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architexts ISSN 1809-6298

abstracts

português
Esse artigo expõe um estudo do largo de Coimbra em Ouro Preto MG, a partir da análise de dados históricos, iconográficos e materiais. O resultado apresentado é um inventário do lugar, importante instrumento de preservação de bens culturais.

english
This article exposes a study of largo de Coimbra in Ouro Preto MG, from the survey of historical, iconographic and material. The result presented is an inventory of the place, an important instrument for the preservation of cultural assets.

español
Este artículo expone un estudio de largo de Coimbra en Ouro Preto MG, a partir de la análisis de datos históricos, iconográficos, materiales. El resultado es un inventario del lugar, un instrumento importante para la preservación de los bienes culturales.


how to quote

FRANÇA, Tayami Fonseca. Do material ao intangível. Estudo e inventário do largo de Coimbra em Ouro Preto Preto MG. Arquitextos, São Paulo, ano 21, n. 244.05, Vitruvius, set. 2020 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/21.244/7880>.

Mercado de Tropeiros
Foto Marc Ferrez, 1888 [IMS]

A cidade de Ouro Preto teve o início de sua formação no século 17 com as primeiras expedições bandeiristas. Inicialmente formada por arraiais mineradores, tornou-se um importante polo em exploração aurífera atraindo uma grande população. Posteriormente ocorreu a união das freguesias do Pilar e de Antônio Dias, que em 1711 seria elevada a Vila Rica. O crescimento da cidade se deu inicialmente através do eixo de ligação entre esses dois arraiais denominado pelo arquiteto Sylvio de Vasconcellos (1) como “caminho tronco”. Por conseguinte, houve o adensamento dos outros eixos, principalmente das encostas.

Após o início de sua conformação urbana, surgiram na cidade de Ouro Preto espaços públicos – largos e praças – de relevância à cidade, com características sociais, políticas ou comerciais. Dentre esses espaços é possível citar as praças Tiradentes, da Estação, Reinaldo Alves de Brito, e os largos da Alegria, do Rosário e o de Coimbra. Destaca-se aqui o largo de Coimbra como objeto de estudo e análise.

O largo, objeto de estudo, passou por diferentes configurações e usos ao longo do tempo, conforme será demonstrado adiante. A conformação atual do espaço se deu na primeira metade do século 20, com a demolição de um mercado instalado em uma construção eclética, após a criação da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Dphan – sigla foi utilizada ao referenciar ao atual órgão Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, devido às mudanças de nomenclatura sofridas ao longo do tempo. O local se mantém vazio, com intervenções e apropriações esporádicas, passando a ser ocupado de forma mais permanente na década de 1980 por um grupo de artesãos, que estabeleceram ali a Feira de artesanato em pedra-sabão, também conhecida popularmente como feirinha.

Portanto, o objetivo desse estudo é produzir o Inventário do largo de Coimbra, como pesquisa exploratória dos significados atribuídos ao longo de sua história, desde o início de sua conformação até os dias atuais, com a presença da Feira de pedra-sabão.

Essa pesquisa se justifica pela possiblidade de contribuição no entendimento das relações históricas, sociais, culturais e urbanísticas dentro de um centro histórico de importância patrimonial a nível mundial. Tratando-se Ouro Preto de um sítio tombado, é de relevância o estudo das apropriações de seus espaços públicos, devido, principalmente, ao seu papel na formação e conformação paisagística da cidade.

O largo de Coimbra é um local de destaque na paisagem do Centro, estando cercada por monumentos como a igreja de São Francisco de Assis, e também sendo um mirante para a paisagem composta pela ladeira de Santa Efigênia e o Pico do Itacolomi, também símbolos da cidade. Além de suas transformações físico-paisagísticas e de significações ao decorrer do tempo, é um local que, na atualidade, possui um sentido intrínseco que precisa ser estudado e melhor definido, para que se possa projetar e preservar esse espaço público – patrimônio da cidade – desenvolvendo-se infraestrutura que lhe sejam necessárias e adequadas aos usos e apropriações.

Para desenvolvimento da pesquisa utilizou-se de pesquisa bibliográfica acerca do conceito de memória e patrimônio cultural, sobre a formação urbana de Ouro Preto, o histórico do largo de Coimbra e suas ocupações e a elaboração do Inventário que será apresentado na parte final deste estudo.

