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architectourism ISSN 1982-9930

Crepúsculo em São Paulo. Foto Abilio Guerra

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Laura Belik comenta como poderia ser seguido nos dias atuais, em plena pandemia do coronavírus, os princípios do Jane’s Walk, movimento mundial em homenagem a Jane Jacobs e que defende a experiência corporal na cidade.


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BELIK, Laura. Jane’s Walk em casa. Morte e vida de grandes cidades na pandemia. Arquiteturismo, São Paulo, ano 14, n. 157.05, Vitruvius, abr. 2020 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/14.157/7726>.


Há alguns anos faço parte de um movimento mundial chamado Jane’s Walk (1), em homenagem à jornalista e ativista Jane Jacobs (2), famosa por seu livro Morte e vida de grandes cidades publicado em 1961 (3) e por suas batalhas por uma visão mais humanista dos espaços em que vivemos. Seguindo os ensinamentos de Jacobs, a iniciativa do Jane’s Walk busca com que as pessoas se conectem e entendam melhor suas cidades. Para isso, todo primeiro final de semana de maio o projeto promove passeios guiados por diferentes bairros do mundo, encorajando um contato mais próximo com a história, as pessoas e o cotidiano desses espaços.

Jane Jacobs apresentando documentos como evidência em coletiva de imprensa, 1961
Foto Phil Stanziola [Library of Congress]

Neste primeiro final de semana de maio de 2020, sentada na minha sala, escrevo estas palavras de incentivo para que explorem e caminhem pela cidade (em breve ou agora – virtualmente). A última vez que eu saí para “bater perna”, foi para buscar um lanchinho na cozinha. A atual nem-tão-vibrante vida do meu bairro em São Paulo se resume a um pulo no supermercado ou na farmácia. Com sorte, posso andar até esses polos de “comercio essencial”. Meus vizinhos continuam se ignorando. Agora somos mais tóxicos, parece. Além disso, não sei quais deles bateram panela ontem à noite, então é melhor não arriscar. A situação só melhora um pouco se alguém tem um cachorro ou um bebê para incentivar algum tipo de interação ou sorriso.

Meus problemas pífios e mundanos, porém, remetem a uma discussão maior. Como sabemos, “ficar em casa” é um privilégio que nem todos têm. Morar em um bairro bem servido do “comercio essencial” também não é tão comum quanto deveria. Quem caminha pela cidade hoje, é porque precisa. O não-caminhar ganhou status e distinção, e a cidade para estes, é entendida pela vizinhança a sua volta. Questões ligadas ao privilégio (e suas contradições) da escala local nas grandes cidades trazem à tona reflexões sobre as celebrações deste final de semana.

Plano de Robert Moses para construção de avenidas cruzando no meio de Washington Square Park nos anos 1950 [Washington Square Park / Department of Parks & Recreation / City of New York]

No final dos anos 1950 Jane Jacobs tornou-se um ícone no seu bairro Greenwich Village, em Nova York, justamente por olhar para seu entorno e incentivar o uso dos espaços urbanos na escala local. Por um lado, ela promovia importantes discussões para a época, momento em que a suburbanização estava em alta e grandes projetos de infraestrutura ameaçavam o que ainda restava da vida no centro. Por outro, seu status e posição social deixaram claro que a luta de Jacobs não necessariamente representava problemas enfrentados pela maioria da população.

Popularmente romantizada como a grande inimiga de Robert Moses, Jacobs até hoje é celebrada por protestar em favor da permanência e não demolição de locais de grande visibilidade, caso da Washington Square Park e da Penn Station.

