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my city ISSN 1982-9922

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ALBERTO, Klaus Chaves; TASCA, Luciane. Revisão da legislação urbana em Juiz de Fora: oportunidade de mudanças. Minha Cidade, São Paulo, ano 04, n. 048.02, Vitruvius, jul. 2004 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/04.048/2007>.


Vista panorâmica de Juiz de Fora


Praça São Mateus, Juiz de Fora

Vista noturna do rio Paraibuna, Juiz de Fora

 

A cidade de Juiz de Fora, neste ano de 2004, vê-se como palco de um processo de revisão de sua legislação urbanística mais significativa: as leis de Parcelamento do Solo (Lei 6908/86) e Ordenamento do Uso e Ocupação do Solo (Lei nº 6910/86). Tal processo vem provocando diversas polêmicas, como exemplifica o contexto diverso da elaboração das leis e o cenário urbano do município nos dias atuais.

As mensagens de alteração das leis que tramitavam na Câmara Municipal no início do ano eram focadas, principalmente, na revisão de números como os de coeficiente de aproveitamento, taxa de ocupação, modificação das atuais regras do sistema viário e dos espaçamentos, e metragens das construções. Estas mensagens receberam incisivas críticas dos membros das associações de moradores, de técnicos do IAB – núcleo Juiz de Fora, tendo sua maior foco na modificação dos coeficientes de ocupação do solo.

Assim, a sociedade organizada conseguiu movimentar a opinião pública para barrar o projeto de lei, e, em paralelo, a própria Prefeitura contratou, através de licitação pública uma empresa de Consultoria para adequar a legislação da cidade às mudanças atuais (1).

A responsabilidade destas revisões é notória, sabendo-se que estas leis interferem diretamente na tão consensual “qualidade de vida” que os juizdeforanos sempre defenderam. Da mesma forma, esse processo também pode representar as reais possibilidades entre viver e apenas sobreviver na cidade em que se habita.

A tarefa desta revisão é complexa. A última revisão aconteceu em 1986, ou seja, são 28 anos de experiência para se analisar e pensar uma nova proposta. Mas, nestas quase 3 décadas quantos temas urbanos novos não apareceram? Quantas questões, antes nebulosas e arriscadas, tornaram-se hoje claras para a sociedade? Meio-ambiente, estatuto da cidade, desenho urbano, eficiência energética, patrimônio, justiça urbana, gestão estratégica, são apenas algumas das questões que a lei anterior sequer considerava ou, quando muito, esboçava uns temerosos passos. Se ainda considerarmos as diferenças do contexto político, social e tecnológico deste início do século com os da década de 80 do século passado, podemos dimensionar a amplitude do debate que deve ser levado à cabo.

Como em qualquer campo técnico-científico, não se pode desconsiderar as questões do campo da ciência Urbanismo, principalmente em sua história recente a partir das décadas de 40 e 50 onde um novo tipo de planejamento despontou como metodologia corrente de trabalho. A partir da segunda grande guerra o urbanismo ampliou sua escala de trabalho – passando a envolver em seu contexto a questão do planejamento em escala regional, o que gerou aumento da complexidade dos problemas, que, aos poucos levou o desenho urbano a perder sua autonomia para as disciplinas de caráter sociais, econômicas ou simplesmente técnicas. O planejamento da cidade passou a ser dirigido por números, dados, estatísticas, grandes manchas de setorização e não mais pelo aspecto formal na pequena escala que ficou conhecida como a “escala da rua”. O autor português Lamas denominou este método de planejamento, afastado do desenho da forma da cidade, como “urbanística operacional” e o “planejamento burocrático” e o denuncia como um dos elementos contribuintes da crise urbana em que vivemos.

Atualmente, o campo do Urbanismo já entende a cidade em outros termos que não o da Urbanística Operacional que, de certa forma é o caráter da atual legislação urbana de Juiz de Fora. Neste artigo propomos apenas “ventilar” um dos principais aspectos que deve ser levado em consideração na revisão em andamento: o desenho da cidade.

A importância deste tema é notória bastando apenas entender que é a legislação, ou a falta dela, que “desenha” e, por conseqüência, fornece um caráter à cidade.

Cidades como Angra dos Reis (RJ), que oferecem clássicos exemplos do desconforto para os seus habitantes e visitantes, que são mais conhecidas por suas desventuras urbanísticas que por suas virtudes, bem podem nos mostrar a dimensão do risco que se corre com uma legislação precária e, muitas vezes, mesmo por uma falta de legislação.

