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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
O artigo de Cristiana Guimarães traz uma análise urbanística-arquitetônica da cidade de Parauapebas, no Pará, em sua situação atual

how to quote

DE OLIVEIRA GUIMARÃES, Cristiana Maria. Os percalços de uma localidade que quer ser cidade. Minha Cidade, São Paulo, ano 10, n. 120.03, Vitruvius, jul. 2010 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/10.120/3489>.


Vista panorâmica do bairro Rio Verde atualmente
Acervo da autora, 2010


Rua do Comércio, Parauapebas
Acervo da autora, 2010

Rua do Comércio, Parauapebas
Acervo da autora, 2010

Avenida Liberdade, Parauapebas
Acervo da autora, 2010

Construções em madeira nas proximidades da Rua do Comércio
Acervo da autora, 2010

A recém-inaugurada sede da Prefeitura Municipal de Parauapebas
Acervo da autora, 2010

Companhia Paulista de Pizza, Avenida Liberdade, Parauapebas
Acervo da autora, 2010

 

Parauapebas (1) tem sua origem mesclada ao Projeto Ferro Carajás e ao Projeto Grande Carajás (2). Essa condição marca sua realidade sócio-espacial: desde a década de 1980, as transformações são rápidas e contínuas, impulsionadas, entre outras coisas, pelo grande número de migrantes de diferentes regiões do Brasil. Esses por sua vez, vêm motivados pela rede de oportunidades geradas a partir da instalação das atividades mineradoras.  Apesar de serem inúmeros os pontos merecedores de análise, nosso interesse aqui é bem modesto: focaremos essas palavras na relação entre a complexificação da sociedade, o amadurecimento da cidade e as mudanças em sua paisagem.

A análise da cena urbana de Parauapebas é contraditória: se de um lado, há o estranhamento causado pela tocante falta de arquitetura, de outro é impossível não perceber as referências urbanas fortes, assim como espaços públicos vitalizados.  O centro é pólo de comércio e serviços – concentra atividades diversas, como as da área de saúde, os serviços jurídicos, os educacionais além daqueles relacionados à administração pública.  O comércio não é setorizado, como temos o costume de ver: comércio pesado de um lado, boutiques de outro; bancos e serviços ocupando espaço diverso.  Aqui tudo se mistura, lojas de material de construção, ao lado do comércio de roupas, que por sua vez, divide a vizinhança com supermercados.  Essa diversidade carrega positividades: o centro comercial e de serviços não é, de forma alguma, elitizado.  Todos passam por ali, têm que ir ali.  O comércio misturado não segrega as pessoas: a vizinhança múltipla atrai diferentes pessoas, com os mais diversos propósitos.

Entre as várias especificidades que saltam a vista, a falta de qualquer infra-estrutura se destaca. O esgoto se mistura ao escoamento pluvial, pela falta de drenagem e redes de esgotamento sanitário necessárias. Mesmo com o extremo situado em bairros mais pobres, a falta de água é democrática. É interessante, senão quase absurdo, notar que o uso dos elevadores torna-se comprometido pelas constantes interrupções no fornecimento de energia elétrica – ou em bom português, as pessoas evitam seu uso pelo receio de ficarem presas devido às não eventuais faltas de energia elétrica.

Parauapebas comemorou, em 10 de maio de 2009, seu vigésimo primeiro aniversário. Os slogans veiculados pela Prefeitura Municipal anunciam que há apenas 21 anos a localidade era uma vila e hoje é um reconhecido pólo de desenvolvimento.  Realmente, as transformações acontecem em ritmo frenético.  A rapidez com a qual as mudanças se realizam modifica o sentido do tempo, tal como o conhecemos no cotidiano de outras cidades.  A dimensão temporal adapta-se ao local – a história da cidade configura uma perspectiva de aproximadamente 20 anos, na qual uma instituição ou um bairro com seus 10 anos de existência passam a ser considerados tradicionais.  As construções de 15 anos são antiguidades, que transitam entre a necessidade de serem reformadas ou substituídas ou permanecerem como relíquias. 

