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drops ISSN 2175-6716

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Na ocasião em que Cuba e Estados Unidos reatam relações diplomáticas e o fim do embargo econômico passa a ser uma possibilidade concreta, o texto de Gabriela Orlandi torna-se interessante balanço desta relação tumultuada.

how to quote

ORLANDI, Gabriela. Cuba. O dia em que a terra parou. Drops, São Paulo, ano 15, n. 087.03, Vitruvius, dez. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/15.087/5364>.



Do dia 25 de dezembro de 2013 ao dia 02 de janeiro de 2014 consegui riscar um item da minha lista de coisas a fazer antes de morrer: visitar Cuba, o país de um dos maiores líderes revolucionários que o mundo já conheceu. Depois de leituras e conversas de bar infindáveis, as opiniões divergem. O regime comunista cubano funciona ou não? Você se fosse um médico residente em Cuba, escolheria ser transferido para o Brasil?

Nos primeiros anos de escola cria-se um primeiro contato com o comunismo que rege a cabeça dos maiores sonhadores do século 20. Em seguida, o cursinho bate mais forte nessa tecla e coloca as idéias na centrífuga. Utopia ou realidade mal feita? Durante uma aula de história no Anglo Sergipe, um grande professor conta: “Quando o pai de meu amigo descobriu as atrocidades de Stalin durante a URSS, ele permaneceu três dias no quarto sem comer, dizer ou fazer qualquer coisa”. Ao chegar em casa pergunto a meu pai, vulgo politécnico bancário geração Baby Boomers, sobre minhas alfaces secas na centrífuga. Ele me diz: “quem nunca sonhou, nunca foi comunista; quem é ainda hoje, é ignorante.

Quando pisei em Havana, o que senti foi a brisa do clima perfeito. Nem muito quente, nem muito frio, como os melhores dias de verão brasileiro. Os carros da década de 1950, uma arquitetura colonial depredada e banners de “VivaLa Revolución!” e “Bloqueo: el genocio más largo de la historia”. Quando juntei o dinheiro da viagem me disseram para levar Euros e somente Euros, uma vez que os dólares são malvistos – afirmação que meu pai retrucou dizendo: “se você levar seu tênis e abanar em praça pública pode ter certeza que você não vai morrer de fome”.

Lá existem duas moedas: o peso cubano e o peso cubano conversível. O segundo, usado pelos turistas, é 26 vezes mais caro que o primeiro, usado pelos cubanos. Logo, foi uma grande sorte conhecer o estudante de medicina que comprou charutos para nós por 18 euros ao invés de 200: a simpatia das pessoas é uma coisa de outro mundo. Todos os dias encontrávamos alguém que nos apresentava Havana e falava pelos cotovelos.

Importante ressaltar que naquele momento estava no ar “Avenida Brasil”, novela brasileira de 2013, recorde de audiência. Quem assistiu entende que lá, o desenrolar de Carminha e Nina era assunto de estado. A aflição se agrava com a programação cubana: um dia, novela regional, noutro, brasileira. Entre amigos e conhecidos, alguns esperavam um “presentinho” simbólicos pelas informações fornecidas ou, então, cremes hidratantes, roupas ou ainda capinhas de Iphone.

Não se vê mendigo nas ruas ou malabarismo no farol. O poder de compra não vale muito, uma vez que os produtos são extremamente escassos para começar. Não existe concentração de renda. Um americano professor da Universidade de Berkeley, Robert R. Reich, economista que trabalhou como secretário do trabalho na gestão de Bill Clinton, escreveu um livro chamado Aftershock, no qual comprova como os maiores índices de concentração de renda nos EUA coincidem com o estopim da crise de 1929 e da recessão de 2008. As necessidades básicas dos seres humanos são as mesmas e mesmo o mais extravagante dos empresários, que gasta a quantia mais despudorada de seu salário, ainda não gasta o suficiente para girar a economia. Os verdadeiros “Job Creators” são os americanos de classe média, porque estes sim, adquirindo poder de compra, fazem o ciclo funcionar. Em poucas palavras, a concentração de renda em excesso tem como conseqüência em longo prazo a crise econômica. Hoje, Reich mostra, a taxa de ascensão social nos EUA é extremamente baixa.

No Brasil, a taxa de desemprego registrada atualmente é de 4,8% após a mínima histórica de 4,3% registrada em dezembro de 2013. Em Cuba, a taxa hoje é de 3,3% e o registro mínimo é de 1,6%. O Brasil se encontra na 84º posição no Ranking do IDH. Cuba está na 51º posição. Vá acompanhando, uma vez que estou simplesmente jogando dados. De acordo com o IBGE, a expectativa de vida no Brasil em 2012 foi de 73,8 anos e a de Cuba 79,2 anos. Em2010, apopulação com acesso a rede sanitária foi de 79%. Em Cuba, 91%. Em2009 aUnesco afirma que a educação cubana é a maior da América Latina. Durante estudos realizados com os alunos, 70% dos estudantes mostraram qualificações de mais de 350 pontos em um total de500. Amédia na Argentina, Uruguai e Chile foi de 300 pontos. O Brasil ficou ao lado do México com 250 pontos. Em Cuba existem hoje 6,4 médicos para cada mil habitantes. Na Argentina a proporção cai para 3,2 médicos. Na Espanha e Portugal a relação é de 4 médicos. No Brasil, 1,8 médicos para mil habitantes.

Acredita-se que atualmente a tensão Cuba-EUA está próxima do fim. A ilha está passando por um processo cada vez maior de abertura e é visível que os diques não vão conter as águias por muito mais tempo. Há pessoas, como o cubano Henry Vergara Negrin, que enfrentam o Estreito da Flórida para exercer seu direito de ser o que bem entende. Alguns querem um Aston Martin e outros, apenas um par de sapatos.

O primeiro pensamento socialista – de Fourier, Louis Blanc e Saint-Simon – foi denominado utópico por posteriores marxistas, uma vez que não explicava como atingir a sociedade ideal proposta. As maiores experiências comunistas do mundo vêm com marcas de ditadura, repressão e genocídio. E finalmente: Cuba é melhor ou pior? E eu respondo: comparado com o quê? Fica difícil chegar a um consenso quando vivo em um país em 3º lugar no ranking mundial de desigualdade social.

nota

NA – Publicação original: ORLANDI, Gabriela. Cuba. O dia em que a terra parou. P’atuá’, São Paulo, n.1, Alunos FAU Mackenzie, nov. 2014. O jornal P’ATUA’ surgiu como uma iniciativa de estudantes da FAU Mackenzie e publicou sua primeira edição no mês de novembro de 2014. Atualmente, se posiciona como um grupo independente, sem representatividade estudantil e que busca construir outra vertente de expressão através das publicações, um ambiente que atue como amplificador e catalisador de ideias, teorias, ações, contradições e discussões.

sobre a autora

Gabriela Orlandi é estudante da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, FAU Mackenzie.

Havana, Cuba
Foto André Marques

Havana, Cuba
Foto André Marques

 

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