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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
O autor faz uma análise da história urbana de Porto Alegre, a partir dos diversos planos, até as atuais transformações que visam a copa do mundo de 2014 e os jogos olímpicos no Rio de Janeiro de 2016.

how to quote

MARQUES, Sérgio Moacir. Cidade moderna, cidade mutante. Praia de Belas, 1752-2016. Minha Cidade, São Paulo, ano 12, n. 134.03, Vitruvius, set. 2011 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/12.134/3955>.



Cidades americanas concentram heranças urbanísticas plurais de passado colonial, neoclássico, positivista e moderno, entre outras, em arranjos distintos que prevalece a circunstância histórica. Este collage, definido por Rowe e Koetter (1), designa os processos de hibridização entre marcha histórica, ações urbanísticas, tradição cultural, fatores mesológicos, restrições econômicas, vontades coletivas e consequências políticas, muitas vezes conflituosos, dos quais o espaço urbano é vestígio resultante.

A cidade moderna, com exceção de exemplos canônicos, não se impôs como projeto uníssono e unívoco, mas sim conjunto de ações perpetuadas em seu tempo e dispostas por agentes de categorias multidisciplinares, cujas interações difundem-se espacialmente. O moderno, como movimento artístico, em que pese diferenças qualitativas na América Latina, granjeou sentido comum, tanto por espírito de modernização almejado, quanto atributos espaciais e/ou estéticos representativos, forjados dentre poder e opinião pública.

Porto Alegre, no entanto, dentre as cidades brasileiras, perseverou ciclos de urbanização em que pragmatismo, objetividade no fazer e militância de abnegados planejadores, adeptos do coletivo, sem rupturas extraordinárias nem monumentalismo exacerbado, capitalizou certa continuidade de evolução urbana e planejamento, até o final dos anos 1970, onde o Movimento Moderno, por vezes, se manifesta como espírito, por vezes em espaço urbano e arquitetura de boa qualidade média.

Como em suas outras expressões idiossincráticas, esta cidade, margem dos grandes centros de irradiação cultural e econômica brasileiros, apresenta urbanismo moderno pouco espetacular no sentido de paisagem e escala, mas de especial sentido realista, coletivo e factível; de senso civilizatório através da modernização urbana qualificadora do espaço, no qual qualidade média compõe conjunto apreciável, ademais malogros e insucessos.

A Porto Alegre moderna, assim pensada como plano de organização territorial e intervenções modernas sobre tessitura histórica tem na Praia de Belas e no water front seu principal mostruário do presente e oportunidades futuras.  Ao longo de sua história e evolução, descortinam-se ações, projetos de urbanização, obras de arquitetura e arte, nas quais o gênio de modernização encobre ânsia de progresso, anseio de espaços modernos e prospecta condição contemporânea, oxalá, sem descontrole urbano.

Estuário, açorianos, planejamento e futuro

Visão panorâmica sobre transformações da Praia de Belas, mesmo superficial, descortina processo que, por menos pré-determinado em projeto autoral perfilhado e mais resultante de somatório de ações coletivas, não esconde o sentido de modernização social nem a imagem de espaço moderno pretendidos pelas lideranças. Desde que com intuito de colonizar o território nacional, o poder central do império intentou o povoamento, trazendo sessenta casais açorianos (2), que acessaram a região pela foz do arroio Dilúvio na extensa baía formada pelo promontório da península e Ponta do Dionísio (3) – a cidade passou a chamar-se Porto dos Casais e o caminho do sul tornou-se estrada, chamada Praia de Belas – o crescimento de importância da cidade-capital a seguir, propiciou, na parte norte, sucessivos aterros para implantação do porto definitivo e acréscimo de alguns quarteirões, cuja ocupação, ao longo do tempo, reforçou a vocação comercial, criando a centralidade da futura região metropolitana e Estado, em razão das funções acumuladas pela cidade-pólo. Não tardou o aparecimento de interesse para ocupação da parte sul, então para produzir áreas habitáveis e bons negócios imobiliários: área de interesse e expansão, área de urbanização e modernização, área de projetos.

Quatro planos: gênese da cidade moderna

O Plano de Melhoramentos (1914), coordenado pelo Eng. Moreira Maciel, previa conquista de terra sobre o estuário e contemplava a orla, na área da Praia de Belas, com traçado de larga avenida-parque, desde a Ponta da Cadeia (4) até a Ponta do Dionísio, formando contorno da cidade junto ao rio, nos lados Oeste e Sul da península e Oeste no desenho da baía. Projetos urbanos do Rio de Janeiro, com aumentos de áreas à custa dos desmontes dos morros Santo Antônio e Castelo, repercutiam por ali, com estratégia de acréscimos de terras, a partir do desmonte do Morro Santa Tereza.

O “Plano Gladosh”, na década de 1940, traçou, para o aterro, projeto de “Bairro Residencial Modelo”, com conjunto expressivo de boulevares arranjados figurativamente, a partir do centro histórico, em pata de ganso axial à Av. Borges de Medeiros. O arruamento intersticial acomodaria a geometria radio-concêntrica, modelando quarteirões de edifícios perimetrais gabaritados à maneira de Haussmann. Na borda do rio, a configuração de parque linear, retificando o water front, gerado pelo aterro proposto, já conceito de área pública ajardinada, como posteriormente se realizou, aqui com traçado acadêmico insinuado. A visão urbana de Gladosh, no entanto, como em suas arquiteturas, ao contrário da idéia de permanência e consolidação da tradição Beaux-Arts, revelava-se moderna no sentido de expansão e substituição, sob a luz da cidade visionária, desenhada segundo imagem repleta de signos da tradição acadêmica e arquitetura expressionista.