A pesquisa de campo foi de grande relevância para entender a atual situação desse espaço. Consistiu em observação direta, com visitas ao local. Foram escolhidos seis dias distribuídos ao longo de quatro meses (dezembro de 2017, e janeiro, maio e junho de 2018), de forma que abrangessem dias comuns e finais de semana. Quando possível, foram realizadas observações durante os três períodos do dia para entender como ocorre o atual uso do largo. Foram realizados anotações e registros fotográficos, assim como um levantamento de caráter qualitativo e quantitativo da feirinha, contemplando dados construtivos, dimensões do espaço ocupado e objetos comercializados.

Espera-se com este estudo fornecer informações organizadas sob a forma de inventário arquitetônico e urbanístico para que esteja ao alcance da população que vivencia esse bem cultural e o mantém vivo ao longo do tempo, bem como propor inquietações para trabalhos futuros sobre a dinâmica do patrimônio e seus usos.

Evento cultural no largo de Coimbra na década de 1970
Autor desconhecido [Adelc]

Ouro Preto e o largo de Coimbra

O largo de Coimbra compõe um dos lugares destacados pelo patrimônio e pelo turismo na cidade de Ouro Preto. Se dá a partir de um alargamento de ruas existentes em oposição à rua Direita (atual Conde de Bobadela), abaixo do antigo morro de Santa Quitéria (atual praça Tiradentes). Se encontra defronte à Igreja de São Francisco de Assis – construída entre os anos de 1790 e 1794 e um dos primeiros bens tombados individualmente, em 1938.

Ao avaliar o largo frente aos conceitos de Murillo Marx (2) pode-se constatar que o autor, ao analisar as transformações do "espaço urbano público brasileiro”, verifica: esses locais, inicialmente de essência religiosa entram em processo de laicização, ou seja, os eventos religiosos foram se distanciando da vida cotidiana e, as “apropriações e ocorrências passam a adquirir um caráter de natureza mundana” (3). O largo de Coimbra, portanto, inicialmente parte da vida religiosa, ligado à Ordem Terceira de São Francisco de Assis, aos poucos adquiriu um caráter mundano, com outras formas de utilização e significação do espaço.

Localização do largo de Coimbra
Imagem divulgação [Google Earth]

No século 18, o largo de Coimbra era um local para demonstração de poder da época, com a presença de um Pelourinho, onde castigavam-se escravos e infratores, e local de realização das eleições para o governo e onde publicavam-se editais (4). Um lugar importante de convivência da vida política e social da cidade nesse período.

No ano de 1826, ainda com a presença do Pelourinho, determinou-se a construção de um tipo de mercado para os tropeiros, onde poderiam se abrigar e deixar o que conduzissem. Em um antigo jornal local da cidade (5), essa construção aparece descrita como um barracão, com quartos, três grandes portas e um alpendre. Em frente à casa havia um pátio calçado com estacas para amarrar os animais, além de um grande tanque, com água corrente.

Ainda no final do século 19, discorre Sylvio de Vasconcellos (6), com a estagnação econômica e após a perda do título de capital de Minas Gerais, ao buscar-se uma “modernização” e acompanhando o movimento da industrialização que chegava à cidade, o Mercado de tropeiros foi substituído por uma arquitetura neoclássica. O espaço para comércio era voltado para a venda de gêneros alimentícios diversificados, podendo-se citar a presença do açougue na lateral voltada para a rua Claudio Manoel (7).

Mercado Municipal, construído em alvenaria, estilo neoclássico
Foto Eric Hess, 1938 [Iphan]

No início do século 20, ao redescobrir a cidade, os modernistas consideraram a arquitetura colonial ouropretana como a “verdadeira identidade arquitetônica das cidades brasileiras” (8). Sendo que o estilo eclético não foi reconhecido como autêntico e por isso muitas dessas edificações construídas durante o século 19 foram reconfiguradas ao estilo colonial ou demolidas. Nesse cenário, o mercado foi demolido, entre 1941 e1946 (9).

Feira de hortifuti semanal no largo de Coimbra na década de 1970
Autor desconhecido [Adelc]

A nova paisagem descortinada com a remoção do Mercado gerou uma nova composição de visibilidade a partir desse local (10). Assim, o espaço remanescente possibilitou diversas formas de apropriação. Então, o uso comercial retornou ao largo de forma espontânea. Inicialmente com algumas feiras periódicas com artigos variados, desde artesanatos, arte popular, comidas e bebidas típicas, além de hortifrutigranjeiros, como é possível constatar através de relatos de moradores e registros fotográficos.

