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PORTAL VITRUVIUS. Rudimentos. Ou: paralisia do movimento urbano. Projetos, São Paulo, ano 14, n. 163.01, Vitruvius, jul. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/14.163/5246>.


Paralisia

O projeto parte de uma inversão da atual lógica urbana do Rio de Janeiro. Propõe-se a sensação de letargia como contraponto à experiência acelerada e funcionalista da cidade.

Infraestruturas elevadas de atravessamento para pedestres são espalhadas ao longo das vias expressas e entroncamentos da cidade. Estas estruturas são criadas a partir das vigas de aço corten - elemento primário do projeto - e possuem altas paredes para isolar o ambiente de seu contexto urbano. A proposta tem caráter dicotômico: apesar de se apresentar como uma passarela - um rápido atravessamento -, não visa à otimização de um trajeto e, sim, retardar o movimento e estimular a permanência, transcendendo, portanto, a mera função de passagem.

Propagação das vigas pelas Vias Expressas da cidade

A eliminação do elevado repercute na mobilidade de toda a cidade. Assim, a intervenção proposta espalha-se por todo o município como estilhaços da Perimetral. As vigas são deslocadas da função de sustentação de um fluxo expresso e pontual para propagarem, em rede, a sensação de desaceleração pelo território.

Rudimentos

Com a extinção da Perimetral, o valor de ruína é agregado às suas vigas. A ruína historiciza e enterra o objeto no tempo, é o testemunho e o fragmento de um mundo que não existe mais. A beleza romântica das ruínas está no espaço intermediário que elas ocupam, no hiato entre a memória de um mundo que se foi e seu registro - a existência concreta do objeto.

Diagramas de variações de combinações entre as vigas

O projeto assume o módulo da viga (40m x 1,65m) como elemento primário. Sua multiplicação - encaixe entre eles a partir do ângulo de noventa graus - possibilita diversas combinações, desdobrando-se em múltiplas formas. Os rudimentos são o sistema resultante dessa equação. Diante das inúmeras hipóteses, quatro estudos de caso foram elaborados, em forma de linha, cruz, quadrado e labirinto, localizados, respectivamente, na Avenida Brasil (Ramos/Maré), na Avenida Presidente Vargas (Cidade Nova), na Linha Amarela (Del Castilho) e na Avenida Ayrton Senna (Jacarepaguá). Os contextos foram escolhidos de acordo com o significado atribuído para cada forma.

Matérias-brutas elementares como água, terra, areia e pedra são agregadas às estruturas rudimentares para reforçar o estado de elevação de um ambiente urbano efêmero e circunstancial. Neste local, a experiência é outra: o projeto associa-se à escala das dinâmicas geológicas milenares, aos lentos processos de erosão e sedimentação.

Desacelerar a experiência urbana, arrastar o passar do tempo e transformar a percepção do que se vive. Ao subir nas passarelas, o pé sai do ritmo rápido do asfalto para adentrar num ritmo condicionado pela densidade e irregularidade desses solos.

Os inúmeros processamentos industriais e tecnológicos distanciam-nos destas quatro matérias primárias até hoje essenciais para a arquitetura. Os rudimentos vêm lembrar de uma condição humana básica, agregando forças elementares da natureza à experiência metropolitana. Um solo suspenso e indefinido é criado: lá a experiência urbana se amplifica em outro tempo e outro espaço, onde talvez encontre raízes…

Linha de Fuga

Visitava aquele lugar suspenso para encontrá-lo num bairro dividido pelas avenidas de intenso tráfego. Morávamos cada um de um lado. Dentro, sentia a água subir pelo meu corpo lentamente. A densidade da água subtraía o peso do mundo externo.

Não havia correnteza naquele espaço. As pessoas pareciam se encontrar ali, sem pressa de sair. Era uma terça-feira no meio do semestre, mas parecia um período de férias escolares, o tempo se estendia e eu adiava sempre mais um pouco o horário para ficarmos juntos. Nesses encontros, afundávamos a cabeça para cessar a sonoridade externa, nos comunicando por mímicas, num silêncio total.

O calor do asfalto parecia penetrar pelo piso metálico do ônibus e envolver o corpo dos passageiros numa sauna úmida. Aquele trajeto se tornara insuportável. Minha vontade era de sair correndo, cada vez mais irritado, me sentindo preso àquela situação.

Uma grande estrutura de aço suspensa na avenida me paralisa. De tempos em tempos alguém sobe e some atrás da barra metálica. Observo, à espera que alguém apareça do outro lado. Ninguém volta e tenho a impressão de ouvir longínquos barulhos de água.

Encruzilhada

Duas passarelas se cruzam sobre uma grande avenida, formando uma cruz grega. Em cada uma das quatro pontas há uma escada.

Um homem sobe com pressa e ao chegar se depara com um caminho coberto por pedras. Ele segue se equilibrando e se perde na lembrança de cachoeiras que visitava quando era pequeno. Próximo ao entroncamento coloca sua mochila no chão, abaixa e tira uma lata de spray de tinta. Começa a pichar letras e símbolos indecifráveis. Costuma sentir uma forte adrenalina, mas naquela passarela se sente livre do excesso de vigilância urbana.

