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Resenha sobre a recente tradução do livro de Hal Foster, que apresenta importante discussão sobre a imbricada relação da arte com a arquitetura pós-moderna icônica presente nas grandes cidades e assinada por renomados arquitetos.

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GEMIN, Deborah Alice Bruel. A arquitetura contemporânea icônica e a subordinação do cultural ao econômico. Resenhas Online, São Paulo, ano 15, n. 174.03, Vitruvius, jun. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/15.174/6031>.


“o espetacular é um substituto suficientemente bom para o democrático”
Hal Foster, O complexo arte-arquitetura, p. 61

Esta passagem além de inspirada, é tão emblemática que poderia ser, na minha opinião, o slogan da recente publicação de Hal Foster: O complexo arte-arquitetura. Livro em que o autor tece críticas contundentes e argumentadas à arquitetura contemporânea icônica, à relação desta com a arte – especificamente os modos de exposição e os grandes museus –, e por fim às políticas culturais que envolvem estas disciplinas. Porque, como o próprio título enfatiza, as relações entre arte e arquitetura no que tange a cultura atual possuem enredamentos que o texto procura desvendar, distinguindo-os em três abordagens: a justaposição da arte e da arquitetura em conjuntos, onde as vezes uma toma o lugar da outra; a "subordinação capitalista do cultural ao econômico", que tem como paralelos o complexo turístico – ao qual o cultural serve de maquiagem para o comércio – e, o mais ameaçador, complexo militar-industrial; e por último, a complexidade como sintoma de “um bloqueio ou síndrome neurótica” frente à naturalização das operações culturais atuais, as quais pouco conseguimos identificar, quanto mais superar, de tão intrincadas que estão em nosso cotidiano social como espetáculo.

O livro está organizado em uma introdução e três seções que, por sua vez, estão divididas em três subseções cada uma, com exceção da última, acrescida de uma entrevista. De modo geral, as duas primeiras seções tratam de grandes projetos e grandes arquitetos, no sentido mesmo da fama e do valor que tais projetos adquiriram para a arquitetura e para a história cultural. Somam-se à estas análises as interferências e os entrecruzamento com a arte, justamente porque Foster identifica que para resistir à atrofia social e ao atordoamento da subjetividade causadas pelo espetáculo, a saída está nas “práticas que insistem na particularidade da experiência no aqui e agora”. Embora à esta preconização da experiência fenomênica ele faça ressalvas quanto ao seu oposto, daquelas experiências dadas como “atmosfera” em instalações ou arquiteturas que sentem por nós ou que nos dizem o que perceber.

Para além disso, valores como civismo, transparência e leveza são percebidos em diferentes propostas de arquiteturas que tentam desdobrar a modernidade em estilos globais. E como eixo, Foster propõe pensar a imagética da arquitetura recente em termos de uma relação ora de complementação ora de oposição entre o pop e o fenomenológico. A arquitetura que tende ao pop tem a imageabilidade como critério primordial, e por conseguinte a obsolescência; trata-se de construir imagens, mais do que lugares, trata-se de substituir o gênio moderno pelo ícone pop, de fazer uma arquitetura para a mídia. A partir dos tipos modernos de arquitetura pop designados por Venturi como “pato” e “galpão decorado”, a pós-modernidade de Frank Gehry inaugura o que Foster denomina de “pato decorado”, que combina “a vontade de monumentalidade da arquitetura moderna com a falsa iconicidade populista do projeto pós-moderno” (p. 35). Ou seja, para o autor a arquitetura pós-moderna, com raras exceções é pop, e, mesmo que tenha uma variedade de estilos, a lógica do efeito é sempre a mesma! Esta formula é perfeita para que lugares, cidades, instituições e museus sejam percebidos como integrantes de um mundo globalizado através de seus ícones instantâneos.

O discurso da primeira parte, está organizado de maneira que a partir da ideia da arquitetura como imagem, são apresentados três estilos pós-modernos globais: o civismo pop do tipo Beaubourg – onde a engenharia inovadora transforma-se em símbolo e ornamento para a massa; os palácios de cristal, que outrora simbolizavam o avanço da modernidade, agora ganham ares espetaculares e refinados, cuja transparência oferece falsa sensação democrática; e por fim, a modernidade leve de Renzo Piano e sua elegante capacidade em mediar a tensão entre demandas contraditórias como materiais tradicionais versus as técnicas digitais, ou, o edifício local frente ao comércio global. Em suma, estes estilos mesmo que sejam boas soluções à continuidade da arquitetura moderna, acabam de uma maneira ou outra tendendo ao icônico, ao simbólico ou ao fetiche.

