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my city ISSN 1982-9922

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ARRUDA, Phrygia. Rio de Janeiro RJ Brasil. A paisagem como patrimônio cultural. Paisagens urbanas pós-modernas? Minha Cidade, São Paulo, ano 08, n. 085.02, Vitruvius, ago. 2007 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/08.085/1919>.


Faixa vermelha de interdição


Estruturas do PAN na praia

Tendas e o calçadão

Símbolo do PAN

Placa da interdição

 

Num domingo andando no calçadão do Leme me vi diante da interdição de uma enorme área da praia e deste mesmo calçadão, além de inúmeras tendas armadas, uma imensa estrutura metálica para o vôlei de praia, loja de conveniência, bilheteria, tudo para o evento que está acontecendo na cidade – o PAN 2007.

Lembrei-me então do texto que lera num jornal carioca, de autoria do Luiz Fernando de Almeida (presidente do IPHAN), intitulado "O futuro é a paisagem" (2007) e fiquei me perguntando, que futuro tem esta cidade e sua paisagem?

Aqui faço algumas considerações sobre o conceito de patrimônio, de paisagem cultural e a proteção deste patrimônio, e das chamadas cidades pós-modernas.

Primeiramente, quando se pensa em patrimônio, se pensa naquilo que foi herdado e que sobrevive do passado; contudo, quando se trata da cidade e da paisagem estamos dentro de uma outra noção de patrimônio; ou seja, o conceito de patrimônio desliza da concepção de nação para a sociedade inserindo o ambiente natural; incluindo ainda a noção de patrimônio como memória, inscrevendo-o assim no presente.

O conceito de Paisagem Cultural foi aprovado pela Conferência Geral da Unesco em sua 17ª reunião em Paris, no dia 16 de novembro de 1972. Na ocasião se constata que o patrimônio cultural e o patrimônio natural são cada vez mais ameaçados de destruição, não somente pelas causas tradicionais de degradação, mas também pela evolução da vida social e econômica, que se agrava com fenômenos de alteração ou de destruição ainda mais temíveis. No Artigo 1º do item I – “Definição do Patrimônio Cultural e Natural”, afirma-se que “para os fins da presente convenção serão considerados como patrimônio cultural: os lugares notáveis: obras do homem ou obras conjugadas do homem e da natureza, bem como as zonas, inclusive lugares arqueológicos, que tenham valor universal excepcional do ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico”. E no seu Artigo 2º temos a seguinte afirmação: “para os fins da presente convenção serão considerados como patrimônio cultural: entre outros, os lugares notáveis naturais ou as zonas naturais estritamente delimitadas, que tenham valor universal excepcional do ponto de vista da ciência, da conservação ou da beleza natural“ (1).

E no item II – “Proteção Nacional e Proteção Internacional do Patrimônio Cultural e Natural”, no seu Artigo 4º, temos que “cada um dos Estados partes na presente convenção reconhece que a obrigação de identificar, proteger, conservar, valorizar e transmitir às futuras gerações o patrimônio cultural e natural mencionados nos Artigos 1 e 2, situado em seu território, lhe incube primordialmente”. E no artigo 27º do item IV – “Programas Educativos” pode-se ler “que os Estados na presente convenção procurarão por todos os meios apropriados, especialmente por programas de educação e de informação, fortalecer a apreciação e o respeito de seu povo pelo patrimônio cultural e natural definido nos artigos 1 e 2 da convenção”.

Partindo das idéias apresentadas nesta Convenção de Paris (1972), afirmo que a paisagem da praia de Copacabana, e neste caso, incluindo o Leme, desta cidade do Rio de Janeiro é um patrimônio cultural e natural que deve ser preservado e protegido. E que este patrimônio, paulatinamente, vem sofrendo intervenções políticos-sociais que depreciam o espaço urbano e sua paisagem.

Segundo Jérôme Monnet, a proteção do patrimônio está sempre atrelada a uma política urbana, que nega sua dimensão política, pois as políticas do patrimônio transformaram-se em peças essenciais das estratégias de imagem das cidades. O autor discute tais estratégias atribuindo as imagens e ao marketing urbano que se misturam às ações de proteção, no caso, aos monumentos históricos, que passam por múltiplas intervenções sobre certos espaços essenciais das cidades (2). Uso de algumas das colocações de Monnet como argumento para compreender a intervenção do governo municipal na praia e no calçadão do Leme para um evento esportivo (PAN 2007), como estratégia de marketing aliada a uma paisagem esteticamente proclamada mundialmente; além da dimensão econômica.

