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architexts ISSN 1809-6298


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Diante do processo eleitoral em curso, aonde mais uma vez temos a cidade emporcalhada pela propaganda, o autor faz considerações de eventuais papéis possíveis para o arquiteto


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RODRIGUES, Lessandro Lessa. O processo eleitoral, a cidade e o arquiteto-urbanista. Arquitextos, São Paulo, ano 05, n. 052.07, Vitruvius, set. 2004 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.052/551>.

Começou mais um processo eleitoral em nosso país. No próximo mês de outubro estarão sendo eleitos novos representantes para os poderes executivo e legislativo dos municípios brasileiros. Cabe, no entanto, duas questões: o que esta eleição significa para as cidades brasileiras? Qual o papel do arquiteto-urbanista neste processo de escolha?

Para estas perguntas muitas respostas podem ser dadas.

É fato que as eleições municipais e seus resultados poderão trazer muitos benefícios para as cidades. Em última análise, o processo eleitoral local, por si só, já é um grande ganho para os municípios. Isto pelo simples fato de neste período as pessoas, em um plano mais geral, e os candidatos, mais especificamente, investirem tempo e energia na discussão dos problemas urbanos e suas possíveis soluções.

Candidatos e eleitores param e refletem sobre o futuro das localidades onde vivem. Como parte deste universo de cidadãos, arquitetos e urbanistas, têm a oportunidade de apresentar seu entendimento sobre as cidades em que moram e suas propostas para o futuro das mesmas. É deste pensar, imaginar, debater e sonhar que podem surgir alternativas para os problemas locais. Ao mesmo tempo, é neste processo que arquitetos e urbanistas podem se apresentar para a sociedade como portadores de conhecimentos essenciais para o desenvolvimento das cidades.

As discussões eleitorais deste ano passarão, necessariamente, por algumas questões de cunho nacional, dentre elas pode-se destacar o problema do desemprego, o aumento dos índices de violência, a necessidade de se ofertar educação de qualidade aos munícipes e a organização da oferta de saúde aos moradores das cidades. É interessante analisar que neste tempo de globalização até os problemas urbanos ficaram pasteurizados e as dificuldades encontradas em Betim não são muito diferentes das de Diadema, como exemplo. Mas, mesmo com grande parte dos problemas sendo globais, as soluções, na maior parte das vezes, surgem da criatividade do administrador, dos profissionais e da população local.

Outro ponto importante a ser considerado é que os grandes temas nacionais a serem debatidos nesta próxima eleição devem aparecer, em muitos casos, como pano de fundo para uma discussão mais localizada e de proximidade maior com o eleitorado. Nestes casos arquitetos e urbanistas devem ser chamados a opinar de forma mais efetiva. Ao mesmo tempo, pode-se imaginar que nesta hora surgirão as discussões sobre as estratégias a serem utilizadas para resolver estas grandes questões e, mais uma vez, a criatividade e conhecimento da questão urbana local pode levar arquitetos e urbanistas a exercerem uma função primordial no processo eleitoral.

Finalmente, caberá aos profissionais da arquitetura e do urbanismo o papel de alertar candidatos e eleitores sobre a possível destruição, ou no mínimo degradação, do meio ambiente urbano durante o processo eleitoral. Não se pode esquecer que durante a corrida pelos votos a presumível necessidade de máxima exposição faz candidatos esquecerem que a cidade é o objeto do cuidado dos mesmos. Neste ambiente de disputa e de busca de visibilidade os muros, postes, pontes e até árvores viram suporte para engenhos de publicidade e as ruas leito de um rio imenso e caudaloso onde correm santinhos com número e foto dos candidatos, os quais sujam a cidade e contribuem para a intensificação da poluição visual e sobrecarga da rede de drenagem pluvial.

As grandes questões e suas possíveis soluções

As mais recentes pesquisas qualitativas e o início dos debates em rádio e televisão têm demonstrado que não haverá como impedir a contaminação do processo eleitoral municipal por questões de cunho nacional e até mesmo mundial. Neste cenário de mundo e problemas globalizados as questões a serem abordadas e debatidas entre candidatos ao executivo e legislativo municipal serão muito semelhantes em localidades distintas deste país. Interessantemente, deste contexto de similaridades e pasteurização dos problemas as soluções devem surgir de ações localizadas e fortemente relacionadas à cultura das comunidades onde estão inseridas.

Como já mencionado em linhas anteriores, da bolsa das grandes questões nacionais a segurança, a saúde, o desemprego e a educação são os que mais atenção tem chamado dos candidatos. Existe nestes temas possibilidade de intervenção específica dos profissionais da arquitetura e do urbanismo? Há como arquitetos e urbanistas contribuírem para a solução de temas a princípio tão deslocados da sua área de ação?

