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research

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architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
O artigo apresenta um inventário de habitação social, construídos pelo poder público na área central de São Paulo. Tem-se como objetivo contribuir para a elaboração de políticas que envolve participação social em integração com as assessorias técnicas.

english
The article presents a social housing inventory built in Sao Paulo central area by public authorities. The main goal is to contribute to the elaboration of policies involving social participation together with technical consultation.

español
Inventario de vivienda social construida por el gobierno en la zona central de SP. El objetivo planteado es contribuir con el desarrollo de las políticas que implican la participación social en la integración con los servicios de asesoramiento técnico.


how to quote

SANCHES, Débora; ALVIM, Angélica Benatti. Inventário da habitação social pública na área central de São Paulo (1990-2012). Arquitextos, São Paulo, ano 16, n. 192.08, Vitruvius, jun. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/16.192/6071>.

Este artigo (1) tem por objetivo apresentar o inventário dos empreendimentos de habitação social, construídos com recursos do poder público para a área central de São Paulo, no período de 1990 a 2012. Busca-se compreender suas características, identificando aqueles que tiveram participação dos futuros moradores com os movimentos sociais em articulação com as assessorias técnicas.

Parte de uma pesquisa (2) que avalia o processo participativo como peça fundamental para a conquista da moradia digna, o inventário dos empreendimentos de habitação social permitiu conhecer o que foi produzido, suas características com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas de habitação social para área central. É derivado de uma ampla pesquisa documental e de campo que apresenta a organização inédita de todos os empreendimentos construídos na área central no período de 1990, ano inicial de viabilização da habitação social para área central com maior participação social, e 2012, ano de conclusão de uma gestão municipal. No período, observa-se a construção de diversos empreendimentos de habitação social na área central, com e sem participação social. As características destes empreendimentos variam e conformam um conjunto a ser avaliado.

A luta dos movimentos sociais de moradia, que atuam na área central de São Paulo, insere-se no âmbito de promoção de programas de requalificação urbana que tem como pressuposto a inserção da moradia em regiões dotadas de infraestrutura, próximas dos serviços e dos locais de trabalho. Nesse contexto, os movimentos sociais reivindicam principalmente projetos participativos e autogestão com o auxílio de assessorias técnicas, ou seja, grupos de profissionais, entre eles arquitetos e urbanistas, que os orientam e dão suporte em diversas fases do processo de conquista da moradia digna.

Processo participativo e moradia digna na área central de São Paulo

Processo de projeto participativo e assessorias técnicas

Mas afinal o que é o processo de projeto participativo? Qual é a importância da assessoria técnica no projeto participativo?

Segundo Lana (3), o projeto participativo é o projeto arquitetônico onde o usuário final participa do processo de projeto em suas diversas fases. Ou seja, as decisões, que são tomadas durante o processo de projeto, são compartilhadas pelo arquiteto – ou a equipe de arquitetos – com os usuários finais. Cada equipe define um processo que é adequado para os usuários que possuem um papel ativo durante a elaboração do projeto. Para a autora, o usuário não é apenas o fornecedor do programa de necessidades a ser atendido ou mero provedor dos recursos da obra. Não se trata de uma coautoria do projeto, mas de uma participação presente ao longo de todo o todo o processo.

No processo de projeto participativo de habitação de interesse social o usuário final é um grupo de pessoas de uma determinada faixa de renda, que se organiza sob a forma de uma associação de moradores. Essa, por sua vez, contrata um escritório convencional de arquitetura para desenvolver o projeto ou mesmo uma assessoria técnica, que diferentemente do escritório convencional, tem como método de trabalho o apoio técnico com equipe interdisciplinar em todo processo, começando pela luta pelo direito à cidade e à moradia digna, passando pela elaboração do projeto de forma participativa até o acompanhamento no pós-uso. Desta forma, a apropriação dos moradores é incorporada ao longo de todo o processo de projeto participativo.