A segunda parte do livro trata mais especificamente da arquitetura em relação à arte, e está disposta igualmente em três blocos, cada qual com um arquiteto ou escritório exemplar aludindo à um ou dois projetos emblemáticos. No primeiro, critica a recuperação dos experimentos da vanguarda histórica de maneira estilizada dos projetos de Zaha Hadid, que apresentam-se como um futurismo revisitado, um pastiche comum em outros pós-modernos. Ainda que reconheça seu empenho em repensar os antigos “modos de representação e de explorar suas novas tecnologias digitais”, considera sua representação – do espaço e do movimento – estática, com suas perspectivas imóveis. (p. 91)

Máquinas pós-modernistas é o subtítulo do segundo item que trata dos projetos de Diller/Scofidio + Renfro (DS+R) para museus e Institutos de Arte, os quais são considerados “objetos autoconscientes” como "máquinas de olhar”, enfatizando a ideia da arquitetura como um sujeito. O problema, neste caso, reside no fato do museu olhar em nosso lugar. Enquanto um Guggenheim de Bilbao concorre com a arte no nível da iconicidade escultórica e a Tate Modern compete no nível da escala impressionante, o ICA de Boston (projeto do DS+R) disputa com a arte naquela que é sua dimensão privilegiada: o registro visual. Hal Foster parece entender que a resistência ou a crítica, seja ela institucional ou social, precisa coexistir aos problemas decorrentes da modernidade e da história/tradição. É preciso mediar estas tensões, pois não há mais espaço para a negação. Neste sentido, DS+R apontam alguma saída a este entrave contemporâneo entre arte e arquitetura.

O texto Museus minimalistas, que encerra a segunda seção, trata dos museus cuja expansão em escala foi fruto da influência da extensão serial das grades minimalistas. Neste sentido, a estética do DIA Art Foundantion – caracterizada pela reciprocidade de articulação que a arte faz da arquitetura mesmo quando é emoldurada por ela – se torna o mote argumentativo. Do minimalismo, estes novos espaços emprestam a estrutura literal, o conceito, e à ela agregam múltiplas configurações ampliando o efeito fenomênico. O que denota que há duas dialéticas na arquitetura recente, a minimalista/pop e a literal/fenomênica, que alternam-se e estão presentes na DIA de maneira emblemática, “no tocante a mudanças que definem sua configuração presente envolvendo não só uma inesperada conversão de funções – de antigas estruturas industriais remodeladas como novos espaços de arte –, mas, […] uma fusão completa de esferas antes semidistintas – o cultural e o econômico.” (p. 134)

É possível dizer que a crítica geral do livro resume-se nesta frase: “não raro a arquitetura contemporânea parece estar localizada entre a exposição e a engenharia – a função que conecta imagem e estrutura – ...” (p.118), tendendo mais para a primeira e solapando a função estrutural da segunda, favorecendo o espetáculo. Nestes casos, a cultura se traduz na experiência, de um lado intensificada pela “aura do extinto” e pelo “fascínio ao antiquado” da estética original da DIA – a antiga indústria se apresenta recuperada como a nova cultura –, e por outro, investida pela manifestação sensível dos vastos espaços com obras imensas, que após “esmagarem” o visitante com sua escala fenomenal, por fim o devolvem um sentimento poderoso como resultado da intensidade fenomenológica. Disso resulta que, a arte minimalista se torna pictórica em tais cenários e o espectador se encontra dentro de um “tableau sublime”. Com este argumento, Foster procura demonstrar como nas dialéticas minimalismo/pop e literal/fenomênico, o pop e o fenomênico estão privilegiados nesta sociedade "afeita às tecnologias da imagem e da informação” (p.150).