Em 1959, no “Plano Paiva” (5), os urbanistas Edvaldo Paiva e Ubatuba de Farias, elaboraram diretrizes urbanísticas e aproveitamento da área, pela primeira vez recomendando aterro mediante dragagem de material do leito do estuário. O traçado mostrava aproximação com ideário moderno, afastamento do xadrez sistemático e continuidade de áreas verdes. Algumas propostas de Paiva e Ubatuba inspiravam-se claramente no Plano Agache para o Rio de Janeiro, como é o caso da “entrada da cidade”, proposta na ponta da península. Neste plano urbanístico, no projeto par um bairro de duzentos mil habitantes, coordenado por Carlos Maximiliano Fayet e no aterro, tabla rasa conquistada ao rio, descortinou-se a matriz genética do Movimento Moderno, desdobrando pequenas unités d´habitation e cidade jardim, em blocos de escala proporcionada à espaços públicos celulares distribuídos em ruas locais, armadas entre as avenidas radiais, na forma de redents. Os bairros de habitação coletiva do Movimento Moderno, como Toulouse le Mirail, particularizaram-se e adequaram-se ao contexto, através de instrução normativa (ato contínuo, validando suas crenças e aposta na nova cidade nova, Fayet, Araújo e Moojen construíram na Praia de Belas,o edifício FAM, pequena unidade habitacional referencia da arquitetura moderna nativa).

Diretrizes consolidadas no I PDDU (1979), plano metropolitano e multidisciplinar, coordenado por Moacyr Moojen Marques, ”descapitalizou” a área do aterro dentre a criação de apreciáveis áreas púbicas projetadas na orla, como os parque Marinha do Brasil, Mauricio Sirotsky Sobrinho e Harmonia e o Centro Administrativo, onde a idéia de planejamento territorial metropolitano e projeto de espaço moderno se encontram.

Mutações, oportunidades, participação e técnica

Em ambiente globalizado, deslocamentos de centros econômicos e novas emergências, a inclusão de Porto Alegre em cenários urbanos que merecem alguma atenção – por um lado pelas experiências vanguardistas de gestão participativa (6), e por outro, pelo redobrada conexão espacial entre a cidade e o estuário (7) - suscita alguma reflexão. Na perspectiva de importantes mutações conseqüentes das macro mudanças mundiais e das transformações urbanas locais, tendo em vista especificamente a Copa do Mundo de 2014 e os jogos olímpicos no Rio de Janeiro, em 2016, projetos, de envergadura expressiva, em marcha, como a renovação do Cais Mauá de Jaime Lerner (Curitiba) e b720 Fermín Vásquez Arquitectos (Barcelona) e o complexo esportivo do Gigante da Beira Rio de Hype Estudio e Santini & Rocha (Porto Alegre), se por um lado evocam júbilo pela oportunidade de prosseguimento do acúmulo de projetos que fazem cidade, sugerem também a retomada de visão técnica prospectiva, planejada no espaço e tempo, cuja ponderação não excludente entre o relativismo da participação popular, a ambigüidade de ações concertadas público-privadas e projetos utópicos autistas, assegure visão disciplinar técnica, desideologizada e ordenada, necessária à construção planejada da Porto Alegre contemporânea e futura. Entendimento sem o qual, os vestígios remanescentes da cidade atual serão tão somente caracteres autônomos em um palimpsesto sem sentido.

nota

NE
Texto publicado originalmente na Revista Palimpsesto, Cátedra Blanca, ESTAB/UPC, Barcelona, dirigida por Carlos Ferrater e Alberto Peñin, com redação e desenho gráfico de Cecília Obiol.

1
ROWE, Collin KOETTER, Fred. Ciudad Collage. Barcelona, Gustavo Gili, 1981.

2
Chegada em novembro de 1752.

3
Local onde estão as instalações do antigo Estaleiro Só, hoje chamado Pontal do Estaleiro.

4
Ponta da cadeia é o nome popular da extremidade da península onde se encontra o centro histórico, ocupada hoje pela Usina do Gasômetro.

5
Plano Diretor de Porto Alegre – Lei n.2046 de 1959, substituída pela Lei n.2330, de 1961. Plano geral de desenvolvimento urbano, coordenado pelo Eng. Edvaldo Pereira Paiva, do qual fizeram parte Roberto Felix Veroneze, Carlos M. Fayet e Moacyr Moojen Marques, entre outros.

6
Com a pioneira implantação do orçamento participativo e a criação do Forum Social Mundial, análogo a Davos, cuja base política corresponde a experiência inicial, em âmbito executivo, das ideologias que ascenderam ao poder federal na última década

7
Tanto pela construção da Fundação Iberê Camargo (1999-2008), de Álvaro Siza, Leão de Ouro da Bienal de Veneza (2002), quanto pelo tombamento (2000) das Tribunas do Jockey Club do Rio Grande do Sul (1951), de Roman Fresnedo Siri, arquiteto uruguaio autor do projeto da  Faculdade de Arquitetura da República Oriental do Uruguai.

sobre o autor

Sergio M. Marques é Professor/ Pesquisador da FA/UFRGS e UniRitter Laureate International Universities, vice-coordendor do Núcleo DOCOMOMO Sul e Integrante MooMAA Arquitetos Associados.

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