O largo, além de abrigar atualmente a feirinha (que se tornou permanente em meados de 1980), também é palco de festividades religiosas como a Semana Santa e, eventos não religiosos como apresentações musicais. Tendo em vista a grande dimensão plana do largo, com a possibilidade de reorganização do espaço ocupado pela feirinha e da dinâmica de funcionamento, abrangendo multiplicidade de usos; conclui-se tratar de um espaço com um potencial para atender atividades culturais (apresentações culturais que ocorrem em eventos da cidade, shows de menor dimensão) e feiras diversas.

Dinâmicas da Feira de artesanato e Pedra-sabão na cidade patrimônio

A Feira de pedra-sabão existente desde da década de 1980, suscita debates acerca de sua legitimidade desde de sua fixação no espaço. É importante ressaltar, assim como Castriota (11), que, embora de caráter comercial, a partir de sua instalação, o local passa a ser identificado pela população como voltado para o turista.

Inicialmente a feirinha teve por alguns anos, apoio da Prefeitura de Ouro Preto com controle e fiscalização do espaço físico da feira e dos bens comercializados. Houve tentativa de intervenção com mobiliário, mas que não foi adequada ao uso e levou a adaptação pelos expositores, de acordo com suas experiências diárias. Essa intervenção da prefeitura acabou por volta do ano de 2004, quando o Ministério Público instaurou um processo contra a Feira, motivado pela ação de um feirante que supostamente teria realizado uma obra, fazendo uma base em tijolos para sua banca. Desde essa época a feirinha teve um grande aumento de expositores e barracas, ocorrendo irregularidades de ocupação desse espaço. Contudo é possível comprovar através de ofícios entregues a órgãos municipais onde a Associação dos Expositores no largo do Coimbra – Adelc, criada no ano de 1999, procura retomar a regularização.

Com indícios (12) de transferência da feira para o “Paço da Misericórdia” – obra de restauração da antiga Santa Casa de Misericórdia para abrigar o Centro de Artes e Fazeres de Ouro Preto – em 2011, o debate retornou à pauta. Ao mesmo tempo, a ação civil pública contra o Município, aberta no ano de 2004, em relação ao espaço do largo de Coimbra continuou em trâmite no judiciário, até a proximidade das alegações finais do processo.

Nesse cenário, no final do ano de 2017 os expositores junto à Associação e a um grupo de colaboradores começaram uma mobilização para reconhecimento da Feira como patrimônio imaterial. Iniciou-se a divulgação de um abaixo assinado e, também, foi protocolado em 2017, junto à Secretaria Municipal de Patrimônio e Cultura de Ouro Preto, a solicitação de abertura do processo de registro da Feira a nível municipal, como patrimônio imaterial na categoria de Lugar. O pedido foi realizado considerando que essa tem qualidades de patrimônio cultural por ter qualidades de “referência à identidade à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (13) e, também, indicando que o largo de Coimbra possui uma história associada às atividades de produção e comercialização (14).

Em reunião ordinária no Conselho de Patrimônio da cidade de Ouro Preto em novembro de 2017, foi apresentado o pedido de registro, assim como dados e informações sobre a ocupação da feira e a história do largo de Coimbra. Já em dezembro, foi determinada a formação de uma comissão para análise todos os aspectos relacionados ao processo de registro e as implicações técnicas, jurídicas e culturais do objeto em estudo. Determinou-se execução de relatório final e o parecer da Comissão e do Conselho de Patrimônio quanto ao processo de registro.

Vista do largo de Coimbra
Foto Tayami Fonseca França, 2018

Esse relatório, finalizado no início de 2018, foi apresentado em reunião ordinária do Conselho em fevereiro. Apontou-se que a feirinha possui relevância cultural e turística para a cidade e que essa desempenha uma importante função social como fonte de renda para os envolvidos. Considerou-se também que a atual configuração da feira gera impacto negativo aos bens tombados em seu entorno e que as irregularidades existentes impossibilitam o julgamento de um processo de registro. Concluiu-se que esse processo deverá ser analisado somente perante indicação de proposta de reabilitação do espaço, regularização dos expositores e atividades (15).

Atualmente, há movimentações para regularizar a Feira e foi realizada eleição da nova diretoria da Associação. Tem se dado continuidade a um projeto de revitalização iniciado no final de 2018, para avaliação dos órgãos responsáveis e outros estudos vêm se desenvolvendo desde então.

O largo de Coimbra é um espaço que, a partir de suas primeiras ocupações, começou uma trajetória de diferentes apropriações de acordo com as necessidades de cada época. Portanto, os significados e configurações do local permaneceram em mutação até os dias atuais. De espaço vazio a local construído, retornou ao vazio em busca do que os modernistas consideravam o ideal da cidade colonial, uma grande praça seca com destaque para a igreja de São Francisco de Assis. A atual apropriação de parte desse espaço, pela Feira de Artesanato, está sendo muito debatida, pois passou de efêmera a permanente, mais uma vez alterando a significação do local.

