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architectourism ISSN 1982-9930


abstracts

português
O arquiteto do Iphan, inventor das "victorfotogravuras", nos apresenta as Viagens de um turista aprendiz, que se beneficia da herança dos intelectuais que constituíram o serviço do patrimônio histórico no Brasil

english
The architect of Iphan, inventor of the "victorfotogravuras", introduces us to the trips of an amateur tourist that enjoys the inheritance of intellectuals that contributed to the Brazilian historical heritage service

español
El arquitecto del Iphan, inventor de las "victorfotogravuras", nos presenta los viajes de un turista aprendiz, que se beneficia de la herencia de los intelectuales que constituyeron el servicio de patrimonio histórico de Brasil


how to quote

MORI, Victor Hugo. Viagens de um turista aprendiz. Arquiteturismo, São Paulo, ano 01, n. 010.03, Vitruvius, dez. 2007 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/01.010/1385>.


O IPHAN foi fundado por turistas?

Uma pergunta bem humorada merece uma resposta à altura. Foi. Pelo menos a gênese do conceito de patrimônio que depois se consagrou no anteprojeto do Mario de Andrade para a criação do IPHAN parece que surgiu na famosa viagem dos modernistas a Minas Gerais em 1924, segundo nos relata o Carlos Augusto Calil e a Aracy Amaral. O trabalho precursor sobre o estudo do patrimônio imaterial do nordeste e a diversidade cultural expressa nas músicas, danças, artefatos, arquitetura, crenças, etc., também surgiu na viagem de pesquisa de um grupo de “turistas aprendizes” lideradas pelo arquiteto Luís Saia sob a coordenação do Mário de Andrade. Hoje, várias ações do IPHAN têm o turismo como uma das alternativas de sustentabilidade econômica, e difusão e valorização por meio da apropriação social dos monumentos. Os Roteiros da Imigração (SC), o programa da Estrada Real (MG, RJ, SP), o Roteiro das Tropas (RGS, SC, PR, SP), o estudo do Programa Monumenta para a criação de Pousadas Históricas são exemplo das ações em andamento. Nós que “vestimos a camisa” do IPHAN herdamos dos seus fundadores o costume maravilhoso de fazer de cada vistoria uma “viagem de turista aprendiz”.

No seu trabalho, é preciso ser aventureiro?

É preciso um espírito de curiosidade e de investigação do desconhecido para quase todas as profissões. É necessário saber ver o Patrimônio que subsiste em qualquer artefato ou lugar. Na capelinha de pau-a-pique de beira de estrada até em Alhambra na Espanha. Por isso sempre ando com uma máquina fotográfica. Outro dia fui a uma audiência na Justiça Federal na Av. Paulista. Pela fresta da janela avistei o belvedere e o MASP e fotografei escondido a vista espetacular.

É incompatível viajar e conservar o patrimônio?

O turismo sempre foi importante para a sustentabilidade do patrimônio, mas como todo bom remédio, uma overdose pode matar o paciente. Independente da atribuição do valor cultural, o monumento deve servir prioritariamente aos moradores locais. Não se pode transformar o lugar de todos em lugar dos outros, como ocorreu nas antigas vilas de pescadores Porto Fino na Ligúria e Parati no Rio de Janeiro, ou na Igreja de São Marcos em Veneza.

Como foi a invenção da “victorfotogravura”?

A minha amizade com um dos entrevistadores, Michel Gorski, nascida há mais de 30 anos no compus do Mackenzie, sempre foi permeada pelo humor. A denominação é muito engraçada e portanto adorei. Eu sou um photoshop-maníaco como o meu colega do IPHAN Mauro Bondi e também um maníaco por viagens. Gosto da brincadeira: 90% do que ganhei na vida gastei com viagens (bebida, comida, passeios, hospedagem); o resto desperdicei. As montagens fotográficas ou redesenhos das fotografias juntaram as minhas duas manias. Enquando a maioria dos que adoram brincar com photoshop inventam coisas irreais, colocando cabeça de galinha em urso polar, eu gosto de mostrar em imagem aquilo que é próprio do movimento da câmera de vídeo. Tentar mostrar em uma única imagem tudo o que uma câmera em movimento consegue captar da arquitetura ou paisagem e não cabe em um único fotograma ou no campo de visão humana. É sempre uma mentira, mas que permite uma visão total da essência da arquitetura ou do espaço.