Uma mulher salta de um táxi, acende um cigarro e sobe outra escada. Ela usa um traje formal e caminha cuidadosamente entre as pedras na direção de um prédio que já não consegue enxergar. Uma criança passa correndo por ela, respingando seu sorvete e deixando um rastro de gotas vermelhas.

Perto do centro da encruzilhada, vê um homem pichando a parede enferrujada e se sente extremamente vulnerável. Antes que ele a perceba, ela recolhe discretamente uma pedra do chão, caso precise se defender.

O homem continua concentrado entre o spray de tinta e suas memórias de infância. Sente uma forte presença, vira o rosto e os olhares se encontram. Ela repara nos seus olhos azuis. Por um longo momento se encaram. Ela relaxa o braço, e deixa a pedra cair. O barulho interrompe o elo estabelecido entre seus olhares.

Cerco

Elevada sobre uma avenida de fluxo intenso, uma estrutura quadrada forma um percurso contínuo. Duas escadas levam ao caminho que contorna um grande vazio inacessível, desviando de um trajeto objetivo. Há décadas uma passarela tombou neste lugar, deixando cinco mortos.

Uma senhora de preto, viúva de um dos mortos no acidente, chega pela escada norte. Ela vem semanalmente, de manhã bem cedo, prestar homenagens ao marido. No caminho compra flores brancas e, ao chegar, tira os sapatos para sentir seus pés afundarem na areia. Como sempre, segue à esquerda, em direção à parede na qual escreveu o nome de seu marido. Ante o vazio oculto entre as passarelas, ajoelha-se, deposita as flores brancas no chão e mergulha no universo de suas preces.

Um senhor de cabelos brancos sobe a escada sul. Ao chegar, segue à sua esquerda, encontrando um corredor vazio, onde decide sentar e aproveitar o silêncio. Ele apoia as costas na parede, encarando o grande vazio que não consegue enxergar.

Não chove há semanas e o céu finalmente amanheceu carregado. No interior das passarelas, vê-se apenas céu, areia e altas paredes de aço. Com um vento forte um nevoeiro de areia se ergue, percorrendo toda a estrutura num movimento circular.

Durante seu ritual, a senhora é aos poucos perturbada pela fina areia que atinge seu rosto de maneira cortante. Lentamente se levanta e vira à direita. O senhor do outro lado, também incomodado, caminha no mesmo sentido. Por uma fração de segundos não se encontram no mesmo corredor.

Labirinto

Percorria todos os dias um descampado onde as distâncias pareciam infinitas na aflição da minha pressa. Rodovias eram construídas em grande velocidade e empreendimentos avançavam nos vazios expostos onde antes havia um pântano. As vias expressas reforçavam o meu isolamento na minha própria cidade.

Correndo, decido atravessar uma grande estrutura metálica. Ao subir alguns degraus, percebo resíduos de terra e, ao chegar ao topo, encontro uma bifurcação. Meu celular fica sem sinal. Nesse espaço não há vistas externas. Sinto em meus pés a textura da terra, seu cheiro e o som abafado se proliferam na minha frente, retardando meus movimentos. A cada passo lento me deparo com novas possibilidades. Aos poucos aquela terra foi se transformando em mata fechada e me encontrei imerso nas minhas próprias imagens ilusórias. Conheci um senhor que vive aqui. “Aquilo não é vida”, dizia ao se referir à jornada de trabalho. Ele parecia estar sempre num estado meditativo. Nesse dia, me contou que era ele quem deixava os caminhos do labirinto abertos, arrancando os galhos e o mato com as próprias mãos.

Desorientado, avisto ao longo uma luz forte vinda de uma das paredes. Aproximo-me e ouço um barulho agudo de buzina se dissipando na minha direção. Olho a hora e vejo que nenhum minuto se passou. Desço os degraus e reparo numa charrete que, pelo acostamento, supera a velocidade dos carros.

sobre os autores

Ana Altberg formou-se em Arquitetura e Urbanismo e cursa pós-graduação em História da Arte e da Arquitetura na PUC-Rio. Estagiou no escritório l’AUC em Paris, trabalhou na Coordenação do Parque Olímpico da Barra na EOM, e faz parte do coletivo ENTRE - Entrevistas com Arquitetos. Atualmente trabalha na Coordenação de Pesquisa e Educação do Instituto Moreira Salles.

Beni Barzellai formou-se em Arquitetura e Urbanismo e cursa pós-graduação em História da Arte e da Arquitetura na PUC-Rio. Também estudou em Paris Malaquais, ganhou o prêmio "Arquiteto do Amanhã" em 2012 do IAB-RJ, estagiou no escritório DDG Arquitetura e trabalhou no escritório A+ no Rio de Janeiro. Atualmente é arquiteto no Comitê Olímpico Rio 2016.

Manuela Muller formou-se em Arquitetura e Urbanismo na PUC-Rio. Também estudou na Faculdade Técnica de Lisboa e estagiou no Escritório Modelo da PUC-Rio. Atualmente trabalha no escritório C+P Arquitetura.

Mariana Meneguetti formou-se em Arquitetura e Urbanismo na PUC-Rio. Estagiou nos escritórios DDG Arquitetura no Rio de Janeiro, ACME Space em Londres e Mecanoo Architecten na Holanda. Publicou o livro Entre – Entrevistas com Arquitetos por Estudantes de Arquitetura em 2012 e atualmente trabalha no escritório RUA Arquitetos.

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