Direito à cidade e à moradia digna

O direito à habitação como bem de primeira necessidade foi enfatizado pela primeira vez pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas – ONU, de 1948. Em meados de 1990, no âmbito dos documentos produzidos pela II Habitat ou II Conferência sobre Assentamentos Humanos – a Agenda Habitat e a Declaração de Istambul – é que o conceito se amplia. Grosso modo, esses documentos reforçam que viver de forma adequada não é apenas ter um teto, mas ter uma habitação adequada, luminosa, arejada e aquecida, com estrutura estável e durável, com infraestrutura básica, localizada a uma distância razoável dos locais de trabalho e dos serviços básicos, por um preço acessível (4).

O entendimento do que vem a ser moradia digna passa pelo entendimento do direto à cidade, definido por Lefebvre (5). O autor aponta que o tecido urbano não se limite à sua morfologia, e sim ao modo de vida, onde o espaço urbano induz a comportamentos e hábitos e gera também preocupações com a diversos outros aspectos da vida social. O isolamento das funções urbanas – morar, trabalhar, circular e lazer – é a antítese das relações socioespaciais que configuram a questão da moradia digna e o direito à cidade. Para o autor, a cidade é obra dos cidadãos, sendo configurada a partir de lutas e disputas entre as diferentes classes sociais, sendo que os conflitos entre os grupos reforçam o sentimento de pertencimento em relação ao meio urbano que habitam.

Tal direito está na base das principais reivindicações dos movimentos sociais de moradia que atuam de forma coletiva que tem como pressuposto a necessidade da promoção de programas de reabilitação e renovação urbana que permitam a inserção da moradia digna em regiões dotadas de infraestrutura e próximas dos serviços e principalmente do trabalho, em função até das condições precárias do sistema de transporte da cidade.

No Brasil, o debate sobre participação social e moradia digna data da década de 1960, no contexto de luta pela Reforma Urbana (6), onde o direito à cidade e à moradia surgem como componentes centrais, emergindo como contraposição a um modelo de urbanização excludente e espoliativo (7).

Seus princípios são retomados na década de 1980, no período de redemocratização do país, quando se elegeu os governos democráticos em cidades brasileiras, e ocorreu a instituição da nova Constituição Federal de 1988, possibilitando assim experimentações sociopolíticas concretas com a criação de espaços de participação social como os conselhos e as conferências municipais, entre outros. A Constituição Federal de 1988 definiu em seus artigos 182 e 183, os princípios da política urbana, incluindo a função social da cidade e da propriedade e instrumentos de combate à retenção especulativa de terrenos por meio da elaboração do plano diretor municipal, seu principal instrumento.

O direito à propriedade foi garantido enquanto direito fundamental, mas também foi atribuído à propriedade o interesse social, condicionando-a à sua função social. A propriedade urbana passou a ser regulada pelo Município, através do Plano Diretor, que estabelece critérios para aplicação da sua função social, ordenando a cidade de forma a garantir o bem-estar dos seus habitantes e seu desenvolvimento. Somente em 2001, é que a CF foi regulamentada pela Lei Federal 10.257, o Estatuto da Cidade, dispondo de princípios e instrumentos para garantir a função social da propriedade urbana, de justiça social e de participação democrática na gestão da cidade. O Estatuto da Cidade reforçou que a moradia é um direito fundamental que deve ser respeitado e atendido por meio da função social da propriedade e da cidade.

Movimento social em São Paulo e a luta pela moradia digna

No município de São Paulo, o movimento de participação social por moradia talvez seja hoje, o principal movimento social do país e o principal interlocutor com o processo de projeto da habitação de interesse social. Sua origem relaciona-se às lutas dos moradores de cortiços, contra as altas taxas de luz e água, contra os despejos sem aviso prévio, contra os abusos dos intermediários e pela regularização de loteamentos, ocorridas no fim da década de 1970 e início dos anos 1980 (8) (9).

A retomada com maior força dos ideais da Reforma Urbana da década de 1960, acontece em 1985, após a redemocratização do país quando diversos atores se articulam, particularmente os movimentos sociais e entidades na luta pela inclusão deste tema na nova Constituição Federal. Para Saule e Uzzo (10), o Movimento Nacional pela Reforma Urbana, em 1986, luta por uma nova ética social, que condena a cidade como fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitos, onde a desigualdade social e a lógica da segregação espacial são fortemente criticadas.