As paisagens sempre estiveram atreladas aos com poder, a uma classe econômica superior; e, contemporaneamente, como pensar as paisagens com suas múltiplas funções?

Outra autora importante, Sharon Zukin, pode ter algumas de suas idéias aqui apropriadas para continuar nossa argumentação. Segundo esta autora, o termo paisagem urbana pós-moderna concentra no seu uso diferentes maneiras de organizar aquilo que é visto: "como o consumo visual do espaço e do tempo que se encontram tão acelerados quanto abstraídos da lógica da produção industrial, forçando uma dissolução das identidades espaciais tradicionais e sua reconstrução sobre novas bases" (3).

Guy Debord, em seu artigo sobre a "A sociedade do espetáculo", mostra as diferentes maneiras de apropriação cultural dos espaços urbanos, como lugares de uso de estratégias de fortalecimento do valor econômico, mediando natureza e artefato de uso público e valor privado, mercado global e lugar específico:

"Toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente tornou-se uma representação" (4).

Fredric Jameson, por sua vez, afirma que a paisagem urbana pós-moderna (hiper-espaço) concentra uma imensa massa de indivíduos, que torna a vida urbana uma vitrine. Isto é, a transformação do espaço – o surgimento do hiper-espaço – que interdita o ser humano de não só se localizar corporalmente e de organizar a percepção do espaço que o circunda, "e também de reconhecer cognitivamente sua posição num mundo físico. É um ponto de separação – entre o corpo humano e o ambiente construído – que pode servir como analogia para a nossa incapacidade mental de mapear a enorme rede global e multinacional de comunicação em que nos encontramos presos" (5).

Copacabana – praia, bairro, calçadas com seus desenhos de ondas em preto e branco –, todo este conjunto faz parte do imaginário nacional e internacional como um lugar de memória, que significa não só um jeito de viver, mas, um jeito de ser.

Essa Copacabana formada, principalmente, na década de 50, quando passou a ser o retrato do novo e do moderno; um bairro-cidade, entre o mar e as montanhas, dominado por uma burguesia que sonhava com o consumo, um novo estilo de vida, baseado no glamour, protótipo de "um estilo sem estilo de viver" (6).

O termo paisagem vem passando por mudanças e diferentes usos no contemporâneo, contudo, há espaços urbanos cujas paisagens não só criam uma aura paradisíaca, mistura de um passado mítico com o presente.

Os novos usos das paisagens refletem pensar um novo espaço equivalente ao tempo da memória, pois como diz Zukin, citando um teórico italiano, e penso que é o nosso sentimento atual frente a parafernália de arenas e tendas, que "a paisagem imaginária é o único espaço que sobrou para a criatividade" (218).

notas

1
Convenção de Paris sobre a Proteção do Patrimônio Mundial, Cutural e Natural, out./nov. 1972. In Documento. São Paulo, Portal Vitruvius <www.vitruvius.com.br/documento/patrimonio/patrimonio13.asp>. Grifos da autora.

2
MONNET, Jérôme. “O álibi do patrimônio”. Cidadania. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Rio de Janeiro, n. 24, 1996, p. 220-228.

3
ZUKIN, Sharon. “Paisagens urbanas pós-modernas: mapeando cultura e poder”. Cidadania. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Rio de Janeiro, n. 24, 1996, p. 205.

4
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Comentários sobre a sociedade do espetáculo. Trad: Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro, Contraponto, 1997, p. 13.

5
JAMESON, Fredric. Pós-modernismo. A lógica cultural do capitalismo tardio. Trad. Maria Elisa Cevasco. Rio de Janeiro, Editora Ática, 1996. Apud VARGAS, Silvana Bandoli. “Uma leitura inquietante”. Tempo, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 4, 1997, p. 203.

6
Andrade, 1993. Apud ARRUDA, Phrygia. O jeito carioca de ser. Entre a tradição e a modernidade: o imaginário de um Brasil moderno. Tese doutorado. Rio de Janeiro, Programa de Pós-graduação em Psicologia, IP-UFRJ, 2002.

sobre o autor

Phrygia Arruda é psicóloga pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mestre em Teoria da Comunicação (ECO – UFRJ); Doutora em Subjetividades Contemporâneas (IP/UFRJ); atualmente, em Estágio de Pós-doutorado no Programa de Pós-graduação em Memória Social, da UNIRIO, e Docente do Instituto de Psicologia – UFRJ, responsável, na atualidade, pela disciplina Psicologia Aplicada as Artes Cênicas, para a Escola de Belas Artes- UFRJ e Instituto de Psicologia – UFRJ. Psicanalista (SPRJ).

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