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my city ISSN 1982-9922

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português
Os projetos urbanos promovidos hoje pela Prefeitura Municipal de João Pessoa, capital da Paraíba, primam pela falta de transparência em seu desenvolvimento e implantação.

how to quote

COTRIM, Marcio. Urbanismo, (falta de) transparência e poder público. Minha Cidade, São Paulo, ano 15, n. 173.01, Vitruvius, dez. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/15.173/5351>.


Matéria publicada no Correio da Paraíba no dia 16 de julho de 2014 [Correio da Paraíba]


imagem do projeto de reurbanização da lagoa [página da PMJP]

É muito provável que este texto contenha imprecisões, algumas contradições e até mesmo inverdades, no entanto, caso isso ocorra decorrerá da imprecisão, contradição e falta de transparência por parte da prefeitura de João Pessoa no que diz respeito a uma série de obras de suma importância que foram iniciadas pela atual gestão. No lugar de debate, participação popular, informação e transparência, a prefeitura optou por divulgar nas mídias sociais imagens difusas desses projetos, acompanhadas de textos imprecisos e com forte apelo propagandístico. Este modus operandi não se manifesta apenas com relação às obras de vulto, mas como postura generalizada em todas as secretarias desde o início da atual gestão.

Entre as obras que se destacam pelos impactos que terão para a cidade, podemos citar ao menos três(1): a reurbanização da Lagoa Sólon de Lucena; a reforma da orla das praias de Cabo Branco e Tambaú; e a alteração do sistema viário do trecho final, próximo à praia, da Avenida “Beira-rio”.

imagem de divulgação da Prefeitura Municipal de João Pessoa [página oficial da PMJP no facebook]

A orla das praias de Cabo Branco e Tambaú conformam o espaço público por excelência da cidade de João Pessoa. Apesar do abusivo preço do metro quadrado – que impede a maioria da população de residir nestes bairros –, o calçadão, a praia, seus bares, restaurantes e os escassos equipamentos e mobiliários urbanos são usufruídos pelas pessoas durante toda a semana, sobretudo antes e depois do horário de trabalho e durante todo o dia nos finais de semana. Este uso intensivo converte a orla (Cabo Branco/Tambaú) em uma das zonas mais importantes da cidade, carregada de vitalidade urbana na medida em que atende a diversos extratos da sociedade.

As intenções da prefeitura para esta parte da cidade foram evidenciadas logo nos primeiros 100 dias da atual gestão. No lugar de trocar o piso da calçada principal, claramente inadequado e totalmente deteriorado, optou por recapear – sem que houvesse necessidade – o asfalto de toda a avenida paralela à praia. Nos últimos 2 meses a prefeitura iniciou a recuperação e padronização das calçadas de ambos os lados da avenida, o que deve ter exigido a elaboração de um projeto rigoroso e até certo ponto complexo que deverá dar conta da: relocação de jardins, definição de zonas de mobiliário e equipamentos urbanos, redimensionamento das calçadas, reorganização de vagas de automóveis e ciclovias, e acessibilidade entre inúmeros outros aspectos. No entanto, e pese a importância da obra, nenhuma informação relevante consta no site da prefeitura sobre o projeto, nem mesmo no Portal da Transparência João Pessoa (2). Apenas algumas inconsistentes e de baixíssima qualidade perspectivas eletrônicas são encontradas na Internet.

Imagem que ilustra a notícia sobre "revitalização de calçadas de Tambaú e Cabo Branco" publicada em 22 de maio de 2014 [página da PMJP]

A mesma falta de informação ocorre com as obras já iniciadas que alterarão o sistema viário do trecho final, próximo à praia, da Avenida “Beira-rio”. Neste caso, a única informação disponível é uma animação que pouco revela. O IAB-PB, por meio de uma Nota Técnica(3) dirigida à prefeitura municipal de João Pessoa, indicou uma série de problemas com relação ao que é possível extrair de informação da animação feita a partir de um suposto projeto. Em termos gerais a nota do IAB-PB alerta a prefeitura para problemas: de ordem ambiental, como, por exemplo, a eliminação de árvores adultas; com relação ao perigo no incremento dos congestionamentos, já que a animação divulgada indica a construção de uma terceira faixa no sentido centro/praia, o que levaria a um aumento de fluxo e concentração de automóveis imediatamente antes de uma rotatória; e finalmente, com relação ao aparente descaso do projeto com os pedestres, ciclistas e usuários de transporte público.


Vídeo divulgado pela Prefeitura Municipal de João Pessoa
Portal da Transparência João Pessoa

A Nota Técnica do IAB-PB rendeu uma matéria no Correio da Paraíba, publicada no dia 16 de julho de 2014. Segundo a matéria, o ex-secretário de planejamento Rômulo Polari (na ocasião ainda no cargo)(4) dizia não ter conhecimento sobre o conteúdo da nota e por isso não iria comentar o assunto(5). O projeto atualmente segue sendo construído.