Sou um péssimo fotógrafo. Uso uma máquina digital amadora minúscula de “turista aprendiz”, mas de alta resolução. Não tenho lentes especiais nem grande angular. A mágica acontece no computador. Fui perspectivista profissional e isto é fundamental. Serve para mostrar a fachada da Igreja de Gesù (1) interinha com os prédios ao lado apesar do estreiro largo na frente ou a monumental Fontana de Trevi em Roma (2); a fachada inteira da Estação de Luz com 150 metros ou panorâmicas horizontais da cidade de São Paulo (3) ou de Nova York (4). Nunca fiz uso de tripés ou equipamentos auxiliares, é tudo improvisação de turista. Só no caso da Estação da Luz é que usei o recurso emprestado do travelling cinematográfico, fotografando da janela do carro mais ou menos a cada dez ou quinze metros. As imagens de interior de edifícios são também sofisticadas, pois permitem ver quase integralmente os espaços, como o monumental forro pintado (5) por Jesuíno na Igreja do Carmo sem os obstáculos dos lustres ou os limites do campo de visão, ou as talhas e pinturas da Igreja de Nossa Senhora do Ó em Sabará ou o escritório completo do arquiteto Oscar Niemeyer na Avenida Atlântica no Rio.

Quais os sítios tombados mais bonitos do Brasil?

Gosto do cenário natural que emoldura a cidade do Rio de Janeiro (montanhas e mar) com o ponto de ênfase no Cristo Redentor. Até as impropriedades feitas pelo homem parecem insignificantes diante da escala monumental desta paisagem excepcional. A visão de Diamantina esparramada na Serra do Espinhaço é também indescritível. Em São Paulo acho o Sítio Santo Antônio com a casa-grande bandeirista (6) e a capela seiscentista refletidas na represa a mais bela expressão da estética modernista nos nossos monumentos do passado. É o reflexo do próprio IPHAN nos primeiros anos no embate constante entre o passado e o modernismo – a premonição involuntária da casa-grande do Alvorada em Brasília. O Brasil não usa bem economicamente seu patrimônio, mas o Ministério da Cultura tem se esforçado neste sentido. Foi necessário criar metodologias para se dimensionar o papel da cultura na economia do país, para avaliar, criar e fomentar políticas públicas. A Educação Patrimonial é a chave para se iniciar um processo de conscientização, criar relações simbólicas e afetivas com a arquitetura, espaços, paisagens e assim, formar novos “turistas aprendizes”.

Como é conhecer o país com a missão de conservar seu patrimônio?

Como arquiteto é puro prazer e eles ainda me pagam (pouco, mas pagam). Tem partes detestáveis como burocracias, ações judiciais, administração contábil, mas o trabalho técnico compensa os dissabores. Pensem nas novas formas de atuação do Patrimônio hoje: o acarajé, as panelas de barro que fazem a moqueca capixaba, o queijo do Serro e da Serra da Canastra, o frevo, o samba e até o falafel do Bom Retiro.

E o prazer estético de descobrir os mais antigos desenhos maneirista em vermelho sangue do século XVII, ocultos pelos retábulos na capela jesuítica de São Miguel, de ser um dos primeiros a contemplar as pinturas do Padre Jesuíno ocultas no forro da Igreja do Carmo em São Paulo, de ver as primeiras cavas de mineiração do Brasil no Jaraguá. Somos turistas privilegiados.

Quais os bons exemplos de preservação no exterior?

Até os anos 1960 a França era ainda a principal influência na política nacional de preservação. Na década seguinte o eixo direcionou-se para a Itália. O Plano de Preservação de Bolonha coordenado por Pier Luigi Cervellatti e o Plano de Urbino de Giancarlo de Carlo tornaram-se referências para nós. Pensar a preservação não mais do monumento isolado mas dentro do planejamento territorial foi a grande contribuição destes projetos. No Japão a prática cultural milenar de destruir e reconstruir os monumentos tradicionais como conservação do saber fazer e representação simbólica da importância do passado no presente colocou em cheque o conceito de autenticidade e originalidade ocidental – base onde se assentavam os conceitos de restauro e valor cultural. A Carta de Nara de 1994 firmou um novo conceito: a autenticidade e originalidade são variáveis culturais. O campanário da Piazza San Marco em Veneza reedificado integralmente no início do século XX e a reconstrução do Pavilhão de Barcelona de Mies Van der Rohe não deveriam mais ser tratados pelos críticos como simulacros arquitetônicos. Seriam obras de arte recriadas?