Por outro lado, cidades que representam o prazer e o “bem” viver de seus habitantes possuem, entre outras virtudes, um caráter que reflete um esforço da lei em torná-la real. Podemos tomar como exemplo vários trechos de cidades como a Paris de Haussmann, que possui um dos mais belos exemplos de unidade tipológica que fornece coerência para a cidade, a Rambla de Barcelona, a estrutura de parques em Buenos Aires e, mais recentemente, em Curitiba.

É claro que as cidades medievais na Europa e as coloniais no Brasil não foram resultado de um planejamento no sentido tradicional do termo e mesmo assim são belas e agradáveis, mas é fácil comprovar que deixar a tarefa de construção da cidade somente para o tempo e para a sociedade (sem uma mediação direta do governo através de uma legislação adequada) seria uma grande irresponsabilidade bastando para isto observar o fracasso da esmagadora maioria das cidades brasileiras que seguiram esta fórmula.

Vale aqui observar que, ao contrário do que ocorre na legislação atual, a cidade pode e deve ser pensada de maneira mais diversa, não como um todo único. Os vários bairros que a compõem devem ter “personalidades” diferenciadas, com o risco de se querer vestir uma uniforme de tamanho único em pessoas de distintos tamanhos e gostos.

Esta forma de legislar cada bairro, ou unidade morfológica, pode ser desenvolvida de forma a valorizar suas virtudes intrínsecas (seja topografia, arborização, um lago...) ou mesmo de forma a melhor atender às necessidades do bairro em relação à cidade como um todo. Um bairro com as edificações em altura definida postas de forma geminada, uma avenida com edificações isoladas por jardins umas das outras, uma praça cercada de edifícios de apenas 4 pavimentos que conformam seus limites, uma rua com árvores frondosas dos dois lados, todas as possibilidades de se criar uma urbanidade torna-se viável desde que haja um estudo caso a caso, seja na escala de um bairro ou mesmo de apenas um trecho deste.

São esses detalhes pequenos que constroem o caráter da vida urbana, que dão valor ao lugar e o tornam significativo para seus moradores. São estas peculiaridades que transformam nossas vidas e dão familiaridade aos espaços em que habitamos.

Em Juiz de Fora podemos observar vários espaços que, seguindo ou contrariando a legislação, conseguiram conformar peculiaridades urbanas simpáticas aos seus usuários tornando-se, quase sempre, exemplos de espaços que deram certo, lugares que assumem valor e referência para seus usuários. São exemplos disso, a praça Jarbas de Lery Santos, em São Mateus, as ruas arborizadas do Bom Pastor, a praça do Jardim Glória, o calçadão e alguns condomínios fechados.

Precisamos retomar o desenho da cidade, entender até, que os edifícios com qualidades funcionais, estéticas, formais e urbanas conformam o espaço da rua o que a torna agradável ou mesmo desagradável e indesejada pelos cidadãos.

É necessário entender que nesta oportunidade pode-se fazer uma legislação ampla e que possa ter em seu mérito a possibilidade do debate com os habitantes que no fim são suas vítimas ou seus algozes.

A cidade se constrói aos poucos, ao longo de décadas, séculos, mas não podemos abrir mão de nossa responsabilidade de contemporâneos ao tocar em ponto tão decisivo para o futuro como a legislação urbana. Trabalhando seriamente podemos mesmo, em pouco tempo, nos surpreender com uma construída legibilidade da qual fazemos parte, de forma humana e cidadã. Participar desse processo, seja enquanto arquitetos, moradores, poder público, entidades civis, nos parece tão essencial quanto a nossa vontade de realmente construir uma cidade melhor que reflita nossas reais necessidade e expectativas. Que seja uma cidade que nos remeta valor e significado enquanto espaço da liberdade, segurança, e tantas outras virtudes urbanas que podemos criar.

nota

1
Essa contratação foi um efeito do projeto de revitalização do eixo do rio Paraibuna em Juiz de Fora. Este projeto tinha como objetivo o financiamento do BID que em sua lista de sugestões, indicava a necessidade de se montar uma comissão para promover mudanças na Lei do Solo, numa tentativa de olhar a cidade de uma maneira global.

sobre os autores

Klaus Chaves Alberto é arquiteto (UFJF), mestre em Urbanismo pelo PROURB/UFRJ, ex-professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Engenharia da UFJF.

Luciane Tasca é arquiteta (UFJF), especialista em Planejamento e Uso do Solo Urbano e mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ), Professora Substituta do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Engenharia da UFJF.

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