A Feira, local de comércio turístico, precisa passar por proposta de regularização, como aponta a Secretaria de Turismo e o Ministério Público, para a avaliação dessa como Patrimônio Imaterial, atendendo aos parâmetros urbanísticos e arquitetônicos, além das diretrizes de ocupação de espaço público na cidade. Mas, para além disso, é preciso entender sua relação e relevância para a população, o espaço e para a cidade.

É importante destacar a dinâmica do patrimônio e as dificuldades de preservação a partir de valores que precisam ser revistos a cada bem cultural, a partir desse instrumento de proteção, o Registro, que envolve tantas questões e fazem repensar o sentido do patrimônio. O ponto inicial da construção identitária e cultural de um povo é a “memória”, assim como discorre Nora (16), um “fenômeno sempre atual”, que está em constante processo de evolução e suscetível a esquecimentos. Em contraposição à história, o autor ainda aponta que essa é a reconstrução daquilo que não mais existe, uma representação do passado baseada em fatos temporais, uma construção relativa. A memória, por sofrer deformações e aos poucos perder-se, leva à necessidade de suportes exteriores, referências tangíveis para preservação do passado.

Tem-se, então, a tendência de acumular vestígios, documentos, ou seja, qualquer forma palpável e visível daquilo que um dia existiu. O conceito de patrimônio surge inicialmente do significado de herança, ter e guardar algo de importância e que carrega um significado. A história leva a necessidade de ter-se “lugares de memória”, lugares esses de sentido material, simbólico e funcional. São referências de si mesmos, guardando o significado do passado e evoluindo no presente, aberto a significações (17).

A exemplo do que ocorreu no largo de Coimbra, sua identidade não foi planejada ou pré-determinada, foi construída ao longo dos anos, assim como apresenta Castriota (18) após construção da igreja de São Francisco de Assis, o largo foi sendo moldado e caracterizado pela própria população, tendo em vista que sua localização proporcionava vocação ao uso comercial. Ao longo de mais de um século construiu-se uma identidade baseada nas relações, para além de comerciais, as sociais e cotidianas daquele local e pelo ambiente edificado que foi sendo desenhado pelas construções lindeiras e posteriormente pelas duas arquiteturas que ali existiram.

Entretanto, já no século 20, o largo sofre sua maior intervenção, por parte do Dphan. Com a demolição do Mercado em estilo neoclássico, o órgão não apenas “elimina um testemunho arquitetônico de um estilo considerado sem importância e considerado em desarmonia com o conjunto” (19), como também suprime parte da memória, dos vestígios da história; apaga um “lugar de memória”.

José Reginaldo Gonçalves (20) descreve a categorização do patrimônio enquanto “colecionamento”, exatamente no sentido de que na atualidade, objetos móveis e imóveis são, nas palavras do autor, “apropriados e expostos por determinados grupos sociais”. Ele ainda aponta que alguns autores interpretam que o homem moderno possui uma necessidade em possuir bens, a identidade de um indivíduo ou coletividade define-se pela detenção de bens. Portanto, nesse contexto, a cultura seria algo a se possuir, preservar etc. Françoise Choay (21) ao descrever a construção do conceito de patrimônio, apresenta os primeiros bens considerados patrimônios, os monumentos.

Com ações intervencionistas dos modernistas de retomar o estilo arquitetônico representativo nacional e, no caso do Mercado do largo de Coimbra, “ressaltar a Igreja, possibilitando-lhe uma visibilidade mais desimpedida” (22) é possível identificar a necessidade de destacarem uma memória escolhida – de um período da história e relativa a um grupo social. Antes de preservação do sítio cultural de Ouro Preto, é interessante analisar as ações inicias do órgão e quais foram seus desdobramentos.

As antigas cidades brasileiras possuem influência e herança histórica portuguesa, contudo, apesar de similaridades, apresentam características próprias, forjadas a partir da identidade e especificidade de seus habitantes que as construíram ao longo do tempo. Tal como afirma , José Newton Coelho Meneses (23), as cidades denominadas históricas são interpretadas, de modo geral, como um padrão, um modelo estético construído a partir da realidade colonial, quando deveriam ter aproveitadas as possibilidades interpretativas de uma cultura diversa e dinâmica.