Qual a relação entre a visita ao sítio e a pesquisa de gabinete?

Todo documento dito histórico é suspeito. Não se trata de falsificação, mas da possibilidade de não reproduzir os fatos reais. Nós arquitetos sabemos que na grande maioria dos casos, os desenhos do projeto não correspondem integralmente à maquete e tanto um quanto outro são diferentes da obra executada. A “victorfotogravura” é outro exemplo não confiável da realidade, pois em cada fotograma a perspectiva foi destruída para se incorporar a novos pontos de fuga da imagem global redesenhada.

A arquitetura possui quatro dimensões – as três, que definem a forma e o espaço, e a quarta dimensão que é relativa ao tempo. Ao tempo está associado o percurso do observador e suas infinitas perspectivas – a fruição da obra de arte; e também o tempo histórico em cuja trajetória a obra de arte se formou. Não apreende uma obra arquitetônica pela maquete ou pelos desenhos. É só na fruição direta dos espaços.

notas

1
A principal Igreja Jesuítica de Roma é Gesù, projetada por Vignola e Giacomo Della Porta. Foi o modelo de igreja adotado pelos jesuítas no Brasil. Em função do pequeno largo fronteiro só é possível captar todas as linhas precisas e volutas desenhadas por Della Porta com lentes especiais que distorcem o desenho maneirista. Foram necessários cerca de dez fotogramas para representar o rigor da arquitetura de Gesù.

 

2
Dezenas de fotos foram necessárias para mostrar a partir do nível do pedestre neste pequeno largo de Roma a visão geral do ambiente e da Fontana de Trevi projetada por Nicola Salvi.

 

3
A vista do Vale do Anhangabaú com alta concentração de monumentos tombados era irresistível: Edifício Matarazzo (Prefeitura), Viaduto do Chá, antiga Light, antigo Mappin e o Teatro Municipal.

 

4
A primeira vez que subi ao topo do Empire States Building em Nova York há mais de uma década foi com os amigos arquitetos Mauro Bondi e Carlos Lemos em um dia de péssima visibilidade. Não foi possível identificar sequer os edifícios que estavam no segundo plano de visão. Em 2005 retornei ao mirante em um dia com visibilidade excepcional. Bati uma seqüência de fotos a partir das três faces do terraço quadrangular do Empire States, e em dois níveis de altura (linha do horizonte e linha inferior dos prédios abaixo em primeiro plano).

 

5
Pesquisas recentes do IPHAN mostram o fundo de toda a composição com um céu vermelho e a Virgem do Carmo original sob a pintura atual, tudo de autoria do Padre Jesuíno. Foram necessários cerca de trinta fotos para se ter a visão plana da pintura integral do teto da nave e outra tantas oblíquas para “fazer desaparecer” os pesados lustres.

 

6
A Casa Bandeirista com capela anexa do Sítio Santo Antônio em São Roque é um dos mais belos monumentos de São Paulo. O projeto de restauro do arquiteto Luís Saia – a mais bela intervenção do arquiteto, na minha opinião –, que incluí a recomposição da mata do entorno (era área de agricultura), a complementação da casa-grande, o imenso gramado fronteiro, a criação do lago defronte, é segundo me transmitiu o Prof. Paulo Mendes da Rocha “uma obra de arte acabada. Nada mais deveria ser acrescentado ou retirado”.

sobre o entrevistado

Victor Hugo Mori, arquiteto (Mackenzie, 1975), foi Chefe de Restauro e Diretor Técnico do Condephaat (1983-1987). Ingressou nos quadros do Iphan em 1987. Coordenador da Comissão de Patrimônio Histórico do IAB e Conselheiro do Condephaat e Conpresp. É Conselheiro do Condepasa; Superintendente Regional do Iphan-SP, membro do Icomos e professor-convidado nos Cursos de Especialização em Restauro na Pós-graduação na Unisantos e na Unicsul. Autor de “Arquitetura Militar: um panorama histórico a partir do Porto de Santos” (Imesp-Funceb, 2003) e organizador de “Patrimônio: atualizando o debate” (Iphan-Dersa, 2006).

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010.03 Entrevista
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