, 1961. Arquiteto Flávio Império
Foto Renato Cury [Acervo Sociedade Cultural Flávio Império]

FC: No debate da perspectiva profissional sobre o papel do arquiteto e do artista, o quê dessa opinião é de grupo e o quê cada um de vocês pensava diferente? Em relação à perspectiva de vanguarda ou técnica, por exemplo, quais eram as nuances da posição do Flávio?

SF: Nenhum de nós, nem mesmo o Rodrigo até então, tinha uma visão profissional, à la IAB. Sou arquiteto, carteira assinada...

FC: O Rodrigo não?

SF: Até então. O Rodrigo depois teve que fazer isso quando saiu da prisão, mas nenhum de nós tinha essa visão profissionalizante. Nem como pintor, nem como gente do teatro.

FC: Nem como arquiteto?

SF: Não. Cada um de nós tinha suas especificidades. Nossa característica primeira era poder circular de campo em campo, não como amadores, porque não éramos. Por outro lado estávamos sempre num núcleo, da pintura, do teatro, etc., mas sem aquela espécie de fascinação monogâmica com cada um desses métiers.

FC: Ou seja, não são especialistas?

SF: Éramos.

FC: Especialistas em diversas especialidades?

SF: Isso mesmo. Não éramos marginais no sentido de “faço um pouco de pintura, um pouco disso ou daquilo”. Em cada área de nossa atividade, estávamos no centro. Estudantes ainda, almoçávamos todo dia no IAB, sentávamos com o Artigas ou o Paulinho, pro exemplo. Arquitetos de calça curta mas metidos a besta. Idem em pintura: o Flávio representou o Brasil numa Bienal e eu, ao mesmo tempo, era conselheiro Ciccillo na Bienal e ensinava no MASP [Museu de Arte de São Paulo]. Participamos na direção das melhores e mais avançadas revistas da época, “A parte” e “Teoria e Prática”. O Flávio ganhava todos os prêmios de cenografia. Tínhamos uns 26 anos quando a mais importante revista de arquitetura dedicou um número especial à nós. Desculpem a falta de modéstia, mas quero mostrar que nem éramos marginais, nem endeusávamos cada um desses métiers. Isto foi nossa força e nossa fraqueza. Nossa força na medida em que nos permitiu uma produção crítica em cada uma destas atividades e nossa fraqueza por não termos sido adotados por nenhum destes campos. Na exposição “50 anos da FAU” o Flávio foi apresentado como homem de teatro, eu figuro como pintor e o Rodrigo foi excluído.

FC: Se a Arquitetura Nova existe como um movimento, como um grupo, na sua atuação como um todo, não se restringindo a arquitetura, que perspectiva você acha que propõe em termos de atuação?

SF: Primeiro: não se trata de ilustrar ou dar forma ao sonho lá longe. Toda pirueta técnica, gratuita, para fazer extravagância em nome do progresso das forças produtivas, é ridícula. Ao contrário, aproveitar os meios existentes criticamente. A abóboda, por exemplo, não foi adotada por nós para fazer bonito. A questão para nós era: “qual é a cobertura mais racional tecnicamente, em termos de custo, de cálculo, do canteiro, etc.?”. Como estrutura, a abóboda é perfeita. Pode ser executada facilmente, sem risco para o operário. Utiliza pouco concreto, portanto diminui o risco de silicose; as vigotas são leves, etc. Nosso objetivo era combater essa história, que ainda vinga, de desenvolver primeiro a técnica e somente depois distribuir casa, equipamento, etc. Temos o necessário para começar hoje a dar respostas às necessidades sociais elementares. Falta a transformação política. Nós não fizemos, mas a geração da Ermínia e do Nabil conseguiu fazer.

FC: Mas conseguiu porque foram, em parte, disputar o Estado.

SF: Lógico.

FC: Mas e o seu grupo?

SF: Não se esqueça que ao lado disso nós fazíamos política também, nós queríamos o Estado.

FC: Essa era a perspectiva?

SF: Não dá para desligar a atuação política nossa e o que fazíamos em arquitetura. Não é “eu faço arquitetura e também política”. Não é assim. É, “eu faço arquitetura e portanto...”, pois a arquitetura que queremos fazer é tal, e portanto nós temos também que ser políticos.

FC: Mas não política partidária, de disputar...

SF: Não. Se quiser, em termos vagos, há que fazer a revolução, senão não fazemos nada.

FC: Isso é diferente do que fez a geração da Ermínia, que foram para o partido, disputar eleição, disputar cargo, ser quadro técnico.

SF: Sim.

FC: Na verdade a pergunta é qual a perspectiva nesses termos? Porque vocês conseguem essa autonomia que vocês tiveram, de mudar de ângulo, mudar de posição, estar aqui, mas não estar, estar no centro das questões, mas ser excêntrico, em grande parte porque vocês não estão no Estado ou em nenhuma empresa.

SF: Exatamente.

FC: É individual, arquiteto profissional liberal, com seu cliente. Mas o cliente é também fugaz, ora tem ora não tem. Há uma precariedade nessa perspectiva que é difícil de se converter em sistema, em política.

SF: Muito, muito grande. Ao meu tempo, como a gente fazia várias coisas, a gente ganhava uma merdinha como professor, uma merdinha como arquiteto, uma merdinha escrevendo, e juntando essas merdinhas dava pra sobreviver. Mas não era nenhuma perspectiva gloriosa de carreira. Em todas nossas atividades, dando tudo certo, chegaria uma hora em que encontraríamos um muro. Dai pra frente seria necessário mudar a zorra do jogo.

FC: Aconteceu isso de certa forma, por que o Rodrigo foi pra Hidroservice, você foi pra universidade, passou a ter um salário, e o Flávio?

SF: O Flávio tinha uma vantagem: era o único solteiro de nós três, e ele podia fazer muito mais sacrifícios do que nós. Porque uma coisa é fazer sacrifício na sua pele e outra é fazer na pele do filho ou da mulher. Então eu e o Rodrigo tivemos que, de uma certa maneira, entrar.

FC: É muito curioso, pois fica ambíguo. É uma posição muito outsider...

SF: Mas ao mesmo tempo, não esqueça que estávamos vivendo sob a ditadura. Não adianta a gente entrar nessa briga na ditadura, seja como for, porque não há nenhuma possibilidade de realizar nada...

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