Para essa pesquisa, cabe destacar que como José Newton Coelho Meneses (24) afirma, o largo, da mesma forma como todo patrimônio deve ser interpretado, é patrimônio mutável, dinâmico, nos espectros material e intangível. Algumas das alterações ocorreram de forma natural, ou seja, porque houve a necessidade de que alterasse a configuração espacial ou física. Mas, com a demolição do Mercado ocorreu uma intervenção externa, houve uma quebra de uma continuidade da vivência e da ligação de significado por parte da população com o lugar. Isso levou a uma nova forma de apropriação do espaço público que, apesar de retomar, em parte, o uso comercial, tem um novo direcionamento, gera questionamentos e ainda necessita-se regularizar o novo uso. Enquanto isso, permanece a o alteamento do largo ocupado por completo pela feirinha e o processo de registro em suspenso no Conselho Municipal de Patrimônio.

O inventário do largo de Coimbra

O Inventário é um instrumento técnico importante na preservação de referências culturais e também de acervos arquitetônicos e urbanísticos. E destaca-se o que Leonardo Barci Castriota (25) aponta: o inventário é um instrumento de conservação e também pode ser um artifício utilizado no planejamento urbano.

A Secretaria de Patrimônio e Cultura da Prefeitura de Ouro Preto possui um grande acervo, feito pelo ICMS cultural que consiste em Inventário para Preservação do Patrimônio Cultural – Ipac de diversos monumentos, edificações, bens imateriais e bairros, mas não há um inventário acerca do largo de Coimbra, até o momento.

O ofício de pedra-sabão possui um inventário realizado no ano de 2012, que conta o histórico desse saber fazer e uma descrição do mesmo. Também relacionado ao largo, é possível encontrar no Acervo da Secretaria de Patrimônio de Ouro Preto os inventários da Igreja de São Francisco de Assis e da Casa de Gonzaga, ambos com históricos intimamente ligados ao espaço.

A proposta de fazer esse inventário partiu de um interesse sobre o desenvolvimento arquitetônico e paisagístico, e formas de apropriação do espaço público, evocado pelo movimento pelo reconhecimento da Feira de Artesanato em Pedra-Sabão. Foi encontrado um grande acervo histórico e iconográfico, como também pesquisas já realizadas sobre a Feira de Artesanato e o largo de Coimbra, que abrangiam aspectos econômicos, turísticos, alguns mais específicos sobre a Feira de artesanato, mas ainda não abrangendo o largo como um todo e sua inserção num contexto de tombamento e reconhecimento cultural, arquitetônico e paisagístico.

Dessa forma obteve-se um inventário de toda extensão dentro da área que foi delimitada do largo. A aplicação do inventário, para além de um instrumento técnico de reconhecimento, torna possível, através dele, subsidiar tomadas de decisão, para ações de políticas públicas. Na sequência apresenta-se parte do inventário, elaborado como fruto do estudo e pesquisa, esse caracteriza paisagístico e fisicamente o largo de Coimbra.

Inventário do acervo urbanístico e arquitetônico

Largo de Coimbra, Ouro Preto MG

Informações gerais

Mesorregião: Metropolitana de Belo Horizonte (IBGE, 2010)
Microrregião: Ouro Preto (IBGE, 2010)
Município: Ouro Preto (Distrito Sede)
Bairro: Centro
Logradouro: largo de Coimbra, s/n°

Mapa de Localização do largo de Coimbra
Imagem divulgação [Google Earth]

 

Localização

O largo de Coimbra situa-se no Distrito Sede do Município de Ouro Preto, no limite entre os bairros Centro e Antônio Dias, estando assim inserido no perímetro de tombamento. Conforme zoneamento urbanístico que define a forma de ocupação, parcelamento e uso do solo (Lei Complementar Nº 93), está dentro da Zona de proteção especial (ZPE) que compreende áreas que contem valores a serem preservados nos conjuntos urbanos, com traçados e tipologias arquitetônicas e paisagísticas conservados que formam a imagem do lugar. Também, conforme Portaria n°312 do Iphan, encontra-se na Área de Proteção Especial 01 (APE-01), que corresponde ao núcleo de maior concentração de bens de interesse cultural, compreendida pelo arruamento de origem setecentista ou que guarda relação com este, áreas verdes de interesse paisagístico, bens e obras de arte tombados isoladamente, com edificações de construção de diferentes períodos. Em ambos os casos, tem-se diretrizes e normativas especificas para intervenções urbanísticas e arquitetônicas.

O bairro em que se insere o largo é composto por um acervo arquitetônico de tipologias desde o século 18 até o 21, sendo em sua maioria compreendida no período colonial, com tipologia típica do período, elementos e técnicas tradicionais que lhe são característicos. É possível encontrar também exemplares e elementos arquitetônicos do período eclético, além das tipologias presentes na atual Feira de Pedra-Sabão.

