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interview ISSN 2175-6708

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A entrevista com Otília Arantes parte do livro “Berlim e Barcelona” e fornece chaves de leituras para discutir o papel do urbanismo contemporâneo, dos novos atores, da crise da forma urbana e as grandes transformações a partir dos grandes eventos.

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RETTO JR., Adalberto. Entrevista com Otilia Arantes. Entrevista, São Paulo, ano 14, n. 056.02, Vitruvius, out. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/14.056/4911>.


Edifício infraestrutural, Rio de Janeiro, 1929. Arquiteto Le Corbusier
Fundação Le Corbusier [SEGRE, Roberto. "Ministério da Educação e Saúde", Romano Guerra, 2013]


Adalberto da Silva Retto Jr: No início do século 20 temos uma intensa circulação de ideias, modelos e profissionais, do mesmo modo, a partir dos anos 1980, afirma-se outro fluxo de arquitetos e urbanistas que trabalharam como consultores, tomando como referência cidades como Barcelona, entre outras. Do ponto de vista profissional, do Urbanismo Moderno ao Planejamento Estratégico, o que foi alterado?

Otilia Arantes: Acho que não podemos generalizar o que ocorreu especificamente com Le Corbusier, a partir dos anos 1920, chamado por vários governos para realizar projetos arquitetônicos ou urbanísticos, ou mesmo assessorar arquitetos locais, como foi o caso, no Brasil, na década de 1930. Arquiteto de projeção internacional, com muitos textos-manifestos publicados e figura de proa dos CIAMs, teve, realmente, um papel muito importante na difusão da arquitetura moderna, tendo sido um dos autores da plataforma da cidade funcional (ou das suas versões, sendo a mais difundida a de 1933). Além disto, a política de tabula rasa que propunha e de modelos urbanos padronizados (como no Plan Voisin) só podiam ser cogitados por governos fortes, em geral do terceiro mundo, por assim dizer predispostas a correr os riscos de tais intervenções drásticas, ou, em pleno auge de expansão capitalista, como os Estados Unidos. Poucos deles aliás executados, mas que deixaram discípulos pelo caminho – a nossa AM certamente não teria sido o que foi se não fossem as passagens do arquiteto franco-suíço por aqui. De outro lado, é preciso pensar nas lições dos mestres da Bauhaus. Muitos deles, e a própria escola, com a ascensão do nazismo, acabaram migrando para os Estados Unidos. Ali construíram e deixaram um padrão de arquitetura que logo se tornaria o chamado Estilo Internacional, mais adiante exportado por seus anfitriões como se fosse expressão americana genuína, sendo o exemplo máximo Mies Van der Rohe, não por acaso com o famoso Seagram’s. Foi quando a arquitetura de aço e vidro passou a dominar os grandes centros empresarias mundo afora. No que tange o urbanismo, intervenções a la Robert Moses, também fizeram escola –, mas aí, a responsabilidade não será mais tão diretamente dos mestres ou das lições dos CIAMs. Dos anos 1920 aos 1950 tivemos um período indiscutivelmente dominado, no plano das ideias arquitetônicas e urbanísticas, pelos Modernos. Creio ser desnecessário recapitular a pauta de uma arquitetura que se pretendia maximamente racional e cujo ideal construtivo estava totalmente sintonizado com o seu tempo – o de uma utopia técnica do trabalho, e que, uma vez destroçada, foi dando lugar a um formalismo extremado que logo se exauriu, sendo substituído por outras expectativas mais adequadas às novas formas de produção capitalista do espaço, na origem de novas concepções de arquitetura e de urbanismo.