Os profissionais da arquitetura e do urbanismo têm de ter em mente que questões complexas como as acima citadas não terão como ser resolvidas com soluções simplistas. O tema segurança, por exemplo, se inter-relaciona com diversas outras questões, dentre elas desenho urbano, iluminação pública e arquitetura. Estes temas são do conhecimento específico dos arquitetos e dos urbanistas. Conseqüentemente, devem ser levados aos candidatos ao executivo e legislativo municipais como possibilidade de contribuição que estes profissionais têm a dar à construção de cidades mais seguras para se viver. O governo britânico, por exemplo, trabalha continuamente no desenvolvimento de tecnologia e conhecimento na área de projeto preventivo ao crime, para tanto vale visitar o endereço eletrônico www.securedbydesign.com, onde o maior programa em desenvolvimento naquele país é apresentado em detalhe.

A problemática da saúde, assim como a da segurança, pode ter uma contribuição que parta do conhecimento desenvolvido por arquitetos e urbanistas? De acordo com recentes estudos feitos pela Sheffield University (www.shef.ac.uk) para o sistema de saúde britânico, o National Health System (www.nhsdirect.nhs.uk), sim. O estudo mostra que a arquitetura dos equipamentos de saúde pode contribuir para a melhora da saúde das pessoas. De acordo com a pesquisa da universidade britânica, pacientes internados em hospitais recentemente reformados, ou projetados com a finalidade de atender pacientes de enfermidades específicas, têm alta médica mais rápida que aqueles internados em edifícios sem estrutura física adequada, ou não projetados com finalidade específica. Desta forma, o profissional de arquitetura passa a ser uma das ferramentas necessárias para o adequado funcionamento do sistema de saúde pública.

A questão do desemprego, da mesma forma, é algo que pode ser combatido com a ação direta de arquitetos e urbanistas. O governo federal brasileiro têm desenvolvido, através da Caixa Econômica Federal (www.cef.gov.br), programas habitacionais que deverão agir de forma a alavancar os índices de emprego no país. O entendimento governamental de que a indústria da construção civil é importante no processo de geração de novos postos de trabalho coloca arquitetos e urbanistas no olho deste furacão. É claro que, além das tradicionais empresas de construção civil, arquitetos e urbanistas podem trabalhar em parceria com associações de sem casa e o poder público municipal no sentido de garantir a produção de habitação de interesse social de qualidade. Um ótimo exemplo pode ser encontrado na cidade de Cabo Frio, Rio de Janeiro, onde o modelo adotado foi inclusive premiado pela Caixa Econômica Federal. (https://webp.caixa.gov.br).

Finalmente a educação. Há espaço para a atuação de arquitetos e urbanistas neste universo? Pergunta que pode ser respondida por inúmeros estudos feitos durante os últimos anos nos mais diversos países. De acordo com recente tese de doutorado defendida na University of Georgia, Estados Unidos, alunos expostos a uma maior incidência de luz natural têm rendimento escolar de 7% a 18% maior que aqueles em situação adversa. Além da questão específica da iluminação, vários outros estudos desenvolvidos naquele país demonstram que alunos matriculados em escolas bem projetadas têm, em média, rendimento significativamente melhor que seus colegas matriculados em escolas de pobre arquitetura. Como exemplo vale citar os resultados finais do Comprehensive Test of Basic Skills (CTBS) feitos em North Dakota, Estados Unidos, que demonstram um rendimento até 11% superior daqueles alunos matriculados em escolas com arquitetura pensada para a atividade de ensino.

Para todas as questões acima mencionadas têm sido feitos estudos e pesquisas que demonstram a possibilidade da ação direta de arquitetos e urbanistas. Atuando nestas e em outras áreas estes profissionais estarão influenciando na construção de um ambiente urbano mais interessante e prazeroso de se viver. A organização britânica Commission for Architecture and the Built Environment – CABE tem desenvolvido inúmeros estudos que demonstram o papel da arquitetura e do urbanismo na resolução de diversos problemas encontrados no cotidiano das cidades. Uma rápida visita ao website da entidade (www.cabe.org.uk) pode trazer muitas informações, esclarecer muitas dúvidas e apontar diretrizes para a atuação destes profissionais no processo eleitoral que inicia.

Cabe ressaltar, entretanto, que todas as experiências apresentadas e relatadas anteriormente são soluções encontradas para a resolução de problemas específicos de uma determinada localidade. Conseqüentemente, as mesmas devem ser interpretadas e adaptadas à realidade de outros lugares. Desta forma surge, mais uma vez, a necessidade do envolvimento do profissional de arquitetura e urbanismo, que pelo conhecimento específico e aprofundado da realidade de sua cidade poderá ajudar neste processo de interpretação.

Marketing, ou sujeira eleitoral?