Neste contexto, a experiência municipal do Programa de Habitação Social, desenvolvida pela Superintendência de Habitação Popular – Habi de São Paulo, na gestão da Prefeita Luiza Erundina (1989-1992) foi considerada um laboratório de experiências participativas na produção habitacional (11). As propostas da política habitacional da gestão do governo Erundina tinham intenções ideológicas baseadas na diminuição da segregação socioespacial e integração à cidade legal, buscando inverter a lógica até então praticada, com a implantação de conjuntos habitacionais em vazios urbanos na periferia da cidade.

O Programa de Produção de Habitação por Mutirão e Autogestão, definido naquele período, tinha o objetivo de fortalecer a participação da população na gestão de políticas sociais com projetos de qualidade e custos menores. A autogestão na produção da moradia foi concretizada pela participação intensa dos futuros moradores do empreendimento habitacional, que organizados em associações ou cooperativas, participaram desde o momento inicial de concepção da habitação orientados por equipes de assessorias técnica, na administração da construção das unidades habitacionais em todos os seus aspectos, a partir de regras e diretrizes estabelecidas pelo poder público, responsável pelo seu financiamento (12). A metodologia de trabalho era tripartite – associação de moradores, apoio técnico e poder público – com trabalho coletivo, na perspectiva da melhoria da qualidade e do menor custo da produção habitacional social, desenvolvido entre comunidades, movimentos sociais, profissionais ligados à assistência técnica e a vontade política da então administração municipal.

O programa procurou compatibilizar uma boa arquitetura e adequada inserção urbana com custos compatíveis com a habitação social, o que apontou caminhos que criaram referências projetuais inovadoras. Isso foi possível graças a novas formas de gestão, como o mutirão autogerido e o rigor no controle de custos de produção, valorizando a etapa de projeto. Um grande número de profissionais foi mobilizado para desenvolver os projetos, combinando arquitetos experientes com uma nova geração, organizada em entidades de assessoria técnica, formada em um contato mais estreito com os movimentos de moradia e sob uma perspectiva de projeto participativo (13).

A produção de novas unidades foi garantida pela política de desapropriação de vazios urbanos dotados de infraestrutura, inclusive em áreas centrais, preferindo-se empreendimentos com poucas unidades habitacionais, com projetos participativos.

Nas gestões seguintes (Maluf e Pitta, 1993-2000), todas as ações foram paralisadas e houve, mais uma vez, um retrocesso no modelo de política de habitação adotado pelo poder municipal, onde predominou os métodos convencionais de construção com projetos homogêneos sem a participação da população e das assessorias técnicas nas decisões. As consequências foram a paralisação das obras de vários mutirões espalhados pela cidade e a desarticulação das assessorias técnicas, ao longo do tempo, em função da falta de perspectivas de trabalho.

A retomada e a conclusão das obras de vários mutirões aconteceram na gestão municipal de Marta Suplicy (2001-2004) com a oportunidade de maior participação social na política habitacional e das assessorias técnicas no desenvolvimento de projetos, entre eles nos estudos de retrofit (14) para os imóveis vazios na área central da cidade (15).

A partir de então, os movimentos sociais de moradia se fortalecem com a experiência promovida pela municipalidade, e ganham capacidade de articulação, bem como no aprendizado técnico a partir da vivência com as denominadas assessorias técnicas, formadas por arquitetos e equipes interdisciplinares.

Entre 1990 e 2012, 38 empreendimentos de habitação social foram construídos na área central de São Paulo. Os empreendimentos foram inventariados permitindo entender diferenças e semelhanças daqueles construídos com e sem participação social.