Matéria publicada no Correio da Paraíba no dia 16 de julho de 2014 [Correio da Paraíba]

O caso da Lagoa Sólon de Lucena é ainda mais grave devido ao fato de ser uma área resultante de projetos e intervenções de profissionais do calibre de Saturnino de Brito, Nestor Figueiredo, Clodoaldo Gouveia e Burle Marx, iniciadas ainda na década de 1920 que permitiram a expansão da cidade em direção à praia. Além do seu valor histórico, paisagístico e urbanístico, a Lagoa e seu entorno poderão assumir, em decorrência de uma eventual reurbanização, um papel fundamental para a melhoria das condições do centro da cidade e até mesmo para a interrupção do seu contínuo processo de deterioração.

A proposta da prefeitura de eliminar o anel viário interno, convertendo a área ao redor da lagoa de fato em um parque é em princípio boa, no entanto acarretará profundas alterações no conturbado sistema viário do centro da cidade, exigindo, portanto um projeto mais amplo e integrado. Evidentemente neste caso um concurso nacional de projetos seria a solução mais adequada, permitindo que um projeto de tal envergadura e relevância fosse discutindo com o devido tempo, atenção e competência. Contudo, a prefeitura parece ir em direção contrária a este raciocínio e as obras de dragagem da Lagoa já foram iniciadas e já correm pelas redes sociais imagens derivadas de um possível projeto já elaborado, mas que não tem sequer aprovação do órgão de preservação.

imagem do projeto de reurbanização da lagoa [página da PMJP]

imagem do projeto de reurbanização da lagoa [página da PMJP]

Como consequência da ausência de informações gráficas sobre o projeto, a prefeitura recorre a textos no seu site que tentam explicá-lo. Referindo-se à segunda etapa da obra, que seguiria a dragagem da lagoa, o texto do site indica:

"Segunda fase

Recuperação e expansão das condições naturais do parque Sólon de Lucena tornando-o uma aprazível área de lazer, esporte, diversão, arte e cultura;

Recuperação, expansão e melhoria do paisagismo do parque Sólon de Lucena mantendo as suas características originais;

Reurbanização do parque Sólon de Lucena com grandes extensões de gramados, jardins, implantação de novas árvores e calçadas de passeio público;

Criação de novas opções de esportes, lazer, arte e cultura no parque Sólon e Lucena".(6)

O cúmulo da gratuidade se dá na explicação da terceira e última etapa:

"Terceira fase

Consolidação do parque Sólon de Lucena como um equipamento social, cultural e turístico de grande expressão estadual, regional e nacional;

Implantação de memorais dos grandes vultos e intelectuais paraibanos (Pedro Américo, Augusto dos Anjos, Epitácio pessoa, José Américo, Maestro José Siqueira, José Lins do Rego, Celso Furtado, Jackson do Pandeiro, Sivuca)".(7)

[página oficial da PMJP no Facebook]

Nas últimas semanas o deslizamento de parte da falésia da Ponta do Cabo Branco levou a prefeitura a interditar definitivamente para automóveis o trecho mais próximo da avenida que liga a praia do Cabo Branco ao Estação Ciência, edifício de uso cultural projetado por Oscar Niemeyer. Como reação imediata e ilustrando com clareza o “planejamento de emergência” praticado pela secretaria responsável, uma propaganda passou a ocupar as redes sociais mostrando a área ocupada por pessoas fazendo esportes e atividades de lazer sob a palavra “renaturalizar”. Outro projeto apressado, com pouco estudo e sem qualquer tipo de debate deve ter sido realizado, pois menos de três dias depois uma série de obras foi iniciada alterando de forma abrupta todo o sistema viário da região. Uma audiência pública, nitidamente pró-forma, foi realizada garantindo a legitimidade da ação. A pressa parece ser motivada pela proximidade do verão, quando hordas de turistas invadem a região e as águas do mar que banham a cidade ficam cristalinas. Talvez esse seja o verdadeiro e único motivo pelo qual, segundo sua prefeitura, a cidade é a capital da transparência.

Imagem de divulgação da Prefeitura Municipal de João Pessoa [página oficial da PMJP no Facebook]

notas

1
Outras ainda poderiam ser citadas: aquelas ligadas ao PAC Cidades Históricas, ao PAC Mobilidade, a reurbanização da comunidade do São Jose e a intervenção no Porto do Capim.

2
acesse o portal Trasnparência João Pessoa aqui 

3
Leia Nota Técnica na integra aqui

4
Durante a elaboração deste texto a prefeitura noticiou o afastamento do secretário de planejamento Rômulo Polari, ex-reitor da UFPB.

5
No mesmo dia da publicação, como consta no site do IAB-PB, membros do Instituto foram atendidos pelo secretário municipal de infraestrutura Cássio Andrade.

6
Portal Transparência João Pessoa

7
Portal Transparência João Pessoa 

sobre o autor

Marcio Cotrim é arquiteto e urbanista, professor adjunto da graduação e da pós-graduação da UFPB, membro pesquisador do Laboratório de Pesquisa Projeto e Memória (www.lppm.com.br) e um dos editores da sessão espanhola do portal Vitruvius.

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