Há uma outra dimensão das campanhas eleitorais com a qual arquitetos e urbanistas podem ajudar. Esta outra dimensão diz mais respeito ao processo em si, que ao resultado do mesmo. É nesta dimensão que estão enquadrados os carros de som, standarts, out-doors, santinhos, muros, lápis, chaveiros, sacolas, bonés, camisas e canetas.

São muitas as formas com as quais candidatos se apresentam ao eleitorado. Nem sempre as melhores, mais adequadas e eficientes. Quase sempre as mais impactantes e poluentes ao meio ambiente urbano e mais agressivas aos moradores das cidades.

Como arquitetos e urbanistas podem ajudar?

Primeiro conscientizando os moradores das cidades sobre a necessidade de se preservar o meio ambiente urbano. É nas cidades que vivemos e, portanto, devemos mantê-las limpas e apropriadas para o nosso próprio bem estar. Neste sentido, a organização constante de campanhas educativas, seminários e conferências acerca do tema é muito importante. Nesta perspectiva arquitetos e urbanistas têm um papel fundamental a desempenhar articulando e subsidiando tais ações em nível municipal.

Cumprida esta primeira etapa, os profissionais de arquitetura e urbanismo podem ajudar mobilizando a sociedade em uma segunda vertente de trabalho. Nesta outra linha de atuação, arquitetos e urbanistas podem organizar premiações com o intuito de valorizar a ação daqueles cidadãos que efetivamente contribuem para a manutenção e qualificação do meio ambiente urbano na sua cidade. Neste sentido, cabe ressaltar o Prêmio de Gentileza Urbana, que foi criado pelo IAB/MG (www.iabmg.org.br) e, após mais de dez anos de realização, já foi inclusive exportado para a cidade inglesa de Liverpool.

Finalmente, se mesmo após todo este esforço para garantir a qualidade do meio ambiente urbano arquitetos e urbanistas perceberem que os resultados não foram alcançados, os mesmos poderão se sentir livres para partir para uma nova e derradeira ação, a denúncia. Contando que, mesmo após a implementação de todas as ações anteriores, as cidades ainda estejam sendo vítimas do vandalismo e da poluição visual e sonora decorrentes da propaganda abusiva, cabe aos arquitetos e urbanista denunciarem seus promotores. Infelizmente, muitas das vezes não cabe apenas educar e incentivar as boas práticas, mas a coação, através de campanhas punitivas também têm seu efeito positivo.

No período eleitoral esta situação é ainda mais evidente. Todo o material publicitário utilizado nas campanhas só contribui para piorar o quadro de desolação existente nas já poluídas cidades brasileiras. Candidatos às mais diversas funções públicas deveriam ser os primeiros a zelarem pela qualidade do meio ambiente urbano, mas, infelizmente, esta não tem sido a realidade. O que se vê nas cidades brasileiras durante o período eleitoral é a multiplicação dos índices de poluição visual e sonora devido aos engenhos de publicidade e carros de som utilizados pelos candidatos.

Basta sair pelas ruas das cidades e, imediatamente, percebe-se a sobrecarga de informações decorrente das estratégias de campanha dos diversos candidatos. Não há espaço vazio que não seja ocupado pela criatividade dos candidatos marketeiros. É neste momento que a já comprometida qualidade do espaço urbano em que vivemos é agredida de forma mais visceral. É também neste momento que arquitetos e urbanistas devem exercer seu direito de cidadão e dever de profissional para alertar à sociedade sobre o desrespeito que tais candidatos têm feito às cidades.

É de se esperar que candidatos não utilizem viadutos, pontes, postes, mobiliário e equipamentos urbanos e, pasmem, até árvores, como suporte para seus engenhos de publicidade e pixações. É de se esperar também que candidatos não utilizem carros de som rodando pelas cidades no mais alto volume e com jingles de qualidade duvidosa, para não falar ridículos, intensificando a já assombrosa poluição sonora das cidades. Enfim, é de se esperar que candidatos tenham um mínimo de respeito às cidades e seus moradores durante o processo eleitoral, pois isso demonstra o nível de respeito que terão pelos mesmos durante o exercício de seus mandatos.

Finalmente, é de se esperar que os colegas arquitetos e urbanistas não deixem passar em branco a oportunidade única que as eleições municipais representam para o exercício de sua profissão. É neste período que os colegas poderão apresentar propostas para o futuro das cidades brasileiras, as suas em particular, e, ao mesmo tempo garantir a qualidade do espaço urbano no presente. Portanto, mãos à obra!

sobre o autor

Lessandro Lessa Rodrigues é arquiteto e urbanista pela UFMG, mestre em Regeneração Urbana pela Liverpool Hope University College / Liverpool University e Vice-Presidente do IAB/MG.

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