Inventário da habitação social na área central de São Paulo

Entre os anos de 1990 e 2012, foram construídos pelo poder público, 38 empreendimentos de habitação social, totalizando 3.734 unidades habitacionais. Do conjunto, 14 (36,84%) foram projetados de forma participativa por meio de assessorias técnicas e 24 (63,16%) por escritórios convencionais de arquitetura. Do total de empreendimentos projetados por escritório de arquitetura, 08 (33,32%) tiveram participação do movimento de moradia em sua origem.

No período analisado, 13 empreendimentos foram construídos pelo poder publico municipal, dos quais 08 (oito) tiveram participação social e assessoria técnica, sendo que 07 foram viabilizados no âmbito do Programa de Habitações Populares da Região Central de São Paulo.

No âmbito estadual, o Programa de Atuação em Cortiços e o Banco Interamericano – PAC/BID do governo do Estado viabilizou 17 empreendimentos, sendo que apenas 01 contou com participação social e assessoria técnica (16).

No nível federal foram construídos 07 empreendimentos com recursos do Programa de Arrendamento Residencial – PAR da Caixa Econômica Federal, sendo que 05 contaram com o movimento social e a assessoria técnica.

Em relação à situação das áreas antes da construção do empreendimento de habitação social, a pesquisa indicou que 44,74% do total foi construído em local onde existia cortiço que foram demolidos, classificados nesta pesquisa por construção nova tipo B, totalizando 17 empreendimentos; em seguida, 34,22% (13 empreendimentos) classificam-se como do tipo A, prédios que passaram por retrofit transformando-se em habitação social; 13,15% (5 empreendimentos) foram classificados como do tipo C, condomínio que foi edificado com prédio de muitos pavimentos e isolado no lote com grande número de habitantes; na sequência, 5,26% (2 empreendimentos) do tipo E, condomínios que foram edificados com prédios em terreno vazio sem uso do elevador e apenas 2,63% (1 empreendimento) do tipo D, que foi edificado em terreno vazio próximo a área de favela.

Empreendimentos de Habitação Social da área central de São Paulo (1990-2012). Tipo de origem
Imagem divulgação [Sanches, 2015]

A seguir algumas imagens de empreendimentos de habitação social na área central.

Pari A – tipo C
Foto divulgação [Arquivo pessoal da autora]

Vilinha 25 de janeiro – tipo B
Foto divulgação [Arquivo pessoal da autora]

Maria Paula – tipo A
Foto divulgação [Arquivo pessoal da autora]

Deste conjunto, contaram com projeto participativo e assessoria técnica os seguintes tipos de empreendimentos: 08 do tipo construção nova (07 de responsabilidade municipal e 01 do governo estadual); e, 06 do tipo retrofit (05 do governo federal). As demais tipologias de empreendimentos foram projetadas por escritório convencional de arquitetura.

O gráfico abaixo corrobora no entendimento da localização dos 38 empreendimentos de habitação social nos distritos da área central de São Paulo, a instância responsável, bem como as áreas definidas como ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) pelo Plano Diretor Estratégico de 2002, então vigente.

Empreendimentos de habitação social distribuídos conforme o distrito (1990 a 2012), e limites das ZEIS
Imagem divulgação [Fonte: Sanches, 2015]

Nota-se que o Pari é o distrito que apresenta o maior número de empreendimentos, 7 no total, seguidos dos distritos Belém e República com 5 cada, Bom Retiro 4, Mooca e Santa Cecília cada 3 e Ipiranga, Brás, Cambuci e Bela Vista com 2 cada. Nos distritos Pari e Bom Retiro a concentração das tipologias de origem são de cortiços que foram demolidos e no mesmo local existe construção nova de habitação social. Percebe-se também que há concentração de edifícios que passaram por retrofit que estão localizados nos distritos República, Sé e Belém.

Em relação às áreas definidas como ZEIS, 21 dos empreendimentos (55,26%), localizam-se dentro de ZEIS ou muito próximas do seu perímetro. Estes empreendimentos foram construídos entre 1995 e 2012.

Considerando-se a média de 2,68 moradores por domicílio nos distritos da área central de São Paulo, conforme dados do IBGE de 2010, calculou-se a densidade líquida pelo tipo de origem de viabilização de empreendimento.