Nesse rebuliço de transformações, o provisório vem se modificando em permanente.  Isso é válido tanto para o físico e material da paisagem, como também no que se refere aos desejos e expectativas de sua população.  Mesmo ainda sendo expressivo o número de trabalhadores que vêm para cumprir um serviço temporário trazido por alguma empresa, que por sua vez, também tem contados seus dias de trabalho na cidade, cresce o número daqueles que aqui chegam de “mala e cuia”.  Esses últimos não chegam mais sós, mas trazem consigo suas famílias e ilusões maiores que “trabalhar, juntar um dinheiro e ir embora tão logo quanto possível”.  Esperam, assim, uma contrapartida da cidade: conforto em suas moradias, que deixam de ser vistas apenas como pouso provisório, no qual a qualidade máxima é ser econômico, boas escolas para os filhos, equipamentos e atividades de lazer, além de assistência médica adequada.

Nesse ponto, guardadas as diferenças próprias a cada período e situação, cabe usarmos como analogia, a análise feita por Sylvio de Vasconcellos (3) sobre o processo de desenvolvimento de Vila Rica/Ouro Preto.  Segundo o autor, ainda na fase da aglutinação dos primeiros mineradores, o caráter provisório da localidade era visível pelos tipos e características da arquitetura.  As residências não passavam de “casebres de madeira”, enquanto as igrejas, principais referências simbólicas e sociais a época, eram improvisadas e arranjadas.  Não havia ainda a certeza da permanência no local, nem a segurança para investir ali os custos de construções caras e trabalhadas.  Completava o quadro, a falta de desejo de ali fincar raízes, que pudesse justificar, como depois aconteceu, o empenho das pessoas em construir residências das quais pudessem se orgulhar.  Com o passar do tempo e o amadurecimento da cidade, essa realidade foi se transformando.  Houve a substituição das casas de madeira, por outras de pedra e alvenaria, as pequenas capelas deram lugar a templos maiores, posteriormente decorados de maneira luxuosa.  Cada irmandade deixou o altar lateral nas igrejas matrizes para dedicar ao seu santo padroeiro um templo único que ilustrasse, do modo mais grandioso, quanto fosse possível, a devoção dos seus fiéis.

Tal como, o amadurecimento do povoado em Vila Rica construiu os símbolos de sua época [alguns estão entre os mais belos], aqui em Parauapebas, as novas marcas citadinas estão sendo providenciadas.  Contudo, agora, não falamos mais de igrejas, mas de shoppings centers.  Em setembro de 2008, ainda antes da comentada crise mundial, aconteceu o lançamento do primeiro shopping center na cidade: o  Unique Shopping Parauapebas (4).  Serão 126 lojas, com 3 lojas âncoras, 4 salas de cinema e praça de alimentação para 600 lugares, distribuídos em  21.200 metros quadrados (5).  De acordo, ainda com o folder publicitário de seu lançamento (6), trata-se de

“um projeto arquitetônico inspirado nos complexos comerciais mais modernos. Priorizando a harmonia entre as pessoas e o respeito ao meio ambiente. O Unique Shopping Parauapebas vai mudar o cenário da região”.

Mudaram-se os objetos, mas o processo assemelha-se.  É visível o aprimoramento no cuidado com as edificações destinadas ao consumo, aos serviços (bancos, hotéis, empresas, hospitais) e ainda aquelas que sediam as diversas funções da administração municipal.  A recém-inaugurada sede da Prefeitura Municipal mostra isso.  Depois de décadas ocupando a edificação pioneira, ainda construída pela Companhia Vale do Rio Doce, nos inícios do projeto minerador, a administração municipal inaugura uma nova sede própria.  Substituindo, a anterior, ainda em madeira, a nova Prefeitura – como é conhecida - apresenta linguagem e elementos que a identificam como arquitetura contemporânea.