Deixando de lado o período de transição, especialmente nos anos 1960/1970, pulo para o Planejamento Estratégico, resultado de uma concepção de cidade-empresa, ou ainda, de cidade como “máquina de crescimento”. Em primeiro lugar, nada a ver com a circulação dos Modernos e de suas ideias – a convite ou forçados –, com os escritórios de consultoria criados a partir do momento em que as cidades começaram a ser concebidas como empresas a serem otimizadas. Utilizando minha comparação no texto de abertura do livro citado no início por você sobre Berlim e Barcelona – “Gentrificação estratégica” –, se nos reportarmos à cidade-máquina moderna, a mudança de postura dos gestores urbanos e dos próprios urbanistas não deixa de ser espantosa: quando um moderno propunha uma cidade segundo o modelo de linha de montagem fordista, tinha em mente antes de tudo a presumida racionalidade construtiva de tal processo e ficaria sinceramente chocado se lhes fosse exposta a dura verdade de sua funcionalidade sistêmica por assim dizer de nascença. Hoje, o que poderia ter sido motivo de escândalo – a revelação da mercadorização integral de um valor de uso civilizatório como a cidade – tornou-se razão legitimadora ostensivamente invocada. Atualmente o urbanismo não vem mais para corrigir, mas para incrementar a proliferação urbana, para otimizar a competitividade das cidades, todo o vocabulário aliás é nitidamente empresarial. E se trata não apenas de gestão urbana like business, mas for business. Na origem desta virada, “as cidades-empresas” americanas dos anos 1970 (na denominação de Peter Hall, em Cidades do amanhã, de 1988), ou seja, os processos urbanísticos adotados de início por James Rouse em Baltimore, de cuja cidade era prefeito, e logo em outras muitas cidades americanas – não esqueçamos que é também o exemplo adotado por Harvey para diagnosticar esta inflexão em Condição pós-moderna, só que pondo a ênfase na espetacularização urbana, essencial aliás, neste processo de valorização das cidades. Lembro também que a prefeitura de Barcelona – que nos concerne mais de perto – mantinha intercâmbio com Rouse desde ao menos 1982 e o chamou como assessor na fase pré-olímpica, em 1989, especialmente para a transformação de seu maior projeto e vitrine à época – o Moll de la Fusta (o porto antigo) –, chegando a contratar a sua empresa para levá-la a efeito.

Em síntese, nas palavras de Hall, o que vemos acontecer é uma nova elite financeira tomando efetivamente posse das cidades, liderando uma coalizão pró-crescimento que habilmente manipula o apoio público e combina fundos públicos e privados com a finalidade de promover uma urbanização comercial em grande escala. Ou ainda, como definiram John Logan e Harvey Molotch (já em 1976 e exposto por extenso em 1987) a cidade, enquanto growth machine, resulta da coalizão da elite, centrada na propriedade imobiliária e seus derivados, mais uma legião de profissionais caudatários de um amplo arco de negócios decorrentes das possibilidades econômicas dos lugares, com o intuito de expandir a economia local e aumentar a riqueza. O apoio da população, no afã de se projetar e consequentemente competir pelos investimentos em plano internacional, é um elemento importantíssimo e bastante reivindicado pelos catalães ao dar forma ao “planejamento estratégico” de exportação (apresentado no Habitat de 1996). A fabricação de consensos em torno do crescimento a qualquer preço – a essência mesmo de toda “localização” – torna-se a peça chave de uma situação de mobilização competitiva permanente para a batalha de soma zero com as cidades concorrentes. Uma fábrica por excelência de ideologias, portanto: do território, da comunidade, do civismo, etc. No coração dessas coalizões, a classe rentista de sempre, hoje novamente na vanguarda dos “movimentos urbanos”: incorporadores, corretores, banqueiros etc., escorados por um séquito de coadjuvantes igualmente interessados e poderosos, como a mídia, os políticos, os promotores culturais, as empresas esportivas, etc. sem deixar de mencionar, claro, os próprios arquitetos e planejadores urbanos (que “de guarda caça se transformavam em caçadores furtivos” – Peter Hall – ou nem tão furtivos..., podemos dizer, passados mais de 20 anos).

Operação Urbana Eixo Tamanduatehy, Santo André, 2007
Divulgação [Prefeitura de Santo André]

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Conversa com Carlos Pardo

Mariana Wilderom

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