Média de densidade demográfica líquida pelo tipo de origem de viabilização de empreendimento
Imagem divulgação [Fonte: Sanches, 2015]

Observa-se que a densidade média líquida da habitação social construída por meio de retrofit é de 3.813 hab/ha, muito superior à densidade líquida das outras tipologias. Destaca-se que a maioria dos imóveis, transformados em HIS, foi construída nas décadas de 1950 e 1960, cujo coeficiente de aproveitamento era de 6 para uso comercial (17) e foram reformados para a mudança de uso para habitação social. Em seguida, destacam-se os empreendimentos tipo construção nova – C empreendimentos novos com muitos pavimentos e isolados no lote e com elevador (do governo estadual PAC/BID), com densidade líquida 1.420hab/ha. A tipologia B de origem, cortiços que foram demolidos e no mesmo local existe construção nova, apresenta densidade média líquida de 1.270 hab/ha; seguido pelos empreendimentos da tipologia E, condomínios que foram edificados com prédios em terreno vazio sem uso de elevador, onde a média da densidade média líquida é 1.037 hab/ha. Por fim, os empreendimentos do tipo D, condomínios que foram edificados com prédios em terreno vazio próximo a área de favela, apresentam a menor densidade média líquida, 661 hab/ha.

A maior parte dos empreendimentos que tiveram participação social e assessoria técnica envolvem empreendimentos novos que foram construídos em antigos locais de cortiços (tipo B) e do tipo retrofit, observa-se que as densidades são superiores.

Analisando apenas os empreendimentos que envolveram participação social, nota-se que o tempo de concretização, desde o início de mobilização da população até a conclusão da obra, é bastante longo e varia conforme a instância pública responsável pelo processo. Dos 13 empreendimentos realizados com recursos do governo municipal, todos no momento inicial contaram com a participação social, sendo que 10 tiveram o início da mobilização(18) em período anterior à demarcação das áreas de ZEIS de 2002, variando de 7 a 21 anos, com a média de 12,2 anos.

Empreendimentos de Habitação Social construídos com recursos do município: ano de início de mobilização para efetivação e conclusão da obra dos empreendimentos de habitação social da área central
Imagem divulgação [Fonte: Sanches, 2015]

Os empreendimentos de responsabilidade do governo estadual que contaram com participação social no início da mobilização identificado foram apenas 03 (três). Percebe-se que o tempo de concretização dos empreendimentos varia de 6 a 9 anos, com a média de 7,3 anos.

Empreendimentos de Habitação Social construídos com recursos do Estado: ano de início de mobilização para efetivação e conclusão da obra dos empreendimentos de habitação social da área central
Imagem divulgação [Fonte: Sanches, 2015]

Com recursos do governo federal, a pesquisa identificou 7 (sete) empreendimentos, todos do tipo Retrofit, realizados com participação social, sendo que o início da mobilização varia de 2 a 8 anos, com média de 5,28 anos.

Empreendimentos de Habitação Social construídos entre 1990 e 2012 com recursos do governo federal: ano de início de mobilização para efetivação e conclusão da obra dos empreendimentos de habitação social da área central
Imagem divulgação [Fonte: Sanches, 2015]

Considerações finais

Com a redemocratização no Brasil ocorrida a partir de meados de 1980, os movimentos sociais adquirem maior relevância de atuação, principalmente aqueles que lutam pela conquista da moradia digna e pelo direito à cidade.

A gestão municipal de Luiza Erundina (1989 a 1992) em São Paulo é considerada uma importante referência, à medida em que implementou uma política habitacional inovadora em parceria com os movimentos sociais. Principalmente os programas de Habitações Populares da Região Central de São Paulo e o de Recuperação de Cortiços realizados no período de 1989 a 1992 (19), apontaram ser possível avançar na conquista do direito à cidade e da habitação, em busca da moradia digna. Em muitos casos, como eram imóveis vazios, passaram por ocupação pelos movimentos de moradia, como forma de protesto para o poder público efetivar política pública de habitação social na área central.

