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interview ISSN 2175-6708

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português
A arquiteta portuguesa Ana Vaz Milheiro entrevistou João Filgueiras Lima, Lelé, em setembro de 2010, em Lisboa, focando suas perguntas em temas fundamentais do arquiteto: técnica, papel do arquiteto, relação arte-arquitetura, ecologia e sustentabilidade.

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MILHEIRO, Ana Vaz. Técnica sem abrir mão da beleza: notas sobre ser arquiteto. Entrevista com João Filgueiras Lima, Lelé. Entrevista, São Paulo, ano 19, n. 073.02, Vitruvius, fev. 2018 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/19.073/6891>.


Elevadores em plano inclinado produzidos pelo Centro de Tecnologia da Rede Sarah – CTRS e instalados no Hospital do Aparelho Locomotor de Salvador
Foto Nelson Kon [LELÉ, João Filgueiras Lima. Arquitetura. Uma experiência na área de saúde.]

Ana Vaz Milheiro: É por isso que criou o Instituto Brasileiro de Tecnologia do Habitat (3) em Salvador?

João Filgueiras Lima, Lelé: Tem de haver um estímulo. Agora nessa equipe do IBTH, que é multidisciplinar, temos de criar as lideranças, e isso tem de ser multiplicável. E para isso temos de ter uma estrutura que permaneça durante muito tempo e que se amplie, que consiga manter esse mecanismo crescente.

AVM: Tal como encarou a profissão, acha que um arquiteto pode traçar um caminho independente das grandes corporações, das grandes construtoras, dos grandes interesses econômicos?

JFL/L: Eu acho que essa é a missão do arquiteto. Mas não sei se tem interesse, porque além de ser um sacrifício muito grande, o processo é muito difícil de enfrentar, principalmente quando você se tem de confrontar com o sistema que está montado. Hoje em dia, a construção civil é que ajuda nas eleições. O processo eleitoral está corrompido, muito corrompido, pelas grandes empresas de construção civil. No Brasil, praticamente todas as empresas que financiam as campanhas são da construção civil. O que torna o arquiteto muito dependente dos sistemas construtivos tradicionais. E se as construtoras não querem mudar o seu sistema construtivo, os governos também não vão mudar porque dependem delas para se reelegerem. É um ciclo vicioso muito difícil de desfazer. Mas se você der lucro para as construtoras é possível atuar através das construtoras.

AVM: É um pouco isso o que estão a tentar fazer agora com a Usiminas?

JFL/L: Exatamente. A Usiminas precisa de ampliar mercado interno no Brasil, precisa de um sistema que seja racionalizado, que empregue o aço e não o desqualifique. Se você ‘veste’ o aço de uma forma muito precária, você acaba desqualificando o próprio aço. Os responsáveis da empresa sentiram que estavam colocando um material nobre no mercado da construção, e depois desqualificando-o com uma roupagem de péssima qualidade.

AVM: Então desafiaram o Lelé para encontrar um sistema?

JFL/L: Sim. Eu acho que é uma questão que se colocou de forma muito peculiar, e é possível encontrar essas brechas para atuar através dessas empresas. Dentro do sistema atual, eu acho que só assim é possível ao arquiteto encontrar oportunidades. Fora do contexto empresarial os governos estão absolutamente desinteressados nesse estímulo. O Governo do Estado da Bahia financiou um terreno, uma cessão de uso por vinte anos para montarmos a nossa fábrica, isso graças a um relacionamento pessoal. Mas normalmente os governos estão muito mais interessados nas grandes empresas que depois vão permitir que se reelejam.

Modelo de cama-maca produzida pelo Centro de Tecnologia da Rede Sarah – CTRS
Foto divulgação [LELÉ, João Filgueiras Lima. Arquitetura. Uma experiência na área de saúde.]

AVM: E também porque a proposta que vocês fazem é de intervenção pontual, e não de grande transformação, digamos assim.

JFL/L: Mas pode ser de grande transformação. É que o sistema está tão bem montado, que o próprio Tribunal de Contas, quando vê alguma coisa que possa prejudicar as grandes empresas, rejeita-a. Nós somos rejeitados até pelo Tribunal de Contas, apesar de fazermos mais barato. Para exemplificar, atualmente, na Prefeitura de Salvador, existem projetos de escolas e de hospitais, que se chamam UPAs (Unidades de Pronto Atendimento), criados pelo presidente Lula (Luis Inácio Lula da Silva). Uma firma americana produz os componentes pré-fabricados, todos metálicos, pelo que já ganharam no Brasil o apelido de ‘hospitais de lata’. Foi criado um sistema de leasing para as construtoras usarem esses componentes, que têm como característica principal uma montagem muito rápida, que nós com o nosso processo também podemos fazer. Mas o custo de cada unidade dessas no Brasil está pela ordem dos 4.000 reais por metro quadrado. O nosso sistema iria custar 1.700 reais por metro quadrado. São prédios sofisticados. Mas não conseguimos, o próprio Tribunal de Contas foi contra, porque isso atenta contra o sistema montado. E veja, não há concorrência para fazerem esses prédios. É um contrassenso, mas é a realidade.

AVM: Estamos completamente cerceados, pela regulamentação, pelas grandes empresas de construção, pelos grandes grupos econômicos, com determinados interesses. Enfim, os arquitetos ou fazem aquela arquitetura eterna de que Lelé falava há pouco, mais icónica ou mais espetacular, ou então parecem estar um pouco limitados nas suas opções. Até que ponto um arquiteto pode ser hoje independente do sistema?

JFL/L: Eu acho difícil. Por exemplo, a oportunidade que foi criada na minha vida profissional foi essa de que eu falei antes. É uma brecha, senão não teria feito essas experiências todas que fiz, e acho que existe uma série de outras brechas que o sistema sempre deixa para nós atuarmos. Mas, me parece que cada vez o controlo está sendo maior, e as oportunidades estão a afunilar-se.

nota

3
Segundo André Marques, “na sua trajetória, o arquiteto João Filgueiras Lima teve oportunidade de estar à frente das seguintes unidades de produção de componentes arquitetônicos:

Renurb – Companhia de Renovação Urbana de Salvador (1978-1981);
Fábrica de Escola, Abadiânia GO (1982-1984);
Fábrica de Escolas, Rio de Janeiro RJ (1984-1985);
Fábrica de Equipamentos Urbanos, Rio de Janeiro RJ (1984-1989);
Fábrica de Equipamentos Urbanos, Brasília DF (1985-1990);
FAEC – Fábrica de Equipamentos Comunitários, Salvador BA (1986-2002);
CIAC – Centro Integrado de Apoio à Criança, várias regiões do Brasil (1990);
FAEC – Fábrica de Equipamentos Comunitários, Ribeirão Preto SP (2002-2004);
CTRS – Centro de Tecnologia da Rede Sarah, Salvador BA (1991-2009);
IBTH – Instituto Brasileiro de Tecnologia do Habitat, Salvador BA (2010-2014)

[MARQUES, André Felipe Rocha. A obra de João Filgueiras Lima, Lelé: projeto, técnica e racionalização. Dissertação de mestrado. Orientador Abilio Guerra. São Paulo, FAU Mackenzie, 2012, p. 58].

Produção do veículo para tráfego externo, Centro de Tecnologia da Rede Sarah, Salvador BA
Foto divulgação [LELÉ, João Filgueiras Lima. Arquitetura. Uma experiência na área de saúde.]

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073.02
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073

073.01

A arte da montagem: técnica e lugar em Andrade Morettin

Lays Lucena Benjamin and Fernando Diniz Moreira

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