Além desses exemplos, surgem vários outros, menores, mas significativos em seu conjunto. Diariamente, despontam no cotidiano distraído casas com arquitetura mais elaborada, novas sedes empresariais que vêm substituir as provisórias de outros tempos, ou novas fachadas comerciais mais adequadas a uma sociedade que vai se tornando, a cada dia, mais exigente.  Aqui e ali são percebidos os investimentos em melhores construções, mais elaboradas e sofisticadas.  A princípio, essas surgem se destacando no meio das construções antigas improvisadas e muitas vezes precárias, mas pouco a pouco, processam um efeito em cascata, que mobiliza a vizinhança, provocando nesta, outras melhorias e muitas vezes substituições dos usos e imóveis tradicionais por novos (7). A ex-localidade vai, aos poucos, deixando seu tom de acampamento provisório, para experimentar as doçuras e agruras de uma cidade consolidada.

Um rápido passeio por Parauapebas, ou a comparação entre imagens recentes e antigas, nos sugere estarmos vivenciando um processo de melhoria progressiva na [e da ] cidade.  Entretanto, mergulhando em águas um tanto mais profundas, percebemos que o fenômeno aproxima-se mais de uma elitização da cidade, que de sua melhoria. 

Em outras palavras, as transformações citadas acima acontecem em locais específicos, com origem e fins também específicos e na maior parte das vezes, privados.  Assim, concretizam, não uma melhoria urbana, no sentido ampliado, mas um processo de diferenciação sócio-espacial, no qual as elites vão conseguindo modificar o espaço no qual circulam e vivenciam, enquanto os que não detém suas condições não podem fazer o mesmo. Infelizmente, cada vez mais, em um processo que se realimenta, os espaços das elites vão se tornando inacessíveis aos mais pobres, e os desses, por sua vez, repulsivos às elites.

notas

1
O município de Parauapebas está localizado a sudeste do estado do Pará,a aproximadamente 700 quilômetros da Capital (Belém).  Configuram seus limites os municípios de Marabá, de Curionópolis, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte. De acordo informações da Prefeitura Municipal de Parauapebas, os dados gerais do município são: Estimativa da População 2009: 152.777; Área da unidade territorial: 7.008 km²; Produto Interno Bruto 2007 - PIB - R$ 3.069.686 bilhões; PIB per capita 2007 - R$ 23.029; Eleição municipal 2008 (Número de eleitores) - 85.628. <Disponível em: www.parauapebas.pa.gov.br>

2
O Programa Grande Carajás (PGC) foi criado pelo Decreto-lei nº1813, em 24 de novembro de 1980.  Resumidamente, tratava-se de um projeto para o desenvolvimento de uma região ainda remota, mas considerada potencialmente importante depois da descoberta das jazidas minerais na Serra de Carajás.  No âmbito do PGC estava o Projeto Ferro Carajás, sob responsabilidade da Companhia Vale do Rio Doce, que tinha por objetivo  a exploração  das reservas de minério de ferro, ouro e outros minerais na região.  Confira: BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Planejamento. 1980. Programa Grande Carajás: um desafio lançado a todos os segmentos da sociedade brasileira. Brasília, Presidência da República.

3
VASCONCELLOS, Sylvio de. Vila Rica. Formação e desenvolvimento – residências. São Paulo: Perspectiva, 1977, p.17, 44-45. VASCONCELLOS, Sylvio de. A arquitetura colonial mineira. Barroco, n.10, 1978/9

4
As perspectivas ilustrativas do projeto e da futura construção, assim como outras informações, estão disponíveis no site do empreendimento: www.uniqueshopping.com.br

5
Conforme folder publicitário distribuído na ocasião do lançamento do empreendimento, em setembro de 2008.

6
Conforme folder publicitário distribuído na ocasião do lançamento do empreendimento, em setembro de 2008.

7
A questão da gentrificacíon e dos altíssimos índices relativos à especulação imobiliária será considerada com maior cuidado em ocasião mais oportuna.

sobre a autora

Cristiana Guimarães é Arquiteta e mestre em Arquitetura pela UFMG, doutora em Ciências Humanas: sociologia e política, também pela UFMG. Atualmente, coordena o Know How arquitetura e interiores, escritório de arquitetura e urbanismo sediado em Parauapebas, PA.

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