Ressalta-se como contexto do largo de Coimbra a proximidade à praça Tiradentes e a delimitação do espaço por construções dos estilos arquitetônicos colonial, barroco e eclético, destacando-se, respectivamente, a Casa de Gonzaga, a Igreja de São Francisco de Assis e a Pousada do Mondego. Nota-se nas proximidades do largo uma predominância de usos comerciais e mistos, principalmente no bairro Centro, sendo o uso residencial mais presente no bairro Antônio Dias.

Caracterização

O largo de Coimbra constitui um amplo espaço de 1.931 m² que compreende três setores identificáveis. Ao analisar do acesso pela rua Cláudio Manoel, tem-se a direita um talude com canteiros gramados. Ali encontra-se, entre muros de quartzito, um singelo chafariz em pedra na forma de meio círculo, com uma bica, em cano de aço, de água corrente. Analisando iconografia referente ao largo, é possível estabelecer sua data provável de construção no final do século 19, por volta do ano de 1894, junto à construção do Mercado que ali existiu.

No gramado, observa-se a existência de peças ornamentais de pedra (essas são utilizadas como mobiliário por quem ali passa) dispostas em sua extensão, e também de três palmeiras Phoenix.

O segundo setor compreende o leito carroçável, ao centro do largo. Esse, como quase a totalidade de seu entorno, é pavimentada por paralelepípedos de forma retangular, dispostos perpendicularmente ao fluxo de veículos – que se dá nos dois sentidos.

O terceiro setor que se pode constatar é um alteamento à esquerda (tendo por referência a visada a partir da rua Claudio Manoel) pavimentado por placas de quartzito irregulares onde se localiza a feira de Artesanato em Pedra-sabão, popularmente chamada de “feirinha”. Essa composta por duas tipologias de barracas, “bancadas” e “boxes”, dispostas, as primeiras ao centro do espaço e as segundas circundando a área seguindo um desenho em “L”.

Inventário do acervo urbanístico e arquitetônico do Largo de Coimbra, Ouro Preto MG
Imagem divulgação [Prefeitura Municipal e Ouro Preto]

Infraestrutura

A iluminação do largo é, assim como de grande parte do centro tombado, composta por luminárias fixadas em muros e fachadas das edificações ali existentes, sendo que na área da Feira, observa-se a existência de postes de iluminação. Contudo, ao analisar essa iluminação à noite, constata-se que é insuficiente para o espaço do alteamento, não favorecendo a possibilidade de um funcionamento após o anoitecer.

O largo não possui bocas de lobo para drenagem pluvial. Por ter leve inclinação, as águas da chuva escoam para as ruas Cláudio Manoel e São Francisco, laterais ao espaço, e o calçamento em paralelepípedos auxilia na absorção da água, por ser um pavimento semipermeável.

É possível encontrar poços de visita e inspeção da Companhia Energética de Minas Gerais S.A. (Cemig) e do Serviço Municipal de Água e Esgoto de Ouro Preto (Semae) ao longo da área analisada.

A feira de Artesanato em Pedra sabão é provida de energia elétrica, contendo dois padrões e a instalação é composta por eletrodutos de PVC aparentes, fixados ao muro limítrofe do largo.

É valido destacar que o largo tem uma via de mão dupla e possui um grande fluxo de veículos, inclusive de ônibus. É possível notar pontos de afundamento do calçamento, provavelmente causado pelo alto tráfego.

Paisagem observada a partir do alteamento onde se encontra a feirinha
Foto Reginaldo, 2017

Mobiliário urbano

Os canteiros com as peças em pedra são utilizados como local de descanso e apreciação da paisagem. Esses canteiros são mantidos principalmente pelos proprietários da Pousada do Mondego, atualmente encontra-se em bom estado de conservação. Outro mobiliário presente no local é o chafariz do tipo singelo, embutido no talude, entre muros de pedra.

Na via localiza-se um ponto de ônibus (sem cobertura) que abrange diversas linhas da cidade e há também um ponto de táxi, que atualmente conta com três taxistas. Na entrada do largo pela rua Cláudio Manoel, encontra-se um totem informativo, com breve história do local e indicação de importante marcos históricos da cidade. Também, têm-se diversas placas de trânsito ao longo da via.

