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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
O bairro da Vila Industrial, em Campinas, e em especial a área dos curtumes da cidade, é emblemático do processo de transformação das atividades industriais e o impacto deste processo no território.

english
The Vila Industrial neighborhood, at Campinas, and specially the tannery area of the city, is emblematic for the transformation process of the industrial activities, and the impact of this process on the landscape.

español
El bairro Vila Industrial, a Campinas, e especialmente el área de los curtiembres de la ciudad, és emblemático del proceso de transformación de las actividades industriales e el impacto deste em el territorio.

how to quote

ANDREOTTI, Maria Beatriz. Paisagem contemporânea em Campinas: Vazios Urbanos da Vila Industrial. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 157.01, Vitruvius, ago. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.157/4835>.



As cidades contemporâneas se apresentam como um palimpsesto. Sobrepõe-se nelas processos históricos, econômicos e sociais das quais são produtos. A alteração da produção capitalista, de fordista à flexível, trouxe alterações no processo de consolidação do espaço urbano, bastante nítidos na atual paisagem das cidades. As novas dinâmicas destas cidades metropolitanas estariam hoje vinculadas a fatores menos explícitos, com a criação de novos vínculos globais.

A desindustrialização dos núcleos centrais e a independência entre urbanização e  industrialização é um destes fatores, nos quais os centros urbanos passaram a constituir uma rede de interconexão, mas não necessariamente de forte centralização. (1).

A geração de periferias sucessivas e o esvaziamento econômico do centro foram padrões experimentados por diversas metrópoles no final do século XX, e cidade de Campinas não esteve alheia a isto. A articulação de processos sociais à distância nas áreas metropolitanas, principalmente pela implementação de novas tecnologias de comunicação permitiram novas relações entre regiões e continentes, trazendo diversas mudanças na conformação destas relações de urbanidade. A desconcentração da produção industrial em torno dos centros das cidades, com a formação de núcleos secundários, descentralização das atividades comerciais e de serviços trouxeram, ainda, uma expansão da mancha urbana.

Alguns elementos presentes neste panorama são bastante representativos deste fenômeno: os vazios urbanos.  Resultados destas questões acima, a cidade contemporânea é permeada por espaços abandonados, grandes áreas industriais obsoletas ou simplesmente trechos vacantes sem construção. Estes elementos se colocam como emblemáticos para o entendimento e conformação da cidade atual, expondo parte destas novas relações intrínsecas e subliminares à cidade que habitamos.

Ao longo dos sítios que vão se instalando, estes lugares passam a receber denominações diversas: brownfields, friches urbaines, terrain vagues, vazios urbanos. Assim como coloca Solà Morales, denominam espaços com duas condições:

“[Terrain vague] um termo especialmente útil para designar a categoria urbana e arquitetônica com que a aproximamos dos lugares, territórios e edifícios que participam de uma dupla condição. Vago no sentido de vacante, vazio, livre de atividade, improdutivo, obsoleto. Por outro lado vago no sentido de indefinido, sem limites definidos, sem horizonte de futuro.(...) Terrain: caráter urbano da expressão, uma extensão de solo de limites precisos, edificáveis, está ligada à uma idéia física de uma porção de terra em sua condição expectante, potencialmente aproveitável. A relação entre ausência de uso, de atividade e sentido de liberdade, de expectativa é fundamental para entender toda a potência evocativa, vazio como promessa, como expectação.” (SOLÀ MORALES, 2002).

Este fenômeno é mais latente em sítios industriais, que recentemente tem se tornado foco de projetos imobiliários de expansão e revitalização. No caso de Campinas, o bairro da Vila Industrial possui número significativo de edifícios e áreas em estado de vacante, sejam elas edificadas ou não.

Este local foi um dos primeiros receptores das plantas industriais que se instalaram na cidade no início do século XX e com a expansão da mancha urbana observada ao longo do século se constituiu como área de expansão do centro, sendo potencial pela sua infraestrutura já instalada e subutilizada.

Antes de 1870, data de implantação do pátio ferroviário de Campinas, não havia definição de centro/ periferia tão clara como colocado após o seu funcionamento. O perímetro urbano da cidade não se estendia além de seu centro consolidado de malha ortogonal. A área ao em torno deste núcleo, se conformava então como vazio, pontuado por algumas edificações, mas um vazio de caráter rural, de áreas vacantes a espera de uma ocupação como extensão da cidade. A delimitação entre área central e área periférica tão explicitamente exposta pelo limite de transposição dos trilhos, definiu, de antemão, a vocação dos bairros posteriores à linha férrea. A Vila Industrial seria lugar para as classes operárias, cemitérios, matadouros, curtumes, implantados do final do século XIX ao início do século XX, se constituindo como espaço mínimo de tolerância. (conforme ilustrado no mapa da cidade em 1900).

É neste sítio, próximo ao córrego do Piçarrão, que uma área de grandes dimensões é emblemática desta transformação: o conjunto dos edifícios curtumeiros. Inaugurados no início do século XX, mantinham uma situação de margem em relação à cidade. Na mudança no século, a partir da década de 1990, a atividade exercida ali começa a perder seu sentido enquanto atividade urbana e o terreno passa a ter uma potencialidade que não existia até então. Simbolizam a mudança de uso porque passou a cidade e mais especificamente o bairro da Vila Industrial.