O inventário dos empreendimentos de habitação social na área central do município de São Paulo, produzidos pelo poder público entre 1990 a 2012, apresentou um total de 38 empreendimentos, produzidos no âmbito de quatro programas governamentais, com 3.734 unidades habitacionais. O número total de unidades habitacionais representa uma quantidade significativa de habitação em área central em relação a outras cidades brasileiras, fato atribuído a uma articulação do governo municipal com os governos do estado (20) e federal que desencadeou de forma mais efetiva a construção de habitação social.

A média do tempo do início do processo desde a mobilização até a conclusão da obra, com as informações de 20 empreendimentos que tiveram pelo menos no período inicial a participação social, foi de 9,05 anos. Verifica-se que a partir de 2008 nenhuma obra concluída contou projeto realizado por assessorias técnicas, ou seja, com a participação da população no desenvolvimento do processo de projeto.

Verifica-se que a participação dos movimentos de moradia da área central contribuíram para a demarcação das ZEIS 3 no PDE de 2002, sendo que as assessorias técnicas participaram do mapeamento das potencialidades de reserva de imóveis vazios na área central para futura produção de habitação social.

Reforça-se a importância da participação dos movimentos sociais que acompanham as famílias durante o longo processo de viabilização da moradia digna e contribuem para a concretização dos empreendimentos de habitação social com apoio das assessorias técnicas, pressionando o poder público para a concretização e implementação de instrumentos urbanísticos que viabilizam uma cidade mais justa e equilibrada. Torna-se necessário refletir sobre as perspectivas futuras da política habitacional de São Paulo de modo a valorizar a participação da população em integração com o poder público e as Assessorias Técnicas em todas as fases do processo de projeto. Somente com participação efetiva dos futuros usuários no processo de projeto é que se garantirá uma maior apropriação dos empreendimentos pelos moradores no pós uso, sendo este um importante caminho para a conquista da moradia digna.

notas

1
Uma versão modificada deste artigo foi apresentado originalmente no 3º. CIHEL, Congresso Internacional da Habitação no Espaço Lusófono em 2015.

2
Esta pesquisa é fruto do seguinte trabalho: SANCHES, Débora. Processo participativo como instrumento de moradia digna: uma avaliação dos projetos da área central de São Paulo (1990-2012). Tese de doutorado. Orientadora Angélica T. B. Alvim. São Paulo, Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2015. A pesquisa contou com o apoio financeiro do Fundo Mackpesquisa e da Capes, por meio do Programa PDSE. A tese recebeu Menção Honrosa “Premio Internacional de Tesis de Investigación 2015: Vivienda y habitabilidad, una perspectiva regional“, promovida pelo El Instituto del Fondo Nacional de la Vivienda para los Trabajadores – Infonavit, em colaboração com a Facultad de Arquitectura e o Programa Universitario de Estudios sobre la Ciudad – PUEC, Universidad Nacional Autónoma de México – UNAM.

20
SÃO PAULO (Estado). Diagnóstico das condições habitacionais no Estado de São Paulo. São Paulo, CDHU-Seade, 2001.

3
LANA, Sibelle Meyer. O arquiteto e o processo de projeto participativo: o caso do RSV. Dissertação de mestrado. Belo Horizonte, Programa de Pós-Graduação em Arquitetura, Universidade Federal de Minas Gerais, 2007.

4
MARQUES, Carlos. Habitação: da indústria à fábrica da cidade. Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2012.

5
LEFEBVRE, Henri (1968). O direito à cidade. São Paulo, Centauro, 2011.

6
O movimento pela Reforma Urbana ocorreu no início dos anos de 1960 e tem como marco o Seminário Nacional de Reforma Urbana ocorrido em 1963.

7
KOWARICK, Lucio. A espoliação urbana. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980.

8
GHON, Maria da Glória Marcondes. Movimentos sociais e a luta pela moradia. São Paulo, Edições Loyola, 1991; KOWARICK, Lucio; ANT, Clara. Cem anos de promiscuidade: o cortiço na cidade de São Paulo. In: Kowarick Lúcio (org.) As lutas sociais e a cidade: São Paulo, passado e presente. 2 ed. São Paulo, Paz e Terra, 1994.