A terceira parte do livro recebe o título Os meios após o minimalismo, e se concentra em análises das práticas artísticas que preconizam a experiência fenomênica do espaço, redefinindo-o através da imanência, aqui entendida como sua concretude; este desejo de percepção espacial ainda surge em decorrência da contestação à pintura do “modernismo tardio” e sua “virtualidade pictórica”. Já que desta literalidade derivou que o ilusionismo foi preservado, e até ampliado, no minimalismo; Não mais um espaço de representação ilusório, mas um ilusionismo gerado nos efeitos ópticos da arte de “luz e espaço”. O problema do minimalismo foi sucumbir ao ilusionismo ótico, de acreditar que a pureza do ilusionismo reside na percepção ótica.

A partir desta constatação Hal Foster, procura averiguar se as consequências não seriam também desastrosas. Análise que, novamente, se subdivide em três partes, nas quais as linguagens – e seus pressupostos modernistas – da escultura, do cinema e da pintura servem de base para as observações centradas em situações específicas das produções dos artistas Richard Serra, Antony McCall e Dan Flavin.

No primeiro caso, Serra e o desenvolvimento de sua poética são apresentados como defensores da escultura enquanto uma linguagem forte e capaz de revelar as estruturas; apropriada, portanto, para criticar a arquitetura atual, tanto na sua representação – precária, segundo o autor – , quanto pela sua adesão ao viés cenográfico, especialmente no que diz respeito aos espaços expositivos e museus. Baseado na ênfase materialista e tectônica o trabalho escultórico de Serra resiste ao aplainamento da “experiência futurística” dos projetos arquitetônicos atuais e sua “virtualidade assubjetiva”, porque centra sua tônica no fazer, atendendo aos princípios construtivista, fenomenológico e situacional. O artista não dá espaço para a transcendência e para a representação, portanto, para o ilusionismo; a experiência em Serra concentra-se no aqui e agora, dado pela relação da matéria com o lugar e o indivíduo. Não há possibilidade de idealismo, a escultura é vista “como a estruturação de materiais com o fim de motivar um corpo e demarcar um lugar”. (p. 168)

Assim como Serra resiste à representação, Antony McCall resiste ao ilusionismo do cinema, “desnatura-o” à luz projetada em um espaço escuro, como quem está à procura do “filme definitivo, aquele que não seria nada além dele mesmo.” Os dois artistas preconizam a experiência corporal do espectador, que é a saída crítica de que carece a arte recente. O corpo ativado e a forma da localização do espaço feitos por eles servem de contraponto ao sujeito deslumbrado pelo espetáculo. No entanto, em oposição à essa literalidade na experiência, Hal Foster evoca, e McCall reconhece, o dado metafórico existente na escuridão da sala em contraste com os feixes de luz; ainda que sejam apenas meios, a luz e a sombra, podem aludir à sensações psicológicas e espirituais. Ambos apontam as dimensões transcendentes das experiências, mas não se colocam confortáveis para discuti-las.

A análise de Dan Flavin, fundamentada mais no discurso do artista e menos na descrição das obras, aponta as suas propostas de luz/cor/espaço como o campo ampliado do ilusionismo por manter presentes os vetores transcendente e imanente em tensão – entendendo o espaço ilusionista como convenção da pintura. O artista conjuga estas aparentes oposições e busca a experiência concomitante de “sensação física” e “presença mágica” (vivida por ele ao vislumbrar um ícone russo). À qual ele vai acrescentar a imanência, admirada no construtivismo de Tatlin. Em resumo, pode-se dizer que Flavin consegue colocar as antinomias históricas em articulação. Trabalha com várias dualidades fazendo-as coexistir: as já citadas imanência e transcendência, o ícone e o fetiche, o real e o ilusório, mais o utilitário e o estático, a materialidade e a imaterialidade, a imediaticidade e a mediação e porque não, o minimalismo e o pop. Seus objetos luminescentes provocam o extravasamento do ilusionismo ótico do minimalismo para o espaço, criando o que Foster chama de “espaço pictórico no sentido amplo”; e ao mesmo tempo que deslocam a ilusão para o espaço, remodelam o espaço como ilusão. Nisto reside uma revisão aos preceitos minimalistas aludidos pelo autor.

