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architexts ISSN 1809-6298


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TEIXEIRA, Carlos M. O capim. Arquitextos, São Paulo, ano 01, n. 007.10, Vitruvius, dez. 2000 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.007/950>.

AurélioCapim, designação genérica das gramíneas silvestres, é palavra de origem tupi (ka+píi, ou "folha delgada"). São eles vários: capim barba-de-bode, capim-açu, capim-agreste, capim-amonjeaba, capim-amargoso, capim-azul, capim-balça, capim-bambu, capimpuba, capim-bobó, capim-branco, capim-catingueiro, capim-cheiroso, capim-de-burro, capim-de-cheiro, capim-do-pará, capim-elefante, capim-flecha, capim-gordura, capim-guiné, capim-jaraguá, capim-limão, capim-marmelada, capim-membeca, capim-mimoso, capim-sapé, capim-trapoeraba, etc. A maioria dessas espécies tem a inflorescência em espigas, as folhas lineares, agudas e recurvadas, e a haste filiforme. Quase todas são originárias das Américas ou da Ásia.

PeriplanetasOs capins são indesejados, invasores, forrageiros e cosmopolitas, e provavelmente constituem a maior parte da área verde das cidades brasileiras. São arrancados por jardineiros, coletados por lixeiros, queimados por incendiários e odiados por paisagistas.

HumanizadoresA vontade idealizada pelos arquitetos raramente se torna realidade. A ordem sempre é negada por acidentes e acasos que fogem do controle dos planejadores. "Puxados", infiltrações, atalhos, subversões de uso etc. pavimentam o caminho das coisas involuntárias, sendo elas nem sempre prejudiciais ao projeto. Estas são as coisas que nos falam sobre o "crescimento" de um edifício ou de um desenho urbano, e sobretudo das coisas que acontecem após a fase de implementação. Um projeto, entretanto, sempre será artificial. Ele não nasce, ele é concebido por um indivíduo. Talvez aceitar o caráter inorgânico da arquitetura seja o mesmo que aceitar a colaboração das coisas orgânicas, tomando partido do que é inesperado, do que é discutível ou do que é perigoso. Na contramão de todas as apologias do determinado e do previsível, poderíamos aceitar um espaço urbano ou um edifício assim como ele está, para depois perguntar, parafraseando Kahn, "o que ele quer ser". Patrocinando sua evolução, testando sua adaptabilidade e incentivando sua abertura.

RuínasQualquer ruína é mais misteriosa que um edifício bem conservado, assim como determinadas arquiteturas ficam bem melhor depois de solapadas pela condição de construção que não merecia persistir. Os capins, juntamente com o desgaste dos pisos, os muros envelhecidos, as paredes com tons já esmaecidos, a ferrugem e demais resquícios da passagem do tempo são marcas que podem enriquecer e humanizar mesmo a mais desumana das arquiteturas, mesmo a mais inóspita das cidades. Dificilmente um projeto leva em consideração o que o tempo pode trazer de bom para ele, e é exatamente por isso que os arquitetos preferem fotografar seus edifícios quando recém-inaugurados, de preferência sem a presença de qualquer ser humano.

CinzaOs capins são o verde, mas um verde considerado ainda mais cinza que o asfalto. São tidos como (e realmente são) uma erva ainda mais daninha do que qualquer processo de urbanização descontrolada. Anti-estéticos, transformam toda paisagem árida das calçadas e lotes desmatados em uma única e uniforme espécie de pasto urbano sem utilidade, mas certamente menos agressiva. Insistentes, voltam a atacar em todos os canteiros não muito bem mantidos, não importando qual espécie ali estava anteriormente.

DefaultOs capins são as áreas verdes que se tornaram verdes por default. Eles são de fácil remoção, nascem em qualquer solo (ou mesmo sobre o "cimentado") e dispensam qualquer tipo de manutenção. Entretanto, é importante notar que, apesar de atuarem por default em qualquer lugar, os capins formavam a mata nativa da região de várias cidades. Brasília, Belo Horizonte, Ribeirão Preto e Corumbá, por exemplo, foram construídas sobre capins (antes entremeados por umas poucas árvores de tronco retorcido).

ImprevisíveisColaborando para a idéia de lugares "espontâneos" e contrariando a utilização induzida dos espaços; oferecendo liberdade de uso e patrocinando a mudança, os capins são as áreas não-produtivas da cidade que teimam contra sua domesticação, apesar de, paradoxalmente, sempre estarem abertos à idéia de espaço "eficiente".

DadosNa taxa de área verde por habitante das secretarias do meio-ambiente, os capins não são computados, fato que deturpa a taxa real e acentua ainda mais o déficit de verde urbano por habitante. Na verdade, as cidades não são tão cinzas como nos fazem crer as estatísticas. A quantidade de oxigênio liberada por 10 touceiras de capim-gordura pode ser comparada à de um ipê amarelo, por exemplo. Dado que eles representam (especulativamente) 40% da clorofila urbana, então eles produzem 40% do oxigênio do verde urbano, o que é uma percentagem nada desprezível. Devemos a qualidade de nosso micro clima urbano, feliz ou infelizmente, aos capins.

PecuáriaAlhures, servem de alimento para os mamíferos herbívoras e onívoros, para insetos e aves. Não precisam nem de muito sol nem de muita sombra, nem de muita terra nem de muita água, e convivem bem com qualquer outra espécie vegetal. São largamente utilizados como alimento para os bovinos, mas estes requerem uma densidade media de 1.000 m2/rés, taxa esta de baixíssima densidade e aquém de qualquer parâmetro de ocupação urbana. Na verdade, apesar de muito cultivado no campo, o capim é sempre evitado nas cidades.

Naturezas mortasOs capins estão nas áreas públicas residuais - lugares que funcionam como compensações para um crescimento urbano descontrolado -, ficando abandonados à deriva, à dinâmica da "natureza urbana" depois de intervenções radicais como viadutos, trevos e pontes.

EntropiaSegundo a lei da termodinâmica, qualquer sistema isolado tende a deslizar para um estado de crescente desordem – e nunca para o estado de ordem. Divida uma piscina ao meio com alguma barreira, encha uma metade com água e a outra com tinta, retire a barreira e, pelo movimento aleatório que sucederá, tinta e água acabarão por se misturar. A mistura nunca volta atrás, água e tinta para sempre permanecerão misturadas. Conhecido por entropia, esse conceito é a principal característica dos capins. Ele enxerga a desorganização como uma tendência inequívoca de um sistema: o abandono da infra-estrutura urbana dá vez à entropia, ou seja, a manutenção e a ordem podem ser vistas como reações contra a entropia latente das coisas.

Menos é maisApesar disso, alguns abandonos podem ser incorporados pelo projeto. Um paisagismo que incorpora o capim é aquele que privilegia um encontro direto entre os usuários e a natureza. Um encontro que não procura uma disposição arcadiana das plantas, como nos jardins onde não podemos caminhar ou tocar as plantas, mas sim a disposição com algo a menos: menos barreiras, menos perfeições, menos manutenção, menos composições, menos desenho – e talvez mais abandono.

sobre o autor

Carlos M Teixeira é arquiteto em Belo Horizonte e autor do livro "Em obras: história do vazio em Belo Horizonte". Atualmente participa do curso de "Paisagismo Urbano" na Architectural Association em Londres com a Bolsa Virtuose do Mnistério da da Cultura brasileiro.

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