Anteriormente no largo de Coimbra, no século 18, foi construído um chafariz tipo singelo em pedra com um grande tanque ao centro desse espaço. Esse mobiliário urbano, com a substituição do antigo Mercado de Tropeiros pelo Mercado Municipal, foi removido e não foi encontrado registro da condição de remoção ou da destinação dada a ele. Analisando iconografia do final do século 19, foi possível constatar que o chafariz atual foi, provavelmente, construído nesse período, presumindo-se tratar uma forma de reposição do antigo chafariz. O chafariz foi construído em pedra em forma de “C” nas dimensões (205x127x208)cm, possui revestimento e pintura na cor branca. Diferentemente dos demais chafarizes da cidade, este não possui ornato na bica, a existente consiste em um cano em aço (Ø25mm) com comprimento de 30cm, sem registro, de vazão constante. Esse mobiliário é utilizado pelos expositores da “feirinha”, por taxistas e várias pessoas que ali transitam e aparenta ser potável.

Vista frontal do chafariz
Foto Tayami Fonseca França, 2018

Usos atuais

Além da Feira de Artesanato, outras atividades ocorrem no espaço do largo. É possível encontrar pintores, desenhistas e outros artesãos que usam do espaço para expor e vender sua arte – principalmente próximo à Pousada do Mondego e à escada da rua Amália Bernhaus. Há também, durante a Semana Santa, a utilização do adro da igreja de São Francisco para cerimônias religiosas e confecção de tapetes devocionais ao longo do leito carroçável do largo.

Feira de Artesanato em pedra-sabão

O distrito de Santa Rita é o principal da região relacionado a produção em pedra-sabão. Inicialmente somente extratora do material, na virada do século 19 para o 20, passou a ter fabrica artesanal de panelas e hoje fabrica diversos produtos. Após o reconhecimento pela Unesco, em 1980, da cidade de Ouro Preto como Patrimônio Mundial, essa ingressou no panorama turístico a nível internacional, o que favoreceu o mercado de pedra-sabão. Então a produção artesanal com esse material assumiu nova dinâmica, devido à maior demanda, com diversificação dos produtos que passaram a ser comercializados no distrito Sede. Os produtos comercializados atualmente na Feira são, em sua maioria, artesanatos da matéria-prima pedra-sabão, com maior parte originadas do distrito de Santa Rita, onde é realizada a extração do material e produzidas peças “cruas”, utensílios e esculturas. Na feirinha parte desses produtos são detalhados (“bordados”) por artesãos e outras são apenas comercializadas. É possível encontrar também artesanatos de outros materiais – como tecido, cerâmica, madeira e couro – e objetos em prata, bijuterias, minerais, pedras preciosas e peças de vestuário personalizadas. A Feira conta hoje com 74 expositores membros da Associação dos Expositores do largo de Coimbra (Adelc), fundada em 1999.

Vista parcial da Feira de Artesanato em Pedra-Sabão
Foto Tayami Fonseca França, 2018

Feira de Pedra Sabão – Tipologias das barraquinhas

A feira de Artesanato em Pedra sabão conta um total de 66 barraquinhas com três tipologias básicas que apresentam pequenas variações de dimensão e materiais.

A primeira, encontrada circundando o espaço em forma de “L” aqui foi denominada tipologia “box”. Essas são constituídas em sua maioria por metal e madeira, possuem instalação elétrica e abertura na parte posterior. Essa tipologia corresponde a 30% do total de “barraquinhas”.

A segunda é a tipologia “bancada” que corresponde a 68% do total existente. Essas são encontradas ao centro do espaço, dispostas em fileiras no sentido longitudinal e transversal do espaço, gerando assim corredores estreitos.

Corresponde a um tipo de bancada escalonada, possuindo de 2 a 3 níveis de prateleiras, a maioria possui as “sombrinhas” de lona com altura aproximada de 2,10m; as que não possuem, são cobertas por plástico quando necessário. Há uma variação de materiais utilizados, sendo esses: madeira, pedra e metal.

A terceira tipologia é uma exceção. É resultado da junção do espaço ocupado por duas barraquinhas da tipologia “box” pertencentes a dois irmãos. Trata-se de uma estrutura em madeira, sem fechamento, com cobertura em telha plástica em estilo colonial.

Tipologias “box”, “bancada” e “box duplo”
Elaboração Tayami Fonseca França, 2018

Considerações finais

Os dados levantados nessa pesquisa, ainda se limitaram aos aspectos materiais e históricos do largo de Coimbra. Logo, uma maior e mais aprofundada análise interdisciplinar deve ser realizada, incorporando também pesquisa sociológica, que identifique os reais valores e atribuições de significados pelos diversos grupos envolvidos, que se incorporam e são incorporados, numa relação dialética de memória e identidade. Torna-se necessário investigar diversos grupos, incorporando pesquisas sociais junto aos feirantes, artesãos, moradores e turistas.