9
Em São Paulo, no contexto da ditadura militar na metade da década de 1970, a participação popular tem forte interlocução com as Comunidades Eclesiais de Base – CEBs da Igreja Católica. As Pastorais da Arquidiocese trabalhavam com a população moradora de cortiços em distritos da área central. Com o tempo e a atuação com os vários tipos de moradias precárias, as pastorais passam a se chamar de Pastoral da Moradia. Ver: CARICARI, Ana Maria; KOHARA, Luiz (org.). Cortiços em São Paulo: soluções viáveis para habitação social no centro da cidade e legislação de proteção à moradia. São Paulo, Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, 2006.

10
SAULE JÚNIOR, Nelson; UZZO, Karina. A trajetória da Reforma Urbana no Brasil. São Paulo, DHP, 2009. Disponível em <www.redbcm.com.br/arquivos/bibliografia/a%20trajectoria%20n%20saule%20k%20uzzo.pdf>. Acesso em nov. de 2014.

11
BONDUKI, Nabil. Os pioneiros da habitação social no Brasil. Volume 1. São Paulo, Editora Unesp/Edições Sesc, 2014.

12
BONDUKI, Nabil. Habitar São Paulo: reflexões sobre a gestão urbana. São Paulo, Estação Liberdade, 2000.

13
BONDUKI, Nabil. Os pioneiros da habitação social no Brasil (op.cit).

14
Retrofit: termo utilizado para referir-se a reformas de edifícios antigos que se tornaram obsoletos, buscando adaptá-los para um novo uso, modernizando-o, melhorando os equipamentos, conforto e infraestrutura, aumentando sua vida útil, entre outros. Neste caso, os edifícios estavam vazios há décadas e foram reformados e transformados em habitação social.

15
Documentos oficiais consultados relativos ao período: SÃO PAULO (Município). Política Municipal de Habitação. São Paulo, SEHAB, 2001; SÃO PAULO (Município). Plano de Ação da SEHAB. São Paulo, SEHAB, 2003; SÃO PAULO (Município). Programa Morar no Centro. São Paulo, SEHAB, 2004; SÃO PAULO (Município). Relatório Reabilitação de edifícios na área central. Balanço de Gestão 2001 a 2004. São Paulo, GTAI Grupo Técnico de Análise de Imóveis, 2004; SÃO PAULO (Município). Lei Nº 13.430, de 13 de Setembro de 2002. Institui o Plano Diretor Estratégico de São Paulo. São Paulo, 2002. Disponível em: <http://ww2.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/desenvolvimentourbano/plano_diretor/integra/formato_do_arquivo.pdf>. Acesso em out. 2014.

16
SÃO PAULO (Estado). Relatório Geral do programa de atuação em cortiços. São Paulo, CDHU, 2012.

17
Ver: SOMEKH, Nadia (1997). A cidade vertical e o urbanismo modernizador. 2ª edição revisada, São Paulo, Editora Mackenzie, Romano Guerra, 2014.

18
Esta pesquisa não encontrou informação de 3 empreendimentos.

19
SÃO PAULO (Município). Cortiços: Programa de Habitações Populares da Região Central de São Paulo. São Paulo, Prefeitura Municipal de São Paulo, 1992.

sobre as autoras

Débora Sanches, Mestre em Habitação pelo IPT. Doutora pelo PPGAU na Universidade Presbiteriana Mackenzie, com período sanduíche (Capes do Programa PSDE no Laboratório Nacional de Engenharia Civil LNEC Portugal). Docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo. Membro do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos e do Conselho Municipal de Habitação da Sehab/PMSP – gestão 2014/2016.

Angélica T. B. Alvim, Mestre e Doutora pela FAU/USP, docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e do PPGAU da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bolsista de Produtividade em Pesquisa CNPq, nível 2. Atualmente é Coordenadora Geral de Pós-Graduação Stricto Sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie e Presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo (ANPARQ) – gestão 2015/2016.

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