O local é composto por duas estruturas industriais de curtumes, o antigo Curtume Cantúseo e o Curtume Firmino Costa, limitados ao fundo por uma imensa área não ocupada de cerca de 175 mil metros quadrados. Identificam-se naquele sítio todas as características procuradas pela indústria no início do século XX para a sua implantação: a proximidade com a linha do trem, a presença do rio e a grande área livre adjacente, originalmente reserva para expansão das atividades do curtume. A existência desta grande área não consolidada resultou na criação de uma morfologia específica: enquanto que a Vila Industrial tem sua “frente” voltada para o pátio ferroviário e para a região central da cidade, o córrego do Piçarrão se configurou, portanto, como seu “fundo”. A permanência destas barreiras (córrego, vazio e ferrovia) limitou a ocupação para além da Vila Industrial e o enorme vazio das glebas adjacentes e das suas margens atuou significativamente na conformação atual do tecido desconexo com seu entorno.

As ocupações dos bairros depois da linha do trem, como a Vila Industrial começaram a se solidificar em torno de 1900. Limitadas por um lado pelo pátio ferroviário e por outro pela existência do Córrego do Piçarrão, a área teve um crescimento urbano isolado se comparado com o restante da cidade (3). Em 1929, já estão representados no mapa da cidade os dois curtumes (Firmino Costa e Cantúseo) e a área vazia ao lado. Um novo eixo estruturador aparece nas plantas de 1947, a Avenida das Amoreiras, e a delimitação deste enorme vazio. Mapas de 1968 e 1980 mostram a permanência deste vazio. A ilustração de 1968 demonstra uma vontade de ocupação da gleba, com o desenho de diretrizes viárias que não foram implementadas.

Localizada na macrozona considerada 'de urbanização consolidada', a área passou a ser denominada 'de urbanização prioritária' pela revisão do plano diretor em 2006, sendo delimitada pelas rodovias Dom Pedro I e Anhanguera e as Fazendas Chapadão e Sta. Eliza. Apesar de ser tida como “consolidada”, apresenta número significativo de lotes vagos: 31% de lotes vagos em relação ao total de lotes do município. Cerca de 10% dos lotes desta área estão vacantes. (4)

Estes lugares são manchas de não cidade, caídos em desuso, alheios ou sobreviventes aos sistemas estruturadores do território, que surgem nos intervalos de uma cidade com estruturas urbanas decadentes, de outras ordens atualmente desativadas. Paradoxalmente são lugares que possuem localizações privilegiadas relativamente a áreas consolidadas, incorporando em simultâneo a condição de periferia e centro. Em contraposição à dinâmica refletida na cidade, estas grandes áreas se comportam como permanências no tecido e como parte integrante de seus processos formativos.

Acumulando dívidas de impostos e problemas devido a não adequação legal da propriedade da terra, a área sem edificação permaneceu estagnada até o presente momento. O Curtume Cantúseo teve parte de sua fachada tombada, e parte dos galpões remanescentes reestruturados para locação de serviços, o curtume Firmino Costa permanece vazio de atividade. Vendida a um grande grupo incorporador em 2007, as propostas para a área não edificada deverá abrigar usos residenciais e comerciais (5).

Ainda que esvaziados de sentido econômico, tais edificações possuem importante significado na constituição da memória do bairro e da cidade, uma vez que o deslocamento industrial pode ser considerado um processo cultural (6). A área em questão torna-se significativa para o entendimento da dinâmica da indústria no território campineiro, permitindo o resgate das relações urbanas e sociais existentes, bem como a compreensão de sua representatividade no contexto das transformações urbanas de toda a cidade.

A construção da nova rodoviária, a implantação de um novo condomínio residencial e a desativação do presídio vizinho à gleba são alguns projetos de grande impacto que deverão alterar significativamente as características originais do bairro. A área deverá configurar-se como expansão da região central, já que dista desta apenas 4 quilômetros, possuindo infraestrutura instalada e parte significativa dos lotes não ocupados. Assim, a tendência face à valorização do solo e à pressão da especulação imobiliária é o desaparecimento desta paisagem.

notas

NA
Este texto é parte integrante do trabalho “Incubadoras Urbanas em áreas de vazio” desenvolvido para o Trabalho Final de Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Estadual de Campinas. 

1
HALL, Peter. Cidades do Amanhã. São Paulo: Perspectiva, 1995. VIRILIO, Paul. O Espaço Crítico. Rio de Janeiro: Editora 34, 2005.

2
SOLÀ-MORALES, Ignasi. Territorios. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2002.  

3
RODRIGUES, Ana Villanueva. Preservação como projeto – área do pátio ferroviário central das antigas Cia. Paulista e Mogiana –Campinas- São Paulo. Universidade de São Paulo, 1996. Dissertação de mestrado.

4
Plano Diretor de Campinas. Prefeitura Municipal de Campinas, 2006.

5
Correio Popular, Cidades, 11/abril/2008.  “HM prevê bairro nobre no terreno do curtume”.

6
HIGH, Steven & LEWIS, David W. The landscape and memory of deindustrialization.  Cornell University, 2007.

sobre a autora

Maria Beatriz Andreotti possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Estadual de Campinas (2008). Mestranda pelo programa de pós-graduação em História da Universidade Estadual de Campinas tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, atuando principalmente nos seguintes temas: metrópole, vazios industriais e patrimônio industrial.

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