Esse estudo possibilitou um (re)conhecimento maior desse largo em Ouro Preto com a criação de um inventário do lugar, contribuindo para difusão de sua memória. Espera-se instigar novos estudos sobre esse espaço e suas aproximações com a dinâmica da cidade e suas vivências.

Vista parcial do largo de Coimbra
Foto Tayami Fonseca França, 2018

notas

NA – Este artigo é oriundo de um trabalho final de graduação em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Ouro Preto sob orientação do Prof. Dr. Bruno Tropia Caldas e co-orientação da Profª. Dra. Fernanda Alves de Brito Bueno. Parte desse estudo foi publicada nos Anais do Congresso Mineiro de Direito do Patrimônio Cultural: I Fórum de Capacitação de Agentes Municipais de Fiscalização do Patrimônio Cultural, 2018.

1
VASCONCELLOS, Sylvio de. Vila Rica: Formação e desenvolvimento – residências. São Paulo, Perspectiva, 2011.

2
MARX, Murillo. Cidade brasileira. São Paulo, Melhoramentos, 1980.

3
BUENO, Fernanda Alves de Brito. Entre o Sagrado e o Profano: aspectos da Paisagem Cultural de Ouro Preto. Anais do XVII Enanpur, São Paulo, FAU USP, 2017. p. 13.

4
CABRAL, Henrique Barbosa da Silva. Ouro Prêto. Belo Horizonte: [s.n.], 1969.

5
MAGALHÃES, A. O mercado. Tribuna de Ouro Preto, Ouro Preto, 28 out. 1945, p. 4 <http://memoria.bn.br/pdf/767140/per767140_1945_00012.pdf>.

6
Idem,ibidem.

7
CMOP. Livro de registro de contratos e arrematações entre 1927-1959. Série contrato. Cx. 30. L05. Ouro preto: 1927-1959. Acervo do Arquivo Público Municipal de Ouro Preto.

8
SIMÃO, Maria Cristina Rocha. Preservação do patrimônio cultural em cidades. Belo Horizonte, Autêntica, 2006. p. 23-60.

9
BAREL FILHO, Ezequiel. Lúcio Costa em Ouro Preto: a invenção de uma "cidade barroca". Dissertação de Mestrado. Coimbra, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2013.

10
CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio cultural: conceitos, políticas, instrumentos. São Paulo/Belo Horizonte, Annablume/IEDS, 2009, p. 148.

11
Idem, ibidem.

12
TÁRCIA. Christina. A Feira. Jornal Ouro Preto, Ouro Preto, n. 191, 17 mar. 2011.

13
Transcrição da citação MIRANDA. 2016, p. 51 apud ADELC. [Carta] 17 out. 2017, Ouro Preto [para] ASTONI, Z., Ouro Preto. 4f. Solicitação de abertura de processo para registro de patrimônio imaterial na categoria de Lugar.

14
ADELC. [Carta] 17 out. 2017, Ouro Preto [para] ASTONI, Z., Ouro Preto. 4f. Solicitação de abertura de processo para registro de patrimônio imaterial na categoria de Lugar.

15
COMPATRI. Relatório de Atividades Comissão de Apreciação do Pedido de Registro como Bem Cultural na Categoria de Lugar da Feira de Artesanato do largo de Coimbra/2018. Ouro Preto, 2018.

16
NORA, Pierre et al. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História, Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados de História, v. 10, 1993.

17
Idem, ibidem.

18
CASTRIOTA, Leonardo Barci. Op. cit.

19
Idem, ibidem, p. 145.

20
GONÇALVES, José Reginaldo. Antropologia dos objetos: coleções, museus e patrimônios. Rio de Janeiro, Garamond, 2007.

21
CHOAY, Françoise. A Alegoria do Patrimônio. São Paulo, Editora Unesp, 2001.

22
Idem,ibidem, p. 145.

23
MENESES, José Newton Coelho. História & turismo cultural. São Paulo, Autêntica, 2013.

24
Idem, ibidem.

25
CASTRIOTA, Leonardo Barci. Op. cit.

sobre a autora

Tayami Fonseca França é arquiteta e urbanista pela Universidade Federal de Ouro Preto. Atua na área de projetos arquitetônicos principalmente dentro de cidades históricas, como também na área de conservação e restauração de bens culturais. Participa de eventos com temática do patrimônio cultural. Atualmente está em processo de formação no curso de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis pela Faop MG.

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