Robert Moses, conhecido como o Master Builder (grande construtor) de Nova York, quando visto através das lentes de Jacobs e seus seguidores, é entendido como uma grande ameaça à cidade tradicional. A extensa carreira de Moses nos Estados Unidos em muito se compara às transformações estruturais realizadas por Barão Haussmann no século anterior, com as Reformas de Paris (1853). Promovendo o chamado “urbanismo tábula rasa”, Moses incentivava o uso dos carros e vida nos subúrbios, frequentemente destruindo a malha urbana (e vida) existente para dar espaço a uma melhor circulação e implementação de seus projetos. Apesar de muito criticado pelo seu radicalismo em prol do que era entendido como “progresso” moderno, Moses também promoveu importantes obras populares na zona metropolitana de Nova York, principalmente durante seu período como Park’s Comissioner (1934-1960). Moses implementou redes de piscinas públicas, parquinhos infantis, infraestrutura em praias regionais, além de parques e quadras esportivas para população em geral. Justamente por sua visão abrangente, Moses foi um dos primeiros técnicos a considerar um urbanismo regional, e desenvolvimento de Nova York como um todo – o que depois também é alvo de críticas, como as feitas por Jane Jacobs (4).

Mapa das obras realizadas por Robert Moses em Nova York [CHRISTIN, Pierre; BALEZ Olivier. Robert Moses (op. cit.)]

A batalha de escalas travada entre Jacobs e Moses tem contradições de ambas as partes. Usar o termo “acesso”, apresenta até hoje diversas interpretações, sendo muito limitado. De qualquer forma, a tendência do planejamento urbano atual segue moldes mais próximos dos ensinamentos de Jacobs. É importante entendermos as necessidades de cada parte da cidade separadamente. Voltamos a escala das subprefeituras, dos bairros. E com isso enfrentamos também novos desafios. A infraestrutura provida para cada bairro não é coesa, mas sim desigual, como apontado anteriormente. Além disso, ainda sim existe uma rede de interações e dependência entre bairros caracterizando a região como um todo. Protestar pela vida e morte de Greenwich Village não é um protesto na escala da cidade.

Praça Winston Churchill, esquina da 6th Avenue com Downing Street, Greenwich Village, Manhattan
Foto Tdorante10 [Wikimedia Commons]

O incentivo pelo caminhar e explorar da cidade neste primeiro final de semana de maio, assim como a atual reestruturação de nossas vidas tentando promover o isolamento social, deve ser feito de uma maneira diferente. Se você é alguém que tem o privilégio do “não caminhar”, do “ficar em casa”, aproveite para tentar conhecer melhor a realidade do próximo. A vida na cidade não é feita só pelo marasmo da sua (e minha) vizinhança. O objetivo de iniciativas como o Jane’s Walk varia de acordo com o tema escolhido por cada guia. Independentemente, todos passeios seguem o mesmo princípio: “criar um local para que as pessoas observem, reflitam, compartilhem, questionem e (re)imaginem os espaços em que vivemos” (5). Esse ano vamos tentar caminhar mais longe, mesmo sem sair do nosso sofá.

notas

1
Ver: Jane’s Walk (website official) <http://janeswalk.org>. Ver também artigo sobre o tour promovido em 2011 por Abilio Guerra, Luís Antônio Jorge e Laura Belik: GUERRA, Abilio; JORGE, Luís Antônio; BELIK, Laura. Passeio pelo centro de São Paulo. Visita guiada a pé e de metrô. Minha Cidade, São Paulo, ano 12, n. 133.02, Vitruvius, ago. 2011 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/12.133/3998>.

2
Ver: Citizen Jane: Battle for the City, filme documentário, direção de Matt Tyrnauer. EUA, 2016. 92 min.

3
JACOBS, Jane. The Death and Life of Great American Cities. New York, Vintage Books, 1961.

4
Sobre Robert Moses, ver: BERMAN, Marshall. All that is Solid Melts into Air: The experience of Modernity. New York, Simon and Schuster, 1982; CARO, Robert A. The Power Broker: Robert Moses and the Fall of New York. New York, Vintage Books, 1975; CHRISTIN, Pierre; BALEZ Olivier. Robert Moses: The Master Builder of New York City. London, Nobrow, 2014.

5
No original: “to make space for people to observe, reflect, share, question and re-imagine the places in which they live, work and play”. Jane’s Walk (website official). About us <https://janeswalk.org/about>.

sobre a autora

Laura Belik é doutoranda em Arquitetura na University of California, Berkeley, Mestre em Design Studies pela Parsons – The New School (Nova York, 2016), e formada como arquiteta e urbanista na Escola da Cidade (São Paulo, 2013).

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