Em outras palavras, a vontade de escapar ao enquadramento se desenvolve nas propostas de campo ampliado, que sem ultrapassar os limites, os estendem. E agregam a si um coeficiente de sublimação, dado por estas experiências que suscitam sensações de intensidade. No entanto, nos alerta Foster, é preciso estar atento à normatização destas praticas, que vem sendo tecida desde o minimalismo através da “progressiva dessublimação da pintura e da escultura em práticas que se abrem para o espaço real e a vida cotidiana, mas também uma ressublimação problemática do pictórico e do escultórico – em que os enquadramentos convencionais da arte possam ser transgredidos num primeiro momento, para logo serem substituídos por formatos mediados que parecem transparentes num segundo momento.” (p.243) Contra isso é preciso que os procedimentos e a construção estejam aparentes, sejam declarados, evitando o “efeito alienação” tão comum à sensações sublimes.

Cabe, portanto, apontar que seu discurso se constrói sobre as bases formalistas, numa cruzada que começa com Greenberg e passa por Rosalind Krauss. Afinal, Hal Foster aposta na autonomia da arte em relação ao espetáculo, mas não à ilusão. Já que esta, parece sempre persistir travestida ora de representação do espaço perspectivado, ora na representação simbólica, e mais recentemente na ênfase pop somada ao espetáculo da experiência sensorial. Revela-se assim, uma estrutura histórica evolucionista, que começa com os ícones russos, passa por Tatlin, e segue no minimalismo; culmina com Flavin revisitando a todos, seguido na sua restruturação por Irwin e Turrell, finalizando em Olafur Eliasson e Bill Viola. Apesar dos sucessos reconhecidos nas práticas destes artistas, Foster conclui, desfavoravelmente, que assim como o “desnudamento do procedimento” pode contribuir para o artifício, a participação do visitante, sua corporeidade, é almejada também por colaborar com o espetáculo.

Desde meu ponto de vista, Foster utiliza artistas emblemáticos e situações específicas, sem dúvida importantes, mas que não escapam à um circuito mainstream das artes visuais, e que tampouco ultrapassam as já conhecidas fronteiras eurocêntricas e norte-americanas, e apesar de tecer uma análise crítica à estes nomes, não escapa deles e nem propõe alternativas. Assim, trata-se de um autor que critica o mainstream, mas não sai de seu perímetro; revelando a profunda hegemonia da arte do primeiro mundo.

Igualmente, é necessário assinalar que o discurso de Hal Foster é construído com muitas ideias e exemplos para poucas linhas, o que torna a leitura cansativa, com tantos nomes e relações para fazer. Com isso, o autor tenta confirmar uma tese já declarada a priori: a arquitetura ficou sem saída em termos tanto éticos quanto estéticos; o leque de referencias de Foster será precisamente para demostrar essa hipótese. Isto é, Foster não instaura um problema e o vai dissecando, o decorrer do texto somente confirma esta certeza, o que torna difícil, senão impossível, o diálogo.

Ao final deste exercício teórico de estudos de casos, o autor tece um argumento generalista: através da experiência, ao mesmo tempo transcendental e imanente, somente proporcionada pela arte, é possível criticar a arquitetura e não se render à “racionalização capitalista” e à “regulação burocrática”. Ainda que isto seja uma capacidade para poucos. Foster insiste na contraposição dos conceitos, na antinomia da crítica, para validar sua crença no domínio formal dos artistas e arquitetos citados. No entanto, seu argumento – exposto com um tom irrefutável –, arruína mais do que aponta alternativas à supremacia do espetáculo que adestra as relações culturais. Finalmente, sua escrita é tão espetacular quanto o é a arquitetura que critica; a ponto de concluir com o lamento da falência dos conceitos binários que até hoje estruturaram os nossos discursos sobre arte e igualmente arquitetura, sem apontar uma saída para isso. Diria que é uma crítica dotada de melancolia por um passado recente e que não vê saída para o futuro.

sobre a autora

Deborah Alice Bruel Gemin é artista visual, doutoranda em Artes Visuais na ECA/USP em São Paulo, professora assistente na Unespar – Campus I, EMBAP em Curitiba, mestre em Artes Visuais pelo CEART/UDESC em Florianópolis.

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O complexo arte-arquitetura

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O complexo arte-